Livro editado pela Filosofia Espiritualista Racionalista Cristã
A disposição de todos no site do Racionalismo Cristão
Ou no endereço Casa-Chefe - Telefone (21) 2117-2100
Rua Jorge Rudge, 119 – Vila Isabel20550-220 Rio de Janeiro, RJ - BRASIL
Sobre o autor e o livro
(8a
edição, 1992)
É provável que muitos não
saibam quem foi Dr. Pinheiro Guedes, cuja projeção no movimento espiritualista
vem ainda do tempo do Império.
Pinheiro Guedes, médico na
Corte, oficial do Exército, foi Senador da República, justamente quando se
instalou a Assembleia Constituinte de 1890, que elaborou a primeira
Constituição Republicana do Brasil. Era Pinheiro Guedes, nessa ocasião,
representante de Mato Grosso, ao lado de Joaquim Murtinho. Da independência de
seu caráter e sinceridade de suas convicções, é prova o fato de haver Pinheiro
Guedes, com Ângelo Torterolli e outros espiritualistas da época, encabeçado uma
comissão que foi à presença de Pedro II oferecer uma coleção de obras espíritas
ao magnânimo Imperador do Brasil.
Ciência
Espírita prova
de início, que a Medicina se originou do espiritismo e demonstra a perfeita
entrosagem entre o corpo, que o médico trata, e o espírito, que preside a
formação desse corpo, desde a sua fase inicial. Daí a extraordinária vantagem
do médico que, possuidor da ciência humana, é também conhecedor da ciência
espírita. Nesta ordem de ideias, o Dr. Pinheiro Guedes é de uma clareza
admirável, e se torna irresistivelmente fascinante quando explica, sob a luz da
ciência espírita, os fenômenos comumente designados como histerismo, loucura e
outros.
Ciência
Espírita analisa
e expõe à origem, a natureza e a evolução da alma, a criação das matérias, o
papel de átomos e células, a formação dos seres, a força psíquica, etc., uma
série de temas interessantes, proporcionando novos e utilíssimos conhecimentos
a todos, numa linguagem clara, simples e persuasiva, dirigida mais ao
raciocínio do leitor do que às suas próprias crenças e sentimentos religiosos
Assim, vazado em linguagem acessível a qualquer curioso das relações entre a
Medicina — ciência materialista por excelência — e o espiritualismo, Ciência Espírita é valiosa contribuição
científica do estudo do Espiritismo.
Mais do que a clareza com
que expõe suas ideias espiritualistas, impressiona o leitor destas páginas do
médico brasileiro Pinheiro Guedes sua visão, talvez disséssemos melhor, sua
intuição, ao tratar de assunto tão transcendente, em face duma ciência
materialista como a Medicina.
À medida que o leitor se vai
assenhoreando dos fascinantes conhecimentos sobre a vida fora da matéria,
segundo o raciocínio metódico e persuasivo do autor desta obra, desdobra-se aos
seus olhos novo panorama, até então desconhecido.
Sua oferenda “aos Mestres,
que me ensinaram a conhecer o corpo”, deixa entrever que o autor — há quase cem
anos atrás — confiava em que, mais cedo ou mais tarde, esta obra despertaria o
interesse de estudiosos ou simples curiosos dos fatos e fenômenos da vida fora
da matéria, tão extraordinária em sua fremente palpitação como na silenciosa
manifestação dos seres e coisas.
De que ele não se enganava,
prova mais esta edição de CIÊNCIA ESPÍRITA, cujos editores merecem
congratulações, não só pela divulgação que proporciona dos conhecimentos por
ela prodigalizados, como pela justiça que praticam, retirando do olvido páginas
tão expressivas.
Prefácio
O homem esclarecido tem por
dever servir-se da palavra ou da pena para explanar a Verdade; quem isso pode
fazer e não faz demonstra ser inimigo do progresso, da paz, da harmonia
fraterna, e sua vida será improfícua, prejudicial à sua própria alma e à
coletividade, pois criará em volta de si um ambiente de obsessão permanente,
tornando-se, conforme Camilo dizia, “um militante a mais no exército dos
infelizes”.
A pesquisa da verdade leva o
estudioso à certeza do que seja a vida na Terra e no Espaço, e à convicção do
dever a cumprir neste mundo, para onde se vem certo de que só pelo trabalho, na
luta pela vida, é que poderá o espírito aperfeiçoar-se, e que, portanto, ele
não pode, nem deve ser refratário ao trabalho nem à reforma de usos e costumes.
Dentre os poucos que têm
sabido ser estudiosos da doutrina da Verdade, destacamos, com justificado
orgulho, o Doutor Antônio Pinheiro Guedes, médico investigador, valoroso e
humanitário, verdadeiro sacerdote do bem, que sempre viveu preso aos estudos,
cooperando, decididamente, para a descoberta da Verdade, pois, não se
conformando com os limitados conhecimentos sobre a vida física, buscou, inteligentemente,
os da vida espiritual.
Soube, como nenhum outro,
romper o véu dos preconceitos sociais e científicos, transpor-se às coisas
transcendentes, e perscrutando a alma, descreveu-a com tanta clareza e
precisão, como sabia descrever ou escalpelar um cadáver, lecionando anatomia à
mocidade acadêmica.
Cultuando a memória desse
sábio brasileiro hoje enfileirado à plêiade dos espíritos superiores, no Astral
Superior, que pontificam nas Casas Racionalistas, julgamos de bom alvitre pedir
aos descendentes do Dr. Pinheiro Guedes permissão para a reedição de sua
primorosa obra CIÊNCIA ESPÍRITA, no que, felizmente, fomos bem sucedidos, pois
seus legítimos herdeiros nô-la autorizaram, movidos pelos mesmos desejos e
pensamentos nossos e certamente do ilustre autor: esclarecer a humanidade; e
foram mais além, doaram-na definitivamente ao Centro Redentor.
Trabalha o espírito de
Antônio Pinheiro Guedes no Espaço Superior com mais amplitude do que quando
agrilhoado ao corpo, não existindo hoje para ele fronteiras ou nacionalidades,
e como partícula do Grande Foco, impulsiona a humanidade para a Fraternidade
Universal.
Não visamos lisonjear essa
alma, mesmo porque sabemos de nenhuma valia os elogios, justos ou não, para a
vida da eternidade, que exige a prática de boas ações e obras, enquanto na
Terra tudo é efêmero: riquezas materiais e destaques pessoais é, por vezes, a
ruína da vida espiritual, pois quer a fortuna monetária, quer a intelectual,
são consequências de compromissos astrais assumidos, para deles se fazer bom
uso na vida terrena.
Entretanto, pouquíssimos são
os que levam a cabo tais compromissos: a vaidade e a ostentação cegam as almas,
levando-as à perturbação, à vida de aparências, e fazendo-as esquecer por
completo os sérios compromissos assumidos em lucidez espiritual.
Contudo, é dever nosso falar
claramente ao leitor, ao nos referirmos ao autor desta obra, para que de
antemão fique sabedor de que foi no Brasil onde primeiro e melhor se escreveu
sobre espiritismo, cabendo, portanto, ao nosso país, como já o vem afirmando o
Racionalismo Cristão em suas obras, a glória da descoberta da Verdade, tal qual
a desejava transmitir à humanidade a grandiosa alma de Jesus.
Pinheiro Guedes não foi um
simples médico investigador, mas também um valoroso instrumento das Forças
Superiores, às quais serviu docilmente, pois se prestou, tanto quanto lhe foi
possível, a ser o seu porta-voz entre a elite social e cientista, justamente
para despertar aquele meio, o mais refratário à concepção da Verdade, e não
continuar a ser dito que o espiritismo é obra de nulos, analfabetos ou imbecis
saídos da plebe.
Da plebe, entretanto, saíram
Jesus, Viriato, Joana D’Arc, Galileu, Edison e tantos outros luminares da
humanidade, e nem por isso vemos menosprezadas as suas obras.
Esta obra enriquecerá a
biblioteca de doutos e simples estudiosos da vida fora da matéria, fazendo
parte do Racionalismo Cristão, iluminará a estrada da vida dos que desejam
viver e não vegetar neste mundo de misérias. OS EDITORES
Dedicatória
À Faculdade de Medicina do
Rio de Janeiro, Homenagem do Autor.
À FACULDADE
Tendo
aprendido a conhecer a alma, consignei-o nestas páginas, que trago como
oferendas aos mestres, que me ensinaram a conhecer o corpo.
Não é
rica nem mesmo vistosa a oferta; mas é real e valiosa conquista — prêmio
fecundo e galardão das lucubrações e pesquisas feitas no ignoto.
Ao
repositório e manancial das doutrinas hipocráticas, acorrem estas revelações,
quais silfos alígeros, portadoras da suma das doutrinas pitagóricas.
Et nunc ... ad
posteros.
Dr. Pinheiro Guedes
Ao leitor
A opinião pública, mal
orientada até por cultores do Espiritismo, parece convencida de que é mais uma
seita religiosa, acrescida às que já existiam, vegetando como parasitas à
sombra da frondosa árvore do Cristianismo.
Tem sido induzida em erro,
ciente ou inconsciente, pela imprensa, pelos sectários de todas as seitas
religiosas, pelos médicos e até por espíritas que, seduzidos pelas consequências
ou efeitos morais resultantes do conhecimento da doutrina, consideram-na uma
Religião.
A imprensa assoalha que o
espiritismo é a mais perniciosa de todas as doutrinas filosóficas.
Os religiosos, e não
religiosos, proclamam do púlpito e pela sua imprensa que ele é obra do demônio
e o maior inimigo da igreja.
Os médicos, na sua maioria,
propalam que ele povoa os hospitais de alienados e os cemitérios.
São as mil bocas da
ignorância pretensiosa, do obscurantismo científico, da intolerância religiosa
e do fanatismo estúpido que vociferam contra aquilo que não conhecem.
Essa grita infrene, toda
essa celeuma, fez surgir em meu espírito a ideia de oferecer aos espíritas, aos
médicos, aos sectários, à imprensa e ao povo estas páginas em que lhes mostro:
Ao povo, que o espiritismo é
como um farol, que guia o navegante ao porto;
À imprensa, que ele é a mais
racional, a mais consoladora de todas as filosofias, senão a verdadeira
filosofia, porque nos eleva e conforta a alma;
Aos sectários de todas as
seitas religiosas, que ele é o guia seguro nas jornadas infinitas para Deus, e
não um inimigo da Religião; não a condena antes a justifica;
Aos médicos, que ele não só
não é um túmulo, mas antes um berço, onde primeiro se embalou a divina arte de
curar; não é a morte, antes dá a vida; que em vez de povoar as colônias e
hospitais de alienados, abre-lhes as portas, para fazer sair desses ergástulos,
casas de torturas, antros de horror, alguns infelizes que para lá foram
empurrados pela mão da medicina materialista;
Aos espíritas — místicos ou
fanáticos — que ele não só não apresenta nenhum dos requisitos das seitas
religiosas; não tem templos, nem sacerdotes, nem culto externo; mas possui o
caráter e preenche os requisitos das ciências; emprega métodos, processos e
instrumentos que lhe são peculiares, para o estudo — observação e análise — dos
fatos que constituem o seu objeto.
Este trabalho é talvez como
a faísca elétrica que, atravessando as nuvens carregadas de eletricidade,
despede raios e trovões; e as desmancha em tempestades. Ele vai atravessar as
hordas adversas, agitá-las, sacudi-las, com as verdades contidas em suas
páginas.
Prevendo contestações e até
invectivas, conto de antemão com a crítica. Não a temo, antes a desejo; que
venha: severa, mas séria e justa.
Não tenho a pretensão de
haver feito trabalho sem senão. Não há obra humana perfeita. Não espero
aplausos. Não viso a glória; mas a Verdade.
Dr. Pinheiro Guedes
Niterói, 13 de agosto de 1900.
Origem da Medicina
A Medicina, como arte de curar, é filha
legítima do Espiritismo.
Estranha, ousada e paradoxal
parecerá essa proposição àqueles que não conhecem a doutrina espírita e ignoram
as origens da ciência hipocrática.
A História, entretanto, dá
testemunho e provas de sua veracidade; não obstante o véu de longevidade,
brumas dos tempos idos envolverem num manto de trevas o início, as origens de
todas as artes, senão de todas as coisas.
A crítica, porém, armada de
fino escalpelo, rasga esses véus; e, se ela o não puder fazer, a Razão,
analisando os fatos, procurando analogias, sopesando-lhes o valor, cria focos
de luz que iluminam as trevas, espancam as brumas.
Percorrendo os domínios da
História, penetremos no território da Mitologia, onde a Imaginação — artista
incomparável — cria lendas misteriosas, envolvendo a verdade em roupagens
fantásticas, que a velam e escondem aos olhos inespertos; aí, nessa região,
onde a fantasia domina como rainha absoluta, vamos encontrar o berço da
Medicina, nos templos erguidos em honra de Esculápio, o criador da arte de
curar, o deus da Medicina.
Os serventuários desses
templos, seus sacerdotes, eram chamados Asclepíades, do nome de Esculápio —
Asklepios, em grego — e assim também eram denominados os templos, onde os
doentes iam pedir remédios para os seus males; e também, quando curados, vinham
depor, em testemunho de gratidão, a descrição dos seus sofrimentos e a
indicação dos remédios com que se curavam.
Entre outros lugares, a ilha
de Cós, pátria de Hipócrates, possuía um desses templos. Foi aí, muito
naturalmente, que o Pai da Medicina encontrou os materiais com que seu grande
espírito construiu os alicerces da ciência médica.
Não só em Cós, mas em
Epidauro, Siracusa, Pérgamo, Esmirna e Atenas, mas também em Delfos,
certamente, onde havia o mais célebre dos templos, cujo ofício divino —
divinum est opus sedare dolorem — era
a cura das moléstias, foi Hipócrates buscar as primeiras noções da divina Arte
de curar.
Se, em Cós e nas outras
cidades onde havia Asclepions, templos de Esculápio, eram sacerdotes que oficiavam
discípulos ou descendentes de Esculápio, assim não era em Delfos; e isto é
importante sob o nosso ponto de vista, é argumento chave de abóbada; em Delfos,
cujo templo era dedicado a Apolo, o oficiante era uma Pitonisa.
A Pitonisa, sacerdotisa de
Apolo, era uma mulher do povo, de condição humilde, obscura, sem instrução nem
educação, virgem ou velha recolhida ao templo onde permanecia isolada, só
proferia os oráculos em certos dias sentada na trípode, sob a qual havia uma
abertura ou fenda no chão, de onde subiam vapores aromáticos; e assim
mergulhada numa atmosfera de perfumes era tomada de fortíssima agitação, e
então começava a falar, emitindo oráculos, ou respostas às interrogações que
lhe eram dirigidas, ou sentenças, que eram religiosamente registradas e
guardadas pelos sacerdotes ou serventuários do templo.
A Pitonisa é, portanto, um Médium.
Essa era a convicção dos
sacerdotes e do povo, que acreditavam ser um espírito divino que lhes falava
por intermédio daquela mulher.
Assim, pois, a Medicina,
como arte de curar, tem a sua origem nas revelações dos Espíritos.
— o —
Afirmei e demonstrei que a
Medicina, como arte de curar, se deve à comunicação dos Espíritos; e o fiz
baseando-me na História.
Essa argumentação,
entretanto, a meu ver, não é a melhor; constitui apenas um elemento de
convicção; a ratione, parece-me, a
demonstração é mais compreensível, mais convincente, cala mais fundo, torna-se
incontestável; os seus argumentos, os elementos de convicção encontram-se em
toda parte, somente é preciso saber vê-los.
Assim: a dor, o sofrimento,
a moléstia. — ninguém o contestará ninguém intentará sequer pô-lo em dúvida —,
são contingências da vida inerentes à criatura; é consequência inevitável,
quase necessária da luta do vivente com a Natureza; do organismo com o ambiente
ou meio em que surge e se desenvolve.
A dor material ou moral, um
sofrimento qualquer é, desgraçadamente, uma necessidade da vida, sem isso não
haveria progresso, pois que este produto da atividade pela liberdade tem sua
origem na necessidade, que significa falta; falta que representa um sofrimento;
sofrimento que traduz a dor.
A existência da primeira
família humana foi, de certo, a mais precária que se possa imaginar.
Seres fracos, ignorantes,
desprovidos de tudo, sujeitos às intempéries e às mil vicissitudes da vida: a
dor, o sofrimento, a moléstia, foram, sem dúvida, seus companheiros desde os
primeiros anos.
Em tais condições, como
prover às suas necessidades? Como conjurar seus males, obviar o sofrimento,
aliviar a dor?
A observação do que ainda se
dá em nossos dias, dos fatos que ocorrem por toda parte, quotidianamente,
responde a essas interrogações.
Quando sentimos uma dor,
levamos a mão ao sítio doloroso, instintiva, automaticamente, ou para afastar a
causa ou para alívio.
É por essa razão,
indubitavelmente, que a Mitologia dá ao pai ou mestre de Esculápio o nome de
Chyron; nome derivado do vocabulário grego, que significa mão.
O silvícola recorre ao Pajé,
que é o ser sacerdote, o intermediário entre ele e a divindade; aquele que fala
com Tupã, de quem recebe ordens e bálsamos.
Ainda mais: quem se sente
ferido, aquele a quem a dor punge, esse grita por socorro, mesmo achando-se só
e num deserto; pede, implora auxílio: auxílio que só pode vir da sabedoria e do
poder infinito, que é Deus, por intermédio dos executores de sua vontade que
são os espíritos.
Deus, inteligência suprema,
alma do Universo, só age indiretamente, posto que esteja presente em toda
parte.
Assim como o espírito humano
está no corpo todo, que é feitura sua, e só age por intermédio dos nervos;
assim também se pode afirmar, por analogia, que Deus, inteligência suprema,
alma do Universo, que é a feitura sua, só age indiretamente.
E, pois, quer apelando para
o auxílio divino direto, instintivamente, o que quer dizer por intuição ou
sugestão, porque o instinto é faculdade intelectiva do espírito; quer
recorrendo a um intermediário, o homem primitivo só achou recursos para debelar
os seus males na intervenção direta ou indireta dos espíritos.
E, portanto, a Medicina,
como arte de curar, é filha legítima do Espiritismo.
Espiritologia
O espiritismo é a ciência das ciências; ele as unifica em
uma síntese admirável.
O espiritismo é ciência profunda, vasta, eclética, cujo
estudo fornece conhecimentos, não só sobre o homem espiritual, mas também sobre
o homem corpóreo; e ensinamentos de ordem moral e de ordem intelectual.
Ele nos faz compreender melhor o mecanismo das funções, não
só das psíquicas ou mentais, mas, também das orgânicas ou vitais; e as relações
da alma com o corpo, cujas perturbações são causas predisponentes e até
determinantes de estados mórbidos.
O sono quer o natural quer o provocado pela hipnose ou pelos
anestésicos, assim como os sonhos e as alucinações, não podem ser explicados de
modo compreensível, racional e satisfatoriamente pelos processos fisiológicos
comuns e ordinários da escola organicista ou materialista.
O sono é a supressão das funções de relação; é a suspensão
da atividade psíquica; a quase cessação da vida animal.
Durante o sono o corpo repousa e a alma descansa.
Enquanto repousa, o corpo repara as suas perdas, refaz-se; e
a alma retempera-se, aprestando-se para a luta, enquanto descansa.
O sono, como a vigília, é um modo de ser do vivente; ambos
afirmam a existência, em antítese: pois a vida é dupla — vegetativa ou
orgânica, animal ou de relação.
As escolas materialistas procuram explicar o sono, quer o
natural quer o artificial — provocado ou mórbido — por uma espécie de paralisia
do cérebro, devida à sua compressão, ora pela falta, ora pela superabundância
de sangue.
Incontestavelmente, tanto a anemia como a congestão
acompanham-no ou se apresentam no sono; dado o sono, natural, provocado ou
mórbido, o aparelho cefálico se encontra num desses dois estados; mas, indicar
o estado ou a condição de um órgão ou aparelho, na realização de um fenômeno ou
de uma função; explicar o seu mecanismo ou a maneira de se efetuar, não é
determinar a sua causa; são fatos diferentes, não devem ser confundidos.
A observação registra que a perda de sangue, em quantidade
excessiva, e às vezes até a de uma pequena porção traz como consequência o
sono, o delíquio, a síncope ou a vertigem e mesmo a morte física.
Ainda outras manobras provocam o sono: a inalação dos
anestésicos, os passes magnéticos, a sugestão, o repouso e até o movimento,
quando cadenciado, um canto monótono e a só ausência de luz; tudo isso, todas
essas manobras são apenas condições para o sono; são, quando muito, causas
predisponentes.
A causa do sono, a única real, verdadeira, aquela que o
determina e impõe, é a necessidade da suspensão da atividade psíquica, a
supressão das funções de relação: a paralisação temporária da vida animal.
O sono é para a vida animal o que a fome e a sede são para a
vida orgânica: pela fome e a sede o corpo reclama alimentos; pelo sono a alma
pede alento.
O sono é também uma necessidade psíquica.
— Os sonhos e as alucinações são fenômenos puramente
psíquicos que não podem ser explicados fisiologicamente; por isso as teorias,
que a ciência materialista criou para explicá-los, são falsas e até irrisórias.
Por elas, os sonhos são produzidos por perturbações do
aparelho digestivo!
É o produto de uma atividade inconsciente!
É o fruto da supraexcitação de certos grupos de células
cerebrais, quando outros centros estão em repouso, daí a sua incoerência!
Não se lembram dos criadores de tais teorias esdrúxulas de
que há registrados sonhos autênticos, que foram verdadeiras profecias!...
Passa-se nos sonhos o mesmo fato que se dá no sonambulismo
lúcido: a alma do magnetizado vê e ouve aquilo que se dá a centenas de léguas: lê no passado e no
futuro. Fatos que o corroborem não faltam: encontram-se nos livros religiosos e
nos profanos, nos romances e nas páginas da História.
As alucinações estão no mesmo caso, não podem ser explicadas
fisiologicamente, porque nem são fenômenos psíquicos, mas fatos espiríticos.
A pretensão da ciência materialista a explicá-las, é
simplesmente ridícula.
Não se pode aceitar, seriamente, como perversão dos sentidos
— alucinação — a audição de palavras, frases e dissertações em língua que o
ouvinte não conhece, e que ele repete com dificuldade; ou ainda a audição de
uma peça de música.
Assim também a descrição exata da figura de um indivíduo,
que o vidente nunca vira antes, falecido ou ausente; descrição minuciosa de seu
porte, feições, atitudes e gestos habituais, o que revela a realidade e prova a
identidade da pessoa, embora só a ele visível.
São numerosos os fatos desta natureza, registrados na
literatura médica, na dramática e em outras.
Portanto, as teorias inventadas pelos materialistas para
explicar o como e o porquê dos sonhos e alucinações, são falsas; não passam de meras
hipóteses, sem fundamento, sem as condições das científicas.
Fenômenos puramente psíquicos e fatos espiríticos, como
certas alucinações, verdadeiros casos de Mediunidade, não obedecem às leis
orgânicas.
As nevroses, e, entre
elas, principalmente, o sonambulismo, a catalepsia e a loucura, não têm
explicação satisfatória e racional fora das teorias, princípios e leis
provenientes do estudo dos fenômenos espiríticos.
Os fenômenos, hoje estudados e vulgarizados sob o nome de Hipnotismo, e de há muito conhecidos pelos Mesmer, Puysegur, Dupotet,
e muitos outros, antes e depois deles; a chamada transposição dos sentidos, a penetração ou leitura
do pensamento e sua transmissão, assim como a exteriorização da
sensibilidade e outros, não podem ter explicação plausível, racional,
científica, senão na existência do corpo astral, corpo anímico ou períspirito, que é constituído pelo fluido etéreo ou fluido universal,
cuja existência foi, há pouco, demonstrada experimentalmente.
O Espiritismo, portanto, é uma ciência profunda, vasta,
eclética, cujo estudo é de suma utilidade.
— o —
Tendo afirmado que o Espiritismo é ciência vasta, profunda,
eclética, cumpre-me demonstrá-lo; porque hoje não basta afirmar, é preciso
provar, tornar a coisa evidente, palpável. O tempo do magister
dixit foi-se.
Obediente ao método provarei primeiro que é ciência,
demonstrando depois que é vasta, profunda, eclética; porque abrange o ciclo das
evoluções que o Espírito realiza desde o seu início, desde a sua origem.
Vejamos, para isso, em que consiste o que se denomina
ciência.
A ciência é o conhecimento das coisas, dos fatos e
dos fenômenos em si mesmos, em sua natureza e nas suas relações entre si e com
tudo o que os cerca: o meio, o ambiente.
Esse conhecimento só se obtém pelo estudo metódico,
observação atenta e análise minuciosa.
É, portanto, a ciência fruto de nossa inteligência,
resultado de nosso trabalho; ela visa um fim, satisfaz uma necessidade do nosso
Espírito.
O Espírito sente incessantemente necessidade de
investigar; é ávido de conhecimento; quer luz, mais luz, sempre luz.
O Universo é infinito; a avidez de luz é insaciável;
a matéria de estudo inesgotável.
A ciência é um corpo de doutrinas, sintetizando todas
as leis e princípios, deduzidos do estudo do Universo; ela é, pois, um conjunto
de ciências.
As ciências, portanto, são múltiplas e várias; tantas
quantos são os objetos de estudo; todas visam o mesmo fim, mas cada uma tem o
seu objeto, a matéria de que se ocupa: umas são concretas, outras abstratas.
Assim, pois, não podem todas aplicar os mesmos
métodos; mas cada qual reclama métodos, processos e aparelhos adequados à
observação e análise da coisa, fato ou fenômeno, que é o objeto do seu estudo.
É o que se vê o que se nota em todas as ciências até
hoje constituídas.
As Matemáticas, a Astronomia, a Física, a Química e
as ciências biológicas — Botânica, Zoologia, Antropologia e a moderna
Sociologia — todas têm a sua matéria de estudo; e serve-se de métodos,
processos e aparelhos apropriados, de acordo com a natureza do seu objeto e
segundo as necessidades do estudo.
— Preencherá o Espiritismo esses requisitos,
satisfará essas condições para merecer foros de ciência?
O Espiritismo tem por fim: esclarecer-nos sobre o outro
mundo, sobre a vida além-túmulo; provar a existência da alma, sua preexistência e sobrevivência ao corpo, satisfazendo
assim uma necessidade iniludível da nossa alma, aspiração incessante de nosso
eu.
Ele estuda os fatos extraordinários, mas numerosos,
numerosíssimos, que constituem uma ordem de fenômenos, até a pouco reputados
sobrenaturais; e por isso relegados como inobserváveis, indignos de estudos; os
quais, entretanto, convenientemente observados, provam a existência do
Espírito, esclarecem-nos sobre a vida além-túmulo, pondo sob os nossos olhos maravilhados,
estupefatos, num outro mundo.
Os fatos que constituem o objeto do Espiritismo, não
são sobrenaturais, nem mesmo extraordinários, senão porque escapam à observação
dos que não sabem vê-los; eles são naturais, como tudo quanto existe no
Universo; são comuns, ordinários e até frequentes.
Mas para vê-los, os observar, aprender a notá-los e
os reconhecer, quando e onde quer que se apresentem, era preciso descobrir o
instrumento capaz de registrá-los, tornando-os evidentes e palpáveis.
Esse instrumento é o Médium.
Achado o instrumento, estudado em suas aptidões,
começaram os fatos a serem observados, a princípio os espontâneos, mais tarde
os provocados, no intuito de reconhecer a causa produtora de tais fenômenos.
Como resultado dos estudos espiríticos, a
imortalidade da alma é estatuída em princípio, perfeitamente determinado por
provas irrefutáveis.
A sucessão das existências ou multiplicidade de vidas
corpóreas de uma individualidade consciente — o espírito humano — denominada reencarnação, constitui uma lei à que estão sujeitos todos os espíritos;
e é condição essencial ao seu progresso.
Assim, pois, o Espiritismo visa um fim, estuda uma
ordem de fatos, emprega métodos, processos e instrumentos exclusivamente seus;
cria teorias, estatui princípios, estabelece leis; satisfaz assim e preenche
todos os requisitos exigidos pelos foros científicos.
O Espiritismo é, portanto, sem a mínima dúvida, uma
ciência.
Ciência vasta, profunda, eclética, ele constrói a
síntese da vida humana, abrange o ciclo das evoluções do espírito, ab initio
ad eternum, do início ao infinito.
Seus princípios, suas leis têm aplicação universal; é
um fanal no meio das trevas que nos cercam; é um farol no mar tempestuoso da
vida.
É um farol no mar tempestuoso da vida, porque fazem
ver um porto de abrigo na calma, na resignação, na paciência; refúgios seguros
contra as tempestades morais, consequências de nossos vícios e erros, frutos do
nosso atraso, do nosso orgulho.
É um fanal no seio das trevas que nos cercam, porque
desvendando o mistério de como se opera o nosso progresso intelectual e moral,
pelo processo da reencarnação ou sucessão das vidas corpóreas, demonstrando a
preexistência e sobrevivência da alma humana, rarefaz, adelgaça o véu que
oculta à nossa vista uma série de vidas, cada qual menos luminosa, menos limpa
de erros, faltas, vícios e crimes; o que nos faz compreender o porquê o mundo é
uma escola, onde devemos aprender a amar o próximo como a nós mesmos; e como a
reencarnação é uma necessidade, pois que a vida corpórea é um meio de
reparação, aproximando um do outro — o ofendido e o ofensor —; ou reunindo em
uma mesma família, sob o véu da matéria e graças ao esquecimento do passado, a
vítima e o seu algoz!
—
o —
Demonstramos com argumentos tirados da História e
também por uma apreciação dos fatos inerentes à natureza humana, que a
Medicina, como arte de curar, é filha legítima do Espiritismo.
Provamos depois, e o fizemos por demonstração
analítica, que o Espiritismo é ciência, e ciência de observação, na qual também
se recorre ao método experimental.
Vamos, agora, mostrar por uma exposição de fatos, o
ecletismo e a profundeza e vastidão da doutrina espírita.
O fenômeno vital, denominado atavismo, cuja explicação pela escola materialista é inaceitável,
repugna à razão, por absurda, explica-se, entretanto, espiriticamente, de modo
racional e satisfatório, pela teoria da reencarnação; e o fato torna-se
evidente, palpável, indiscutível; porque fala à razão.
E, não só se compreende e se aceita o atavismo
psíquico — moral e intelectual — como também o mórbido e o orgânico; estes,
absolutamente inadmissíveis com a explicação materialista ou organicista; e
aqueles, ainda mais; porque não se compreende o seu mecanismo — o processo de
transmissão não se atina com o transmissor da herança.
Provada a existência da alma, ninguém de certo porá
em dúvida que é ela quem dirige o corpo, anima e domina: ela vai ser o
transmissor, o veículo dos vezos e cacoetes e também das moléstias.
Um espírito brutal deve ter um corpo grosseiro,
adequado às suas necessidades, para estar de acordo com a sua natureza.
Um espírito angélico tem, não pode deixar de tê-lo,
um corpo delicado, apropriado à agudeza do seu engenho, afinado pela sutileza
de seus sentimentos.
O corpo é para a alma o que a roupa é para o corpo:
um agasalho, um abrigo, contra as intempéries, um véu sobre a nudez.
Nem só o rosto, que se diz ser o espelho da alma, com
sua feição particular — a fisionomia — mas o corpo todo, no seu conjunto pela
proporcionalidade das suas formas e por sua atitude nos impressiona; não há
quem o não tenha experimentado; e essa impressão é agradável, simpática, ou
antipática; mas só a temos em presença de um vivente, criatura humana ou
animal; a emoção, que sentimos ante o morto, é mui diversa; é antes um abalo,
um choque, um sentimento de repulsão instintiva.
Assim, pois, a alma domina o corpo, envolve-o todo,
não está encerrada no seu interior, e até se revela na simples forma de um pé.
As mãos patenteiam de tal sorte a natureza e
tendências do espírito que, estudando-as, criou-se a quiromancia, cultivada na antiguidade
por sábios e filósofos: Artemídoro de Éfeso; Agripa (Henrique Cornélio) médico,
filósofo e historiógrafo; Robert Fludd, médico e filósofo; o sábio jesuíta Del
Rio e outros.
É, porém, sem dúvida, a cabeça que mais e melhor
mostra a influência da alma sobre seu corpo, com suas bossas e protuberâncias;
a face, sede dos músculos da expressão de nossas emoções, tão bem estudadas por
Darwin e Duchenne de Boulogne; a boca — larga ou estreita, de lábios grossos ou
finos, de comissuras levantadas ou abatidas, cuja forma, finalmente, traduz,
exprime uma variedade quase infinita de sentimentos e ideias; a boca forma e
emite a palavra; a boca estereotipa esses frementes estados d’alma — o pranto e
o riso!
E os olhos que são, por seu brilho e transparência,
como uns globos cristalinos, onde se refletem em cambiantes infinitas as
emoções da alma. E até o nariz e as orelhas; finalmente, todas as partes
componentes do rosto são delatoras das disposições e tendências do nosso
espírito.
Lavater, com seus belíssimos e mui interessantes
estudos das fisionomias, em que colaborou o grande Moreau de la Sarthe; e,
antes deles, Adamantius, médico do século IV; Porta (Giambattista), célebre
físico, inventor da câmara escura, que publicou um tratado — De humana
physionomia, — em Sorrento, no ano de 1586; Lachambre,
médico de Luís XIV; o célebre pintor Lebrun, e ainda outros; Gall e Spurzheim,
médicos, criando a frenologia, cultivada depois por Broussais, F. Combe, Vimont
e outros; todos eles são intérpretes da ação e da influência e domínio da alma
sobre o corpo; todos eles são os precursores no estudo das relações do espírito
com o corpo.
Esse estudo só o Espiritismo pode tornar completo,
fazendo conhecer o modo por que se estabelecem essas relações e como se formam
ou se criam as ligações entre o espírito e seu corpo; conhecimento impossível
sem o concurso, sem o auxílio do instrumento — o médium.
O médium vê e descreve os laços fluídicos que ligam o
espírito ao seu corpo; e assim, mas só assim e por esse processo o estudo da encarnação pode ser feito.
Sabe-se hoje que o espírito assiste, preside à
formação do seu corpo; transfundindo-se, consubstanciando-se nele pelo períspirito — corpo anímico —, molécula a molécula, órgão por órgão,
durante a gestação, até completar a evolução fetal; e dele toma posse inteira,
absoluta, à natalidade; assenhorando-se então totalmente do barco que aparelhou para navegar o mar tempestuoso da vida
material.
Sabe-se hoje; e isso é racional, cala na consciência,
sente-se que deve ser assim: é o próprio espírito quem escolhe, depois de
demorado estudo na vida espírita — durante a desencarnação — e busca, segundo
suas necessidades — de ordem moral e intelectual —, o país, a sociedade, a
família, os seus genitores, tudo enfim quanto deva e possa concorrer para o seu
progresso.
Assim é ele o principal, senão o único responsável
pelas contingências, pelas vicissitudes e dificuldades que o assoberbam durante
a vida corpórea.
Por esse modo admite-se que o espírito possa
transmitir; se aceita, porque é compreensível, que ele imprime em seu corpo,
igualmente com o tipo e a forma, sua feição característica, suas tendências
morais e intelectuais, dando mais desenvolvimento ora aos centros afetivos, ora
àqueles que servem a inteligência; de onde resulta a diferença de caráter, de
gênio e de temperamento que se observa nos indivíduos, desde a infância.
Assim se explicam e se compreendem as vocações; a
maior ou menor habilidade para as belas-artes ou para as artes mecânicas; e o porquê
se diz, e é exato, que a criatura nasce músico, poeta, artista, comerciante,
soldado, advogado ou médico.
Resulta desse fato, provém daí a importância do papel
da família na sociedade; e a responsabilidade social dos genitores, a quem
incumbe educarem a prole; constituindo o fim principal da educação reprimir, ou
ao menos, modificar as tendências perniciosas dos filhos, que cedo se revelam;
e acoroçoar e desenvolver as benéficas.
O espiritismo é um poderoso foco de luz, cujos raios
atingem as fronteiras da esfera intelectual e iluminam todo o ciclo da vida.
Ele esclarece e justifica as chamadas ciências
ocultas, explicando, racionalmente, suas deduções, os porquês da vida astral e
física.
A História Universal, a vida dos povos, sua natureza,
seu caráter recebem dele a mais viva luz.
E a que se esparge sobre as ciências médicas ilumina
todo o seu vasto território, devassando os mais profundos recônditos dos seus
domínios.
Na Antropologia, designação que abrange a Anatomia,
ciência da estrutura e conformação dos órgãos; a Embriologia, ciência da
formação e desenvolvimento do feto; a Teratologia, ciência das anomalias dos
indivíduos (os monstros) e dos órgãos (disformidades); o espiritismo revela,
desvenda e põe patente sob os nossos olhos o porquê desses fenômenos, sempre
desagradáveis; ora estupendos muitas vezes repulsivos.
Ele nos faz ver e compreender o como e o porquê uma
emoção perturba as funções do aparelho digestivo, que até certo ponto, isto é,
no seu mecanismo íntimo, nos seus processos físico-químicos, são independentes
da vontade; e as do aparelho circulatório, que também se efetuam fora desta
alçada; e cujo centro — o coração — tem, entretanto o seu ritmo perturbado, e
pode imobilizar-se, determinando a extinção da vida física, ao embate de uma
emoção violenta e brusca.
Estas funções, como todas as que têm por fim nutrir,
reparar, conservar os órgãos, e são por isso denominadas de vida vegetativa, se
exercem e operam sob o influxo direto e imediato de uma inervação que lhes é
peculiar — o sistema ganglionar, também chamado o grande simpático, constituído
por uma série de gânglios nervosos (reunião, grupo de células nervosas) ligados
entre si por cordões igualmente nervosos, verdadeiro rosário, composto de 19 a
25 gânglios para cada lado (os padre-nossos do rosário), que se encontra nas
cavidades esplâncnicas (região cervical, caixa torácica e ventre), junto à
coluna vertebral desde o atlas até o cóccix, circundando-a como um colar ou cadeia sem fim.
Posto que autônomo na sua função peculiar, o nervo
trisplânico, ou grande simpático, não só se acha separado do sistema
cérebro-espinhal, mas vive sob sua influência, é seu subalterno, está ligado a
ele pelos nervos aferentes, cordões nervosos que, partindo dos nervos cranianos
e dos raquidianos ou espinhais, penetram — um por um — todos os gânglios do
grande simpático, onde se originam os numerosíssimos filetes nervosos que,
acompanhando os canais circulatórios — sanguíneos e linfáticos —, envolvendo-os
como a hera envolve um muro, e penetrando suas paredes, dirigem-se com eles a
todos os órgãos e tecidos do corpo humano.
Nestas condições, só indiretamente os órgãos e
aparelhos da vida de nutrição recebem influxo do sistema nervoso
cérebro-espinhal, adstrito à vida de relação; pelo que, para explicar a
perturbação das funções digestivas e circulatórias, por traumatismo moral,
sente-se, reconhece-se a necessidade de outro agente, além dos nervos, capaz de
fazer compreender os efeitos de uma ação indireta, remota e, posto que
impalpável, tão enérgica, tão terrível que pode fulminar como o raio.
Esse outro agente é o períspirito, — corpo anímico —, constituído
de uma matéria etérea, parte do fluido universal selecionado e pertencente a
cada esfera ou mundo, e por via do qual o espírito se incorpora, consubstancia-se
órgão por órgão, molécula a molécula com o seu corpo, a cuja organização, a
cuja constituição e feitura ele assiste e preside semelhante ao pedreiro que
amassa o barro, prepara a argamassa, escolhe e afeiçoa o material com que faz o
muro e constrói o edifício.
Ao embate de uma paixão violenta, o espírito se
conturba, comove-se; o espírito se confrange, o períspirito se contrai
necessariamente, mais ou menos conforme o choque é mais ou menos violento,
inesperado e cruel; o períspirito contraindo-se diminui o seu influxo sobre a
molécula material, sobre a célula orgânica, sobre o órgão, que por isso perde o
calor, a energia, a atividade e até a vida.
Assim, desse modo, compreende-se como uma emoção
brusca e violenta pode, não só perturbar funções, que se não exercem sob o
influxo dos nervos da vida de relação, mas até aniquilar o vivente.
Eis como, com um pequeno raio de luz, o espiritismo
ilumina, esclarece pontos obscuros, da Anatomia, da Fisiologia, da Patogênese e
da Embriogenia, até hoje imperscrutados; e, sem essa luz, imperscrutáveis.
—
o —
Acaba de ver o leitor como a luz, que se irradia dos
estudos espiríticos, penetra nos mais fundos recessos de ciências positivas,
como são as antropológicas, fazendo achar solução racional para os intrincados
problemas de fisiologia patológica e embriogenia.
Supõe, talvez, que aí para a força iluminativa do
farol, que é o espiritismo?
Se assim pensa, engana-se, como vai ver; e para
convencer-se do seu engano, basta uma digressão pelo campo da Nosologia, onde
se encontram principalmente no terreno da Etiologia — um dos mais escabrosos —,
os mais difíceis problemas das ciências médicas.
Aqui o auxílio da ciência espírita é inestimável,
pelos recursos com que arma o médico para vencer as maiores dificuldades do
diagnóstico; pelos esclarecimentos que lhe fornece para explicar a origem de
certas moléstias, e também a resistência admirável do organismo às causas
morbigênicas.
Em geral, o indivíduo que é metódico, paciente e
calmo, que segue uma norma de vida regular e não é atropelado pelo revolutear
da sociedade; cuja atividade não é solicitada simultaneamente por uma
multiplicidade de coisas as mais disparatadas; esse tal é sadio, tem a vida
longa.
As estatísticas da mortalidade pelas profissões são
disso a melhor prova.
Para eles singra em mar sereno o batel da vida.
Aqueles, porém, cuja atividade é despertada e
instigada, quase incessantemente, por mil objetos diferentes; que vivem
contrariados sob a pressão de sentimentos deprimentes; esses são doentios, sua
vida raramente é longa; são eles que concorrem com a maior cifra para o
obituário.
Esses são os pilotos, cujas naves acossadas pelas
tormentas da vida, muitas vezes soçobram em meio da viagem; porque as ondas
enfurecidas, que são as paixões, gastaram, exauriram as forças, e com elas a
coragem, o ânimo ao timoneiro, que tomba vencido.
A maioria das enfermidades tem suas causas
predisponentes no enfraquecimento do espírito, que por
seu abatimento, por seu desânimo, não comunica, não transmite ao corpo a vitalidade
que nasce da energia.
A alegria é expansiva, ela avigora a circulação,
aquece, dá calor ao corpo, anima e robustece o organismo, mantém a saúde,
prolonga a vida.
A tristeza, ao contrário, é reconcentrada; ela
retarda a circulação, arrefece, tira calor ao corpo, desanima e enfraquece o
organismo, arruína a saúde, encurta a vida.
Mas, como os extremos se tocam, e todo o excesso é
mau, se a deprimente tristeza é funesta à existência, a alegria, quando
excessiva, materializada, nada racional, não o é menos, pode até fulminar.
São os proletários, para quem a vida é mais penosa,
mais cheia de contrariedades, os que povoam os hospitais; eles, de cujo seio
saem esses bravos, esses destemidos, esses heroicos pilotos, mártires do
progresso, cujos nomes, entretanto, a história, rara vez, registra; eles que
navegam em busca da verdade, afrontando as sirtes e cachopos do mar bravio que
é a vida humana!
— o —
Tendo mostrado e assim feito ver que as conturbações
da alma, seu abatimento e desânimo, pelas inúmeras e perenes dificuldades que a
assoberbam, quotidianamente, são causas predisponentes às moléstias somáticas,
pelo estado de languidez e falta de energia do organismo, para reagir sobre o circunfuso; e nesta designação estão incluídos todos os agentes
capazes de modificar o organismo ou alterar a saúde e aniquilar o vivente; quer
os de ordem material, quer os de ordem moral — os físicos e os sociais ou
sociológicos —; passo a mostrar, tornar visível, palpável, aquilo que,
entretanto, já de si é evidente, menos, porém, para os organicistas ou
materialistas; isto é que as Nevroses são moléstias
da alma, devidas a sofrimento do espírito, ou pura e simplesmente provocadas
por espíritos.
Dá-se o nome de Nevroses, em Medicina, a estados
mórbidos que consistem em perturbações funcionais, sem lesões materiais nem
causas apreciáveis; e que se observam principalmente na vida de relação, mas
também na vegetativa.
As nevroses com sede no aparelho digestivo, no
circulatório e no respiratório, raramente são impulsivas — isto é, são capazes
de dominar a vontade: a Dispepsia, a Asma e a Angor pectoris; aquelas, porém, que afetam a vida de relação, e são
constituídas por alterações da motilidade, da sensibilidade ou da inteligência,
perturbam, suspendem, alienam a vontade, subjugam a consciência; quase reduzem
a criatura humana às condições do bruto, da fera.
As primeiras têm por causa uma alteração de função,
dependente ordinariamente de um vício diatésico: o herpetismo, a
sífilis, a escrofulose, etc.
As segundas, as que afetam a vida animal, não se
filiam a causa alguma orgânica apreciável.
Destas, umas, como a Nostalgia e a Hipocondria, são mera
exteriorização de estados d’alma: outras traduzem uma desordem nas relações da
alma com seu corpo, como a Catalepsia; outras, como
a Histeria, representam estados complexos, misto de
desordens psíquicas e intervenção de uma vontade ou atividade estranha,
invisível — um espírito —; outras finalmente, como a Loucura na maioria dos casos, são fenômenos espiríticos, são fatos
da vida espírita. O doente, neste caso, é simplesmente um médium de incorporação, um possesso,
um obsedado.
O fenômeno de possessão (ou incorporação, na
linguagem espírita), que significa a possessão do espírito encarnado pelo
desencarnado; o qual se apossa do organismo, bruscamente e com violência; ou,
lenta e insidiosamente; e de um ou de outro modo na Histeria, é o que constitui
o chamado desdobramento da personalidade, que é antes uma duplicação do
indivíduo; porque, não podendo a alma separar-se completamente do seu corpo,
pois seria a morte; o que de fato se dá é a subjugação do encarnado pelo desencarnado, o predomínio
deste sobre aquele; que, não obstante, continua ligado ao seu corpo, na posse
dele, posto que contrariado, subjugado.
Isto é admissível, compreende-se; ao passo que o
desdobramento da personalidade, como diz o organicista, materialista
disfarçado, é inaceitável por absurdo; a unidade é indivisível; o homem é uno,
a criatura é indivisa.
A Loucura é, na maioria dos casos, uma obsessão; às
vezes, simples alucinação dos sentidos, outras vezes, desordem da inteligência
ou perversão do senso moral; outras, depressão, quase aniquilamento das
faculdades psíquicas, verdadeiro embrutecimento.
São estados d’alma, devidos à ação mais ou menos
direta dos espíritos desencarnados ou mesmo encarnados, influindo sobre as
criaturas de diversos modos: desde a simples sugestão — insistente, perene,
tenaz —, até a ação direta, enérgica, violenta, provocando os chamados ataques.
O espírito age movido pelo amor ou pelo ódio; sob o influxo
de um desses sentimentos, mas dominando sua paixão, ele procura captar a
confiança de sua vítima; sua ação é intencionalmente demorada, mas branda;
incessante, mas delicada; se, porém, a paixão o domina, a agressão é violenta e
brutal.
Assim se compreende e explica-se o porquê das formas
tão variadas, quase infinitas, da histeria, desde a simples tristeza ou
alegria, sem causa que as justifique, até à abstração, enlevo ou embevecimento
e o êxtase até a loucura; desde o estado em que a vítima canta ou dança, grita
e chora sem saber por que, até aquele em que, furiosa, rasga as vestes,
debate-se e cai por terra, convulsa, em contorções medonhas, horrorosas ou
lúbricas; as quais, para serem explicadas racional e satisfatoriamente, só
podem ser atribuídas à natureza do sentimento que anima, agitam e impulsionam o
espírito agressor ou obsessor.
E assim também se explicam as formas diversas da
Loucura, que não podem ser atribuídas a enfermidades do órgão da mentalidade;
porque a necropsia, praticada em indivíduos falecidos de moléstias
intercorrentes, logo em começo da Loucura, nunca revelou a mínima lesão
material do cérebro, sendo certo, entretanto, que se
encontram profundas alterações nos cérebros daqueles que sucumbem, após longo
tempo de sofrimento pela loucura; o que torna bem patente que tais
lesões são efeitos e não causas das perturbações psíquicas.
Estes fatos podem ser observados e analisados por
quem quer que seja.
E aqueles que o fizerem sem ideias preconcebidas, sem
sujeição a Escolas ou Seitas livres de quaisquer peias, hão de reconhecer sua
veracidade.
— o —
Não obstante já ter assim demonstrado, pois julgo
havê-lo feito; ou, se o quiserem ter ao menos patenteado a influência, a
efetividade da ação da alma sobre seu corpo e a dos espíritos sobre os homens
(dos mortos sobre os vivos); quero chamar, quero despertar a atenção do leitor
para um fenômeno que manifesta mais clara e positivamente o predomínio da alma
sobre seu corpo; esse fenômeno é o atavismo.
O atavismo é a prova evidente de que o espírito cria
o seu organismo, preparando, afeiçoando, mais ou menos habilmente, os
materiais, segundo suas necessidades, de acordo com o modo ou gênero de vida e
condição social a satisfazer, durante a existência corpórea, influi, decerto
inconscientemente, sobre o aspecto, sobre a forma ou certa aparência que, no
estado de completo desenvolvimento, no estado adulto há de apresentar o seu
corpo, ao qual imprime assim involuntariamente sem dúvida, por um processo que
é o verdadeiro atavismo, um cunho, certas disposições que
aparentam ou trazem a ideia de sexo diferente — um homem de formas e gostos
feminis; uma mulher de aspecto e aptidões varonis; ou ainda, o que não é raro,
o tipo de um animal e com ele os seus instintos, mais ou menos sopitados.
Este fato tão significativo, tão importante sob este
ponto de vista, como prova evidente do atavismo, o é ainda mais, sob o ponto de vista biogênico, porque
evidencia, torna palpável a filogênese, isto é, a
filiação, o encadeamento das espécies, que formam o reino animal; ele patenteia
por um indício claro, manifesto, incontestável, o caminho, o viaduto, a via
dolorosa que o espírito percorre na sua marcha evolutiva — genésica: formação,
individualização, aperfeiçoamento.
Esse fenômeno, o da conservação ou reprodução, não só
de disposições e tendências afetivas — o caráter, gostos, inclinações e
aptidões, mas até de certa feição, atitudes e formas —, é o que constitui o
verdadeiro atavismo; é ele certamente o efeito, o
resultado, o produto, não das causa fúteis que se lhe assinalam, mas de uma
causa eficaz, lenta, mas incessante, a qual não pode ser outra senão a
modalidade que o períspirito — corpo anímico, corpo astral dos
ocultistas — conserva, guarda, retém da forma e do caráter adquiridos em vida
anterior próxima ou remota.
No processo de formação, individualização e
aperfeiçoamento do espírito estão a razão de ser dos reinos da Natureza; eles
são os laboratórios, as oficinas onde se realiza o trabalho ingente e
maravilhoso da alma humana.
Cada um dos reinos consta de regiões diferentes,
ocupadas por Estados (as espécies) mais ou menos independentes (distintas) e
ligadas hierarquicamente (filiadas) dos mais simples aos mais complexos.
A hierarquia depende do número de oficinas; a mais
ínfima contém uma única oficina, a mais elevada encerra todas; ocupando-se cada
qual com um trabalho peculiar; cada uma executando o seu; as mais ínfimas,
separadas e sucessivamente, cada qual por sua vez, uma após outra, a começar
pela mais ínfima, até que, criadas todas e constituído o laboratório, passam a
funcionar simultânea e sinergicamente, concorrendo todas e cada qual com o seu
trabalho, convergindo os seus esforços para um mesmo fim — a criação.
Constituído o laboratório (o vivente) com as oficinas
necessárias (as parte componentes do corpo), e estas com os seus maquinismos
(os órgãos), ele entra em atividade e funciona sempre incessantemente, enquanto
as máquinas funcionam regularmente, e até que não possam mais ser reparadas; a
menos que um acidente não venha interromper o trabalho de transmissão do
movimento; porque então o laboratório emudece temporária ou definitivamente.
A reprodução, arremedo ou simulacro da estática
(formas, atitude, feição), é uma espécie de memória, memória física,
retentividade de formas, a qual se pode, ou antes, se deve considerar como
transformação, ou melhor, vitalização da força de
coesão, que é aquela que conserva, torna permanente a configuração dos corpos;
é o atavismo orgânico, corpóreo.
O mesmo fenômeno de ordem dinâmica, reprodução do
caráter, aptidões e tendências afetivas e intelectuais é o atavismo
psíquico, ao qual se deve reputar como uma
espécie de memória, não material, mas mecânica, e, portanto ainda
retentividade, que chamarei memória perispiritual, pois
que é o corpo anímico que conserva as modalidades de existências passadas.
O reflexo ou reprodução, em uma nova existência, de
formas e de caráter, idênticas ou semelhantes às de uma existência anterior,
próxima, dá ao homem caráter e formas feminis, e à mulher, caráter e formas
varonis.
Fenômeno idêntico se opera em relação à existência
remota; e então o homem ou mulher apresenta no seu todo ou em certos traços
fisionômicos, o tipo de um animal.
Quer um, quer outro caso, são facilmente
verificáveis.
Nem isso é novidade: foi a observação desse fato —
notável, mas não extraordinário ou excepcional — que sugeriu a Aristóteles e a
Lavater a ideia de conhecer o caráter pelos traços fisionômicos do indivíduo.
Eles acreditavam que as fisionomias, que apresentam
certa parecença, tal ou qual semelhança com animais, denunciam inclinações
análogas, tendências idênticas às desses animais.
E a observação, sempre e por toda parte, deu-lhes e
continua a dar-lhes razão, convertendo uma simples presunção em utilíssima
realidade.
Origem, natureza, evolução
da alma humana
O corpo é MATÉRIA
O espírito é FORÇA
Síntese Genésica
A seriação é lei universal.
Série de mundos:
Séries
materiais — séries espirituais.
Séries de
corpos — séries de seres.
Séries de
fatos — séries de leis.
Séries de vidas:
Tudo se liga
por séries;
É a variedade
na unidade.
Corpos e fenômenos, eis o
que se nos depara no mundo.
Os corpos são formados de
matéria.
Os fenômenos representam
movimento; o movimento é produzido por uma Força.
A matéria afeta os nossos
sentidos.
A Força se manifesta pelos seus efeitos.
Os corpos têm forma, ocupam
lugar no espaço, persistem.
Os fenômenos não têm forma,
não ocupam lugar, não permanecem.
Ali, a forma, a duração;
aqui, a modalidade, a sucessão.
Os corpos são numerosos, mas
limitados; gasosos, líquidos, sólidos.
Os fenômenos são
inumeráveis; variam ao Infinito.
O
Infinito — no
espaço e no tempo — constitui o Universo.
O Universo é o conjunto de
todos os sistemas planetários.
O sistema planetário é um
grupo de mundos.
Os mundos compõem-se de
seres.
Os seres são: uns, puramente
materiais, inertes, denominados inorgânicos; outros, chamados orgânicos, não
são puramente materiais, são constituídos de outro modo, são ativos, têm vida.
Os seres inorgânicos não têm
atividade própria; sofrem, sem reagir, a ação das forças que produzem os
fenômenos materiais.
Os seres orgânicos reagem
contra as forças externas; têm atividade própria, produzem fenômenos que se
denominam funções.
As funções são materiais e
espirituais.
As funções materiais são
apanágio de todos os seres organizados; as espirituais só se encontram nos
animais.
Os animais são seres
organizados, cujo organismo produz todos os fenômenos materiais, e exerce todas
as funções orgânicas, e ainda outras denominadas de relação.
As funções de relação são o
apanágio da animalidade; são funções sociais, puramente espirituais; umas as de
ordem moral, que são sempre conscientes; outras as de ordem sensual, carnal,
fisiológica, que são puramente animais; as quais são instintivas,
inconscientes.
As primeiras, as de ordem moral,
puramente espiritual, são o apanágio da criatura humana.
O homem é, portanto, um
microcosmo: Matéria e Força, corpo e funções.
A matéria, de que se forma o
corpo do vivente, não tem a mesma aparência, o mesmo aspecto, nem a mesma
composição da que constitui os corpos brutos; sendo, não obstante, formada dos
mesmos elementos; é uma matéria nova, matéria orgânica, matéria vitalizada,
criada para formar órgãos.
As forças que operam no
corpo organizado, já não são as forças cósmicas, mas forças biogênicas; aquelas
não geram funções, só produzem fenômenos de ordem material; estas criam funções
e produzem, além dos fenômenos materiais, outros de natureza diversa,
denominados vitais, elementos das funções orgânicas.
O corpo é sempre um e o
mesmo; tem sua origem na matéria orgânica, metamorfose da matéria cósmica.
As funções são múltiplas e
várias; têm sua origem nos fenômenos vitais, transmutações dos fenômenos
materiais; estes, produzidos pelas forças cósmicas; aqueles, pelas forças
biogênicas.
As forças biogênicas são
transmutações das forças cósmicas.
Estas criam a matéria
inorgânica e formam os corpos brutos, inertes, sem atividade própria, sem
iniciativa.
Aquelas criam a matéria
orgânica, de onde surgem os seres dotados de energia, atividade e iniciativa; o
que constitui a vida.
A vida é, portanto, a
manifestação suprema da força biogênica, que para esse fim cria o organismo, um
corpo composto de órgãos.
O organismo é assim o
instrumento da vida; é um aparelho que varia ao infinito, desde uma simples peça
— a célula vegetal — até a árvore; desde a célula animal — citode, amibo,
monera — até o maravilhoso conjunto de peças, combinadas com admirável
precisão, dispostas com justeza e na maior harmonia, para satisfazer
necessidades diversas, tendentes à realização de determinado fim: a formação de
instrumentos da vida — os corpos dos animais.
O animal é, pois, o produto
final das forças biogênicas; a manifestação mais completa da força vital, que
se encontra no mundo orgânico; a satisfação absoluta dessa necessidade suprema
— Necessitas suprema est Lex — a
necessidade de expandir-se, de produzir, de criar; que é a essência da Força e
poder Criador.
O animal é o microcosmo; em
seu organismo, preso ao mundo inorgânico pelos elementos componentes da matéria
orgânica, operam as forças cósmicas, produzindo fenômenos materiais —
mecânicos, físicos e químicos; operam as forças biogênicas, produzindo
fenômenos vitais, cujo objetivo é a conservação do indivíduo e da espécie,
tanto animal como vegetal; e por isso tais fenômenos são denominados: funções
da vida orgânica ou vegetativa, funções de nutrição e de reprodução.
E assim não só pela
matéria, mas também pelas funções orgânicas, o animal se prende igualmente ao
vegetal.
Além dessas, porém, o
animal exerce e manifesta outras funções, que lhe são peculiares,
exclusivamente suas; e que por isso o caracterizam: as funções de relação.
As funções de relação são
puras manifestações da vida animal. Elas têm por órgão o sistema nervoso, cuja
composição, cuja contextura e estrutura realizam o supremo esforço das forças
vitais; é o produto mais elevado da biogênese.
Temos visto que cada nova
ordem de fenômenos é o produto de uma nova força; as funções de relação são a
manifestação de fenômenos intelectuais, de ordem social, denominados fenômenos
psíquicos; eles não podem ser produzidos pelas forças biogênicas, pela força
vital.
A força que os produz revela
uma qualidade especial: a cognição; um caráter novo: a intelectualidade; uma
esfera de ação mais ampla: a sociedade, o mundo; tais são os atributos da força
psíquica.
A força psíquica, nova
entidade criadora, não deve ser considerada como uma entidade nova, erguida do
nada — ex nihilo nihil —; mas, por
analogia, como uma transmutação da força vital, a sincretização das forças biogênicas
e cósmicas.
As funções de relação, que
caracterizam a vida animal, é o apanágio de todos os animais, tanto racionais,
como irracionais.
E assim, por esse laço
funcional, como pela identidade de organização, acha-se ligado ao bruto
irracional o homem, o último elo, neste mundo da cadeia que o poder criador vem
formando.
Mas o homem, a criatura
humana, se distingue do bruto irracional por seus atos refletidos, pela
consciência, pela razão, pelo livre arbítrio e pelo seu engenho criador, que
são manifestações de natureza mui outra, que não aquelas que patenteiam os mais
inteligentes dentre os irracionais.
Esses fenômenos não podem
ser produzidos pelas mesmas forças, que produzem aqueles que se nos observam
outros seres; eles devem ter outra causa outra geratriz; porque cada ordem de
fenômenos é o produto de uma nova força; essa causa, essa geratriz, essa nova
força é o que se chama Alma Humana.
A alma humana é, portanto, a
síncrise de todas as forças que operam no mundo; agem e criam; ela é a suma
potencial — a síntese das criações originadas do amor eterno, infinito,
absoluto — Deus (Grande Foco).
Eis aí a trajetória da Força
ab initio ad eternum.
O ciclo evolutivo está
completo, até onde pode chegar à inteligência humana, armada com o seu
maravilhoso instrumento — a razão, que se deve chamar o criptoscópio.
A nossa razão é de fato e
incontestavelmente um criptoscópio, instrumento ou aparelho por meio do qual
pode ver o invisível, o oculto, o que não está patente; porque, de fato, é pela
razão que nós nos analisamos, que o nosso ser, o nosso espírito, se observa, se
estuda, se vê.
Criação da Matéria
Omnis potestas a Deo
Ex nihilo ...
nihil
A Terra é o antepenúltimo
dos planetas, que constituem o sistema solar.
O processo de sua criação
deve ter sido o mesmo, que o dos outros todos; no Universo há e reina ordem;
tudo se rege por leis invariáveis; a unidade por princípio, a variedade por
fim; aquela é substância, esta é forma.
A Astronomia tem demonstrado que todos os planetas têm a
mesma origem — uma nebulosa; criaram-se e formaram-se do mesmo modo, segundo as
mesmas leis e pelos mesmos processos; todos saíram da fotosfera solar.
A expansibilidade, sob a ação perene do calórico, vencendo a
atração, determinou, produziu a segregação de uma faixa da fotosfera, a mais
exterior, que, segundo as leis de atração, coesão e polarização, formaram um
agregado cósmico, à que se denominou uma nebulosa; cuja evolução deu em
resultado o primeiro planeta do sistema solar.
E assim se formaram,
indubitavelmente, todos os outros.
No início, portanto, não
existia, por ser absolutamente impossível, por ausência de todas as condições,
ente algum, nem mesmo um simples corpo inorgânico.
E, pois, os corpos e tudo
quanto hoje se encontra na Terra, aqui se criaram, em virtude e por ação das
potências e energias naturais, chamadas forças cósmicas; as quais não são
outros senão o calórico que opera a polarização, esta que determinou a atração; e a afinidade, que é um modo particular de agir dessas três forças
sincretizadas em uma, a qual cria as substâncias inorgânicas.
A nebulosa está em plena
marcha evolutiva.
Cria-se o planeta; fixa-se a
órbita em que há de mover-se.
A matéria cósmica
constitutiva da nebulosa, expurgada dos átomos que constituíram a parte sólida
e a parte líquida, forma a atmosfera terrestre.
A Terra é um ovo; a
atmosfera é a casca; a parte líquida é a clara, a parte sólida, a gema; ora, o
ovo é uma célula; a Terra é, pois, uma célula, cujo núcleo é a parte sólida; o
blastema a parte líquida; a matéria cósmica é o protoplasma; o fluido universal
— o éter — é o ambiente, o meio em cujo seio, a Força das forças, o princípio
eterno, infinito, absoluto, incompreensível, irredutível, age e opera as
maravilhas da criação.
Calórico, polarização,
atração, afinidade são, portanto os fatores do mundo inorgânico, que surgiu da
matéria cósmica, porção desagregada da fotosfera solar.
A análise da atmosfera
revela a existência dos seguintes corpos: oxigênio, azoto, ácido carbônico e
vapor de água.
Encontram-se também na
atmosfera: emanações de diversas naturezas — gases, poeiras, matérias animais,
vegetais e minerais, miasmas e outros eflúvios.
A água é uma combinação do
oxigênio com o hidrogênio; líquido denominado água é, pois, um produto químico
— o protoxido de hidrogênio.
Encontram-se, porém nele, em
solução ou suspensão, todos os corpos simples, em estado de liberdade e
combinados.
A água das fontes, a dos
rios e lagos, e a dos mares, como a da chuva, é sempre o protoxido de
hidrogênio; mas diferem todas entre si pelas substâncias que contêm em maior ou
menos proporção, minerais, vegetais e animais.
A Terra, a parte sólida ou o
núcleo do planeta, é o produto das combinações dos corpos simples, ou
elementares, entre si: o oxigênio, hidrogênio, carbono, e todos quantos a
Química tem descoberto.
Está criada a matéria
inorgânica; formou-se o mundo mineral.
As forças cósmicas continuam
em atividade.
No Universo não há inércia,
o movimento é incessante, perene.
A atividade é essencialmente
produtora; e as forças essencialmente ativas, agindo sobre a matéria
inorgânica, criam a matéria orgânica.
Criação da matéria orgânica
A crisálida tece o seu casulo; é um viaduto sobre o maior dos abismos.
A metamorfose é à base da evolução.
Formando o globo terráqueo
pela condensação da matéria cósmica, constando de três partes distintas, mas
unidas e superpostas; uma central sólida — a terra —; outra líquida — a água —,
envolvendo a primeira 3/4 ou 4/5 partes, de modo a formar com ela um esferoide;
e a terceira, gasosa — a atmosfera —, que abrange e envolvem completamente as
duas centrais — o globo —; não há aí matéria orgânica; só existem corpos
simples e compostos; estes, devido à união daqueles, ligados ou combinados dois
a dois, três a três, denominados compostos binários e ternários.
A água, por exemplo, é um
binário, composto de dois simples, o hidrogênio e o oxigênio; a ganga — uma
pedra porosa, cor de ferrugem —, é um ternário: ferro, carbono e oxigênio.
Não se encontra aí um só
composto quaternário, isto é, uma combinação de quatro corpos simples em
determinadas proporções — matéria orgânica.
O que constitui a matéria
orgânica, matéria dotada de vitalidade, mas ainda não organizada, não é outra
coisa senão a combinação química de uns tantos corpos simples: carbono,
hidrogênio, oxigênio e azoto que são elementos da matéria inorgânica, e que se
unem sob a ação de leis químicas.
Mas é a sua combinação em
certas condições, em certas e determinadas proporções, a começar pela do
carbono com o oxigênio e o hidrogênio, que prepara que inicia a transição da
matéria inorgânica para a orgânica: são esses primeiros compostos que encetam a
metamorfose da matéria bruta em substância vital.
Encontram-se no organismo,
quer vegetal quer animal, estas substâncias, por isso denominadas orgânicas; e,
entretanto, elas são meros compostos químicos, uns azotados, outros não; os não
azotados vegetais compõem-se de carbono, oxigênio e hidrogênio, e são a
celulose, os amidos, a dextrina, a goma, os açúcares: de cana, de beterraba, de
frutos, de leite e glicose.
Todos esses corpos, tão
diferentes na aparência e por suas propriedades físicas e químicas, têm,
entretanto, a mesma composição atômica; a causa, portanto, de sua diferença, a
razão de ser do caráter particular de cada um, deve ser outra que não a
combinação química; e não pode deixar de ser a sua constituição molecular, a
disposição, o arranjo de suas moléculas, sua estrutura finalmente porquanto
fora de relações das moléculas entre si (estrutura), e além dos elementos (os
corpos simples) que entram na composição das substâncias, e fora o número de
átomos com que cada corpo simples concorre para a criação de uma nova
substância, não se descobrem não se atina com outra causa, outra origem de suas
qualidades físico-químicas.
Os corpos graxos, a cera, as
resinas, os óleos, que são produtos orgânicos, constam dos mesmos elementos,
carbono, hidrogênio e oxigênio; tais são: a cânfora, a cerina, o timol, a
miricina e outros.
Os ácidos vegetais
compõem-se dos mesmos elementos: o ácido málico, o tartárico, o cinâmico, o
tânico, o oxálico, o fórmico.
Como se vê, nestas três
séries de corpos, constitutivos dos vegetais e seus produtos, a diferença se
estabelece pelo predomínio de um dos três componentes sobre os outros; assim:
na primeira série predomina o carbono; na segunda, o hidrogênio; e na terceira,
o oxigênio.
As substâncias azotadas
vegetais são as matérias corantes e os alcaloides.
As matérias corantes, entre
as quais prima a clorofila, são compostos quaternários.
A clorofila é o aparelho por meio do qual se opera a metamorfose da
matéria inorgânica em substância orgânica; é por ela, mediante a ação da luz,
que os corpos minerais se desdobram e formam novas combinações, que constituem
a matéria orgânica.
Os alcaloides também são
compostos de carbono, hidrogênio, azoto e oxigênio, que faltam alguns: por
exemplo, a nicotina, eles são bases orgânicas, que se encontram combinadas com
ácidos orgânicos ou minerais.
A análise quantitativa dos alcaloides
mostra que sua composição difere muito da dos corpos não azotados; assim: ao passo
que a nicotina compõe-se de pequeno número de átomos de carbono, hidrogênio e
azoto, e não contém oxigênio; a estricnina contém dois átomos de oxigênio, dois
de azoto, vinte e dois de carbono e vinte e oito de hidrogênio, a solanina, alcaloide
das solâneas.
As substâncias não azotadas
do reino animal são, como as do vegetal, hidro carburetos: a matéria
glicogênica e a glicose, que se encontram no fígado, no sangue e no quilo; a
inosite, nos músculos; e o açúcar de leito, no leite; a dextrina, no sangue e
nos músculos dos herbívoros; e no manto dos tunicários, a celulose.
Nas séries dos ácidos, que
são numerosas, citamos os seguintes: ácido fórmico, acético, propiônico,
butírico, valeriânico, caprílico, cáprico, palmítico, esteárico e oleico.
Os três últimos destes
ácidos, combinados com a glicerina que é um álcool triatômico, formam as
gorduras animais: palmitina, estearina e oleína.
A gordura humana é uma
mistura de palmitina e oleína; a mistura da palmitina com a estearina produz a
margarina; elas se encontram em quase todos os órgãos, tecidos e líquidos do
corpo humano.
Encontra-se mais na massa
encefálica e nos nervos um líquido oleaginoso, o ácido glicerofosfórico; a
colesterina, que também se encontra no sangue e na bílis.
Cumpre citar ainda, entre as
substâncias não azotadas, os ácidos: oxálico, sunícino, benzóico e o láctico,
que é o mais importante; ele se encontra no leite, nos sucos gástrico e
intestinal e também nos músculos.
As substâncias azotadas
animais são como os vegetais: corantes, álcalis e ácidos.
As matérias corantes são todos
compostos quaternários mais complexos, como a hematina, matéria corante do
sangue, a mais importante de todas, em cuja composição só entra o ferro e o
enxofre; a bilirrubina, a biliverdina, a urobilina e a melanina que forma o
pigmento cutâneo e dá cor aos olhos.
Essas matérias são ricas de
hidrogênio, mas o carbono predomina nelas.
As substâncias alcalinas da
economia animal são também compostos quaternários, não muito numerosos, cuja
composição atômica é inferior à do grupo vegetal idêntico; isto é, o número de
equivalentes ou átomos dos corpos simples, que a análise revela em cada uma
delas, é muito menor do que aquele que o mesmo processo desvenda nos vegetais.
São elas: ureia que se
encontra no fígado, no sangue, na linfa, no suor e na urina; sarcina, nos
músculos, no baço, no fígado; guanina, no pâncreas e no fígado; xantina, no
fígado, no baço, no pâncreas, no cérebro e nos músculos e na substância
nervosa; tirosina, no baço e no pâncreas; leucina, nas glândulas salivares, na tireoide,
nos gânglios linfáticos, no pâncreas, no baço, no fígado, nos rins, nas
cápsulas suprarrenais e na substância nervosa e outras.
Como se vê, a composição dos
álcalis, ou bases orgânicas de origem animal, não é idêntica à dos vegetais,
não apresenta a mesma regularidade quanto à proporção dos componentes.
O grupo dos ácidos é menos
numeroso do que o dos álcalis; neles se nota mais regularidade na proporção dos
componentes, e o número de átomos com que entra o oxigênio é sempre avultado;
entretanto, o elemento predominante é o hidrogênio, são eles: o oxalúrico, que
se encontra na urina; o úrico, no sangue, nos pulmões, no fígado, no baço, no
pâncreas, no cérebro e na urina dos herbívoros; inósico, no suco muscular;
glico-cólico e tauro-cólico, ambos na bílis e na urina.
Além desses, encontra-se no
organismo o ácido sulfocian-hídrico, na saliva parotidiana, cuja composição
difere da de todos os outros.
A análise química descobriu
no suor e na urina uma substância sulfurosa que se denominou cistina; e nos
pulmões e nos músculos, outra denominada taurina; e nos diversos líquidos,
inclusive o esperma, duas substâncias fosforadas: a lecitina e o protagon que
ainda não foi perfeitamente determinada sua notação química.
Para completar a enumeração
dos elementos que entram na constituição dos corpos, falta apenas indicar os
corpos simples na sua totalidade, os ácidos e as bases inorgânicas, também
chamadas óxidos; e os sais resultantes das combinações dos ácidos com os
óxidos; e finalmente os albuminoides que são as verdadeiras substâncias
orgânicas, as bases do organismo animal.
Os corpos simples, que
entram na constituição do corpo humano, são: hidrogênio, oxigênio, carbono e
cloro, em todos os tecidos e líquidos, e na maioria dos tecidos: enxofre, nas
substâncias albuminoides, no sangue, no suco dos tecidos e secreções; fósforo,
no sangue, na substância nervosa, nos ossos, dentes e líquidos do organismo;
flúor, nos ossos, dentes e sangue; silício, no sangue, na saliva e na bílis, na
epiderme, nos cabelos e na urina; sódio, no sangue, em todas as secreções e nos
tecidos; potássio, nos glóbulos vermelhos, na substância nervosa, nos músculos
e nas secreções; cálcio e magnésio, nos órgãos, nos ossos e nos dentes; lítio,
no sangue e nos músculos; ferro e manganês, no sangue, na linfa, no quilo, na
bílis, no leite, no suor e na urina; cobre e chumbo, no fígado, no baço, na
bílis e nos cabelos.
Os ácidos: clorídrico que em
combinação com a soda ou óxido de sódio, forma o cloreto de sódio, o chamado sal
comum, tão abundante no mar, se encontra por toda parte do organismo.
Este ácido se acha em
liberdade no suco gástrico, onde é o único; o fluorídrico, nos ossos e nos
dentes; o fosfórico, nos ossos e nos dentes, na substância nervosa e nos
líquidos orgânicos; o sulfúrico, no sangue, no suco dos tecidos e nas
secreções; o silício, no sangue, na saliva, na bílis, na urina, na epiderme e
nos cabelos.
As bases ou óxidos são as
combinações de um dos corpos simples, metal ou metaloide, com o oxigênio ou com
o hidrogênio: a soda se encontra no sangue, na bílis, no suco pancreático e na
urina; a potassa, nos glóbulos vermelhos, na substância nervosa, nos músculos,
nos leite e na maioria das secreções; a cal, nos órgãos, nos ossos e nos
dentes; a magnésia, nos líquidos orgânicos, nos ossos e dentes; a amônia, no
sangue.
Os albuminoides, também
chamados princípios imediatos, são os corpos complexos, em cuja composição entra
sempre o carbono, o hidrogênio, o oxigênio, o azoto e o enxofre.
Eles são a base primordial
dos organismos; neles se geram as células, que formam os tecidos e todos os
órgãos dos vegetais e dos animais.
Os albuminoides são
substâncias amorfas, incristalizáveis, e fermentescíveis, inodoras e inspiradas
no estado normal; neutras, nem ácidas, nem alcalinas; sob ação dos ácidos e dos
álcalis decompõem-se, o que também sucede, sendo abandonadas à ação dos agentes
cósmicos, dando pela decomposição os seguintes produtos: ácidos — oxálico,
acético, fórmico, valeriânico, fumárico e esparágico; corpos graxos voláteis,
leucina, tirosina e amônia.
Os principais são: albumina
do sangue; albumina do ovo, caseína, fibrina, vitelina, miosina, globulina,
hemoglobina, sintonina, substância amiloide e peptonas.
Dos albuminoides
se derivam imediatamente os elementos dos tecidos orgânicos: a gelatina, que é à
base do tecido conjuntivo e do ósseo; a condrina e a elastina, que são das
cartilagens e outros tecidos elásticos; e a ceratina, dos tecidos epiteliais e
substâncias córneas: os pelos, as unhas e o couro.
Como se vê, a matéria,
chamada orgânica, resulta, provém, nasce da reunião dos corpos simples,
inorgânicos: carbono, hidrogênio, oxigênio e azoto com um átomo de enxofre ou
fósforo e mais alguns outros, poucos, combinados entre si, em proporção
definida, formando séries de corpos diversos, que se originam de um mesmo ponto
de partida e se multiplicam quase infinitos, por ligeiras alterações
quantitativas, ora de um ora de outro, de seus elementos componentes, e pela
disposição ou agrupamentos de suas moléculas.
Assim, pois, são em número
de dezoito os corpos simples, que se encontram na constituição das substâncias
orgânicas; substâncias que são matéria dos corpos, que têm crescimento
limitado, cujo elemento constituinte tem uma forma variável; são pouco
estáveis, de existência limitada, temporária e determinada.
Estes
são os atributos da matéria organizável, e dos corpos ou seres dotados do que
se chama vitalidade, que é um modo de ser, de existir diverso do dos minerais
ou corpos brutos.
Mas, como, por que processo,
a que causa se deve atribuir a criação da matéria orgânica?
Vimos
que os seus elementos constituintes são minerais, que se combinam, dois a dois
ou em número de três, nunca mais, para formar a diversidade, quase inumerável,
dos corpos brutos, inorgânicas, cujos caracteres são: o crescimento ilimitado,
a forma invariável e persistência ou duração indeterminada.
Esses
não são como vimos as condições de existência da matéria orgânica.
Portanto, a causa
originária, determinante, a geratriz, a Força criadora da matéria orgânica, da
substância capaz de, por sua variabilidade, formar órgãos, deve ter atributos,
qualidades, caráter diferente do das forças físicas e químicas — a afinidade
atômica, a atração molecular, que são puro efeito, mero resultado da polarização.
A polarização ou imanização
é o fenômeno que se opera em certos corpos, por ação do ímã ou magneto, o que
lhes dá a polaridade, isto é, orienta a vibração de seus átomos, em sentidos
opostos, de modo a formar polos, bipartindo-o igualmente, a começar pela
molécula, pelo átomo central, que se torna ponto neutro, tendo uma metade
boreal e a outra austral.
Explica-se assim e se
compreende a afinidade atômica e a atração molecular.
Mas a propriedade
imantadora, a faculdade de polarizar, não deve ser só do ímã, ela deve existir
em muitos outros corpos, senão em todos, por que a eletricidade e o magnetismo,
de que ela parece ser a manifestação, existem em todos os corpos, em maior ou
menor proporção.
Portanto, é lícito concluir
destas considerações que todos os fenômenos físicos e químicos têm por causa
originária a polarização; que, por isso, é incontestavelmente o agente, o motor
das combinações atômicas, e o laço, o elo que prende as moléculas constituintes
dos corpos, no mundo inorgânico.
Ora, no mundo orgânico, os
fenômenos são os mesmos, isto é, dão-se composições e decomposições químicas,
com a diferença de se efetuarem entre certos elementos, em número limitado, e
sempre os mesmos, combinados diversamente.
Mas o caráter, as
qualidades, os atributos da substância, da matéria que resulta destas
combinações, são muito outros, são completamente diferentes dos das combinações
químicas, que formam a matéria inorgânica; tais são: a viscosidade, o
estado-pastoso, nem sólido, nem líquido; a pouca estabilidade, ou diminuta
coesão; o crescimento por intuscepção, e outros.
E, pois, que assim é a causa
geratriz, originária, a força criadora da matéria orgânica, dessa substância
que, por sua pouca estabilidade, é capaz de formar órgão, células e tecidos;
posto que análoga, senão idêntica à polarização,
deve ser de outra ordem e de categoria superior; sua energia, sua atividade,
produz fenômenos mais variados, mais complexos do que as simples combinações
químicas do mundo inorgânico: fenômenos que tendem a satisfazer necessidades de
outra natureza; a criação da matéria orgânica — o protoplasma.
O protoplasma, a mater das substâncias vivas, é um
produto constituído por carbono, hidrogênio, azoto, oxigênio e enxofre; é o
primeiro fruto dessa sinergia, dessa força ou atividade que, tendo a mesma
função, a mesma tarefa, visando o mesmo objetivo que a força de polarização, é, não pode deixar de ser,
a sua transmutação, a transformação da polarização, coordenadas e enfeixadas
—sincretizadas as forças físico-químicas, constituindo uma nova força.
Essa
nova força é a fermentação, força fermentativa ou, em linguagem técnica,
fermentividade.
Fermentividade
Crescite et multiplicamini
A concatenação, combinação ou composição das forças
primitivas — cósmicas e físico-químicas —, sincretizadas, constitui a
fermentividade, que, agindo sobre os compostos quaternários, torna-os aptos,
dá-lhes capacidade para chamar a si e incorporar mais um elemento — o enxofre
—, como na caseína ou mais dois elementos — o enxofre e o fósforo —, como na albumina;
e desse modo se produz, forma-se uma substância mole, viscosa, pastosa, nem
sólida nem líquida, sem estrutura apreciável, a qual se denomina protoplasma.
Assim, pois, a fermentividade é para a matéria orgânica o
que a afinidade química é para as substâncias inorgânicas — a força, o poder
criador.
A fermentividade é a evolução da afinidade química; assim
como a afinidade química é a transmutação da atração interatômica, que por sua
vez o é da polarização.
O protoplasma é, pois, um composto, um agregado, um amálgama
de substâncias minerais, ligadas entre si por uma força, que, exercendo uma
função, senão idêntica, análoga à da afinidade química que eu denomino afinidade
orgânica ou fermentividade.
É no meio líquido, no seio dos mares, nesse ambiente quase
vivo; porquanto, o mar como que tem vida; e, se não a tem propriamente, a imita
e arremeda, oferece o seu simulacro, apresenta a sua imagem; ele se agita,
move-se, palpita, tem vozes; ora brame furioso, atirando-se de encontro aos
cachopos, despedaça, destrói tudo quanto encontra; ora murmura apenas, como que
geme e chora, quando se lança brandamente sobre as praias, onde se deita
sonolento.
É no seio dos mares, disse e repito, onde primeiro se forma,
e aparece essa matéria mole, viscosa, pastosa, nem sólida nem líquida, que se
chama protoplasma; a matéria orgânica, a matéria vitalizada, o seio fecundo,
onde se origina e nasce o germe da vida — a célula; essa matéria diferente de
todas as outras até então existentes; essa matéria, cada uma de cujas moléculas
representam a união de cinco elementos minerais, ligados entre si, em virtude e
por efeito de uma atração, que não é simplesmente mecânica, como a
interatômica; nem também puramente química, como a que se denomina afinidade;
mas que, por analogia de seus efeitos, deve se chamar, e eu a denomino: afinidade
vital ou orgânica: essa matéria, matéria orgânica — o
protoplasma —é o casulo da crisálida, é o viaduto lançado sobre o maior dos
abismos.
Eis a matéria orgânica.
Formação da célula
A célula é o pórtico da
vida. Começa a individualização, a seleção, a coordenação.
A constituição molecular do
protoplasma, devida à presença do quinto elemento que lhe conferiu moleza e
viscosidade, é a condição para a formação da célula.
Em suspensão no meio
líquido, em que se gerou, encontra-se o protoplasma sob a ação das forças
gerais primitivas: mecânicas, físicas e químicas; indestrutíveis, permanentes,
perenes; ação mecânica do calórico, ação física da atração, ação química da
afinidade; e também sob o influxo de uma nova força resultante da conjugação ou
síncrise das anteriores, predominando entre elas a afinidade, a qual por isso
eu denominei afinidade orgânica.
São, pois, essas forças
que, agindo incessantemente, simultâneas e sinérgicas, se sincretizam na força
vital para criar a célula.
Entre duas correntes
caloríferas, uma que sobe do centro da Terra, outra que desce no raio solar,
uma porção de protoplasma se imanta, polariza-se, constituindo um centro de
atração; outros e mais outros se formam, cada qual agindo sobre certa zona.
A polarização leva as
partículas mais densas a se reunirem num ponto central; forma-se desse modo o
núcleo, constituído pelas moléculas mais pesadas, sobre as quais a atração se
desenvolve mais pronta e energicamente; a porção menos densa, que fica em torno
do núcleo, constitui o blastema, que
se mantém, antes da formação da membrana envolvente, graças às forças
combinadas de polarização, atração e coesão e à influência dos centros
limítrofes; cada um dos quais impera, segundo a sua energia, sobre certa zona,
limitada por essas energias dependentes da maior ou menor riqueza de
corpúsculos em cada zona.
Eis criada a célula.
Como se vê, não foram outras
senão as até aqui conhecidas, agindo sinergicamente, as forças eficientes da
criação da célula; mas, esse fato, por sua natureza, não pode ser atribuído a
nenhuma dessas forças, operando isoladas ou conjuntas, nem mesmo simultâneas,
porém separadas; ora, outras não existem além delas; portanto, para explicar
tal fato, de modo consentâneo com a razão, lógica e satisfatoriamente, somos
necessariamente levados a apelar para uma combinação ou disposição peculiar, a
considerá-las reunidas, congregadas e sincretizadas em uma nova potência, cuja
energia, virtude ou modo de agir, diverso e superior, justifica sua existência
distinta, que se designa pelo nome de força
vital.
A força vital, portanto,
é a transformação, a transição por coordenação e síncrise das forças
primitivas; e, agindo pelas suas componentes, como ficou exposto, ela cria a
célula, o instrumento, o aparelho para a metamorfose da matéria orgânica.
A célula é um corpúsculo
microscópico de forma ordinariamente esférica ou oval, constituído por uma
matéria mole, viscosa, mais ou menos densa, ora homogênea, ora granulosa — o
blastema —, apresentando no seu interior, encerrando ou envolvendo uma parte
mais densa, um ponto escuro, o núcleo.
Assim, pois, aquilo que se
chama célula, a um arranjo molecular, é uma coordenação dos elementos do
protoplasma.
— Como se opera esse arranjo,
essa discriminação e coordenação dos elementos do protoplasma?
— A que princípios, a que leis
obedecem a matéria orgânica na formação, na criação da célula?
À lei de atração: os corpos
se atraem reciprocamente, na razão direta de suas massas e na inversa do
quadrado das distâncias, que os separam; à lei de polarização: toda molécula sob a ação de calorias opostas,
imanta-se; à lei de afinidade: dado
o contato entre dois corpos de eletricidade diversa, eles se combinam para
formar um novo corpo; à lei de coesão:
os corpos são tanto mais estáveis, tanto mais inalteráveis, quanto menos
complexos; são leis gerais a que a matéria obedece nas suas transformações.
O princípio da
individualização, oriundo da necessidade da divisão do trabalho, para
regularização e aperfeiçoamento da função, rege toda evolução, sem a qual não
há progresso.
A célula é o cadinho da evolução.
Todo organismo, quer
vegetal, quer animal; os tecidos e os órgãos, que os constituem, compõem-se de
células.
Eis o COMO, o PORQUÊ e PARA
QUE se cria a célula.
Tal qual se criaram os
átomos, pela mesma razão e para o mesmo fim; elementos absolutamente invisíveis
e irredutíveis da matéria; eles se reúnem como vimos em virtude da força de
atração interatômica, que é feito da polarização, como demonstramos, e
fundem-se, combinam-se, formando, constituindo todos os corpos do reino mineral
— o mundo inorgânico.
Seguindo as mesmas normas, e
convertidas a polarização e atração em afinidade química, que é uma solicitação
especial; porque, aqui, já não obedecem aos componentes à mera orientação
vibratória, que constitui a polarização simples, em virtude da qual dois átomos
quaisquer se reúnem; mas, a uma solicitação de ordem superior, não simplesmente
vibratória, mas química; dois elementos compostos diversamente, um eletropositivo,
outro eletronegativo, ou um ácido e um óxido entram em combinação para
constituir um corpo mais complexo, um sal.
Aqui, a matéria obedece a outra
necessidade, a uma necessidade de ordem mais elevada — a criação de corpos de
grande estabilidade e resistência, como requer a função a preencher: a formação
da crosta terrestre, composta de sólidos e líquidos.
Surgiu depois a necessidade
da criação da matéria orgânica, e com ela a formação da célula, o cadinho ou
retorta onde se opera a metamorfose das substâncias inorgânicas em matéria
orgânica.
Os corpos que têm a
propriedade de modificar ou decompor as substâncias com que se acham em
contato, sem sofrer alteração, são denominados fermentos, em química orgânica.
Esse fenômeno é reprodução
de fato análogo na química mineral, e se chama catálise.
Ora, na química fisiológica
ou bioquímica, observa-se o mesmo fenômeno, temos a repetição de fato idêntico,
produzido pela célula.
A célula, portanto, é um
fermento, mas fermento fisiológico, ela opera no seio dos albuminoides, como o
fermento químico sobre as substâncias fermentescíveis.
Como o fermento, que não é
modifico em sua constituição, assim também a célula quer vegetal, quer animal,
não sofre alteração, e cresce, aumenta de volume e multiplica-se, exercendo ação
catalítica sobre os líquidos em cujo seio se formou.
O modo de crescimento da
célula não é o mesmo que o do crescimento dos corpos brutos ou não constituídos
de matéria vitalizada; estes crescem, aumentam de volume por aposição, aqueles
por intuscepção.
Para o crescimento por
aposição, uma molécula se reúne a outra, e outra, mais outra, todas da mesma
natureza, idênticas todas.
No crescimento por
intuscepção, não há uma simples adição, mas consubstanciação, incorporação por
absorção da molécula que se pôs em contato com a célula; a qual é aí consumida
ou atravessa a camada periférica; e, penetrando no interior da célula, é do
mesmo modo consumida ou assimilada.
A assimilação é a primeira função vital, a função primordial aquela
por onde começa a vida: é o início de uma série de funções, que, surgindo na
célula vegetal ou animal, se incrementam até ao fastígio — a árvore, no reino
vegetal; o homem, no reino animal.
— O que é a assimilação, como
se opera, e que forças concorrem para a sua realização?
É uma função simples,
produto de operações complexas, devida a forças diversas, agindo
sinergicamente:
Formada a célula, acha-se
constituída uma individualidade, um centro de atividade, agindo em todos os
sentidos, em virtude da força vital que o agita e impulsiona; força biogênica,
sincretização das forças primitivas: mecânicas, físicas e químicas e
fermentivas.
Como centro de atração, ela atrai todas as moléculas
que se encontram dentro dos limites de sua energia; mas por efeito da
polarização, umas aderem, outras são repelidas; aquelas, em virtude da
afinidade química, entram em combinações, produzindo compostos diversos:
sólidos, líquidos e gasosos; estabelecem-se duas correntes, uma centrípeta,
outra centrífuga: início da vida de nutrição; os elementos que entram, são os
alimentos da célula; os que saem, são os excretos, os resíduos.
A célula cresce,
desenvolve-se; e obedecendo às mesmas forças, em virtude das mesmas leis,
multiplica-se por efeito da assimilação.
A multiplicação das células
promove, determina agrupamentos diversos, de que resultam as mais variadas
combinações de formas, e com elas os diferentes tecidos de que se compõem os
organismos; são fenômenos de individualização.
Temos até aqui estudado a
evolução da força pari-passu, com as
metamorfoses da matéria; precedendo sempre, a análise das transformações da
matéria, às transições das forças, pelo que a muitos parecerá que a transição
da força é efeito da transformação da matéria.
Antes de passar além, lembro
aos que assim pensarem que o fenômeno primordial é a polarização, efeito do
calórico, que é a força inicial; e a coesão, atração, afinidade e
fermentividade são transições de polarização, como foi demonstrado; e que a
causa precede necessariamente o seu efeito.
Só a necessidade da clareza
de exposição, para a compreensão de fenômenos de ordem metafísica, já obriga a
tratar do fato antes da pesquisa das causas e do seu mecanismo; além de que
essa é a marcha da análise. Demais, a matéria é o palco, o cenário, onde se
desenrolam as peripécias, o enredo da peça — a criação.
Vimos que a polarização é
efeito do calórico: ela produz a atração, a coesão e a afinidade química;
estas, reunidas e agindo sinergicamente, são a força vital, que cria uma
substância de consistência diversa da de todas as outras, formadas até então; e
a cria pela junção de mais um elemento aos quatro, sobre os quais vinham
operando aquelas forças; a essa substância se denominou protoplasma, matéria
orgânica em cujo seio se gera a célula, corpúsculo oval, germe, origem, início
dos seres organizados, dos dois reinos da Natureza — o vegetal e o animal —, em
que se manifesta a vida.
No processo de formação da
célula, como foi exposto, não agiram outras forças senão a polarização com os
seus desdobramentos — atração, coesão, afinidade química; assim, pois são elas
mesmas e não outras que, reunidas e sincretizadas, se convertem em força
biogênica — FORÇA VITAL.
A força vital é, portanto, a
sincretização das forças primitivas, forças universais.
Vamos acompanhá-la em sua
evolução; e veremos: como ela se desdobre em tantas forças secundárias, quantas
são precisas para satisfazer as necessidades de seu desenvolvimento; as quais
se convertem, por sincretização, em FORÇA PSÍQUICA, síntese suprema da vida na
Terra.
Tríade vital
Assimilatividade
Motricidade
Sensitividade
Criada a célula, ela opera
como um fermento no meio em que se gerou; surge com ela um novo processo de
transformação da matéria, é a Fermentação.
Na matéria inorgânica, era criadora das combinações químicas
— a afinidade; na matéria orgânica, é a fermentividade a geratriz das
metamorfoses da matéria; lá, era a simples afinidade química; aqui, as
solicitações não são determinadas pela simples atração ou repulsão, promovidas
pela polarização; aqui, a força vital, sincretização daquelas forças, criou um
aparelho, a célula, cujos elementos constituintes têm certa ordem de colocação,
certa disposição, formando partes distintas de um todo; é a individualização
que começa; é a divisão do trabalho, que se impõe desde a origem da vida.
No limite da célula, estabelecido não só pelo grau de sua
energia, mas também pela oposição, criada pela potencialidade das células
vizinhas, forma-se uma membrana, cujo papel, cuja função, cujo fim, é impedir a
passagem, para o interior da célula, de quaisquer elementos; é um meio de
seleção.
Esta membrana é, pois, o
instrumento da diálise.
A diálise é o processo de
separação, discriminação ou seleção dos elementos em dissolução ou suspensos
nos líquidos.
Estabelecem-se duas
correntes: uma de fora para dentro, denominada endosmose; outra de dentro para fora da célula — exosmose; aquela leva os ingesta, esta traz os excreta.
É o início da vida de
nutrição.
Os elementos, que penetram
no interior da célula, entram em combinação com os do conteúdo — o blastema; e
formam compostos, que vão incrementar a célula; a isso se denomina, em
biologia, assimilação.
É esse o primeiro ato, o
primeiro fenômeno propriamente vital, é o primeiro ato funcional de um
organismo.
Temos assim o pórtico das
funções da vida vegetativa, que denominaremos assimilatividade—, ou capacidade de consubstanciar, força de
absorção e conversão do elemento absorvido na própria substância do corpo
absorvente, nos seus constituintes.
A assimilatividade ou força
de consubstanciação faz crescer a célula; com o crescimento, que não pode ser
ilimitado, pois obedece a certas e determinadas condições (limitação da zona de
influência do núcleo, disposição ou arranjo molecular), a célula divide-se e
subdivide-se, multiplica-se, reproduz-se.
Com a divisão e multiplicação
da célula, a força vital, que se fez assimilatividade, para conservação,
nutrição e reprodução da célula, converte-se em motricidade, capacidade de mover-se, faculdade de movimento,
potência motriz.
Um tentâmen, um ensaio, os
primeiro lineamentos da função fizeram-se com a osmose, que é uma dupla corrente; e, portanto, movimento de
moléculas, determinado pela diferença de densidade entre o conteúdo da célula e
o ambiente; fato devido à existência da membrana envolvente da célula.
O movimento é, portanto, na
essência um fenômeno de atração e repulsão; e por consequência um efeito, uma
resultante da polarização.
As células se deslocam,
movem-se, solicitadas umas pelas outras, em virtude da polarização; se
aglomeram, reunindo-se e aderindo pelos polos, o positivo desta com o negativo
da outra; as correntes eletromagnéticas se tornam mais intensas, cada célula é
uma pilha; novos agrupamentos se formam, e com eles outros tantos centros de
polarização, cuja energia depende do número e do volume dos componentes.
A esta circunstância se
prende a forma de cada um dos agrupamentos, assim como a disposição, arranjo ou
colocação dos elementos.
E desse modo se forma os
diversos tecidos; é a individualização, é a divisão do trabalho que se acentua
mais, com a criação de instrumentos melhor afinados, mais bem dispostos,
apropriados ao desempenho de novas funções.
A disposição das células, em
forma circular ao redor de um centro, prepara a contratilidade ou retratilidade, início do movimento de deslocação,
para o qual também concorre a modificação do ambiente; modificação determinada
pela absorção dos elementos assimiláveis; o que estabelece o enfraquecimento e
a cessação da corrente endosmótica, ao passo que a exosmose continua, mantida
pelos fenômenos bioquímicos, que se realizam no interior das células.
Cessada a corrente
centrípeta ou endosmótica, a centrífuga ou exosmótica continuando, dá-se a
formação de núcleos, que operam como centros de atração, de onde resulta a
divisão da célula, sua multiplicação ou reprodução.
E assim se inicia a grande
função da reprodução dos seres; cujo intuito é a conservação da espécie.
Como se vê, do que fica
exposto, todas as funções, que constituem a vida orgânica de todos os seres,
tanto vegetais como animais, se acham esboçadas na célula.
A célula é o pórtico da
vida.
A função primordial, sem a
qual a vida é impossível — a nutrição
começa por um processo quase puramente mecânico, a osmose, seguida de embebição e transformação dos elementos hauridos
de um ambiente limitado; e assimilação
dos produtos dessas metamorfoses químicas; de onde resulta o aumento de volume
da célula, o seu crescimento por intuscepção; o que determina a formação de
centros de atração no interior da célula; e, como consequência, a sua divisão
ou fragmentação em tantas outras, quantos são os centros ou núcleos, que se
constituíram.
E assim multiplica-se,
reproduz-se a célula.
A nutrição conserva o
indivíduo; a reprodução conserva a espécie; esta função é a evolução daquela.
A vida vegetativa toda
termina aí o seu ciclo.
Vejamos agora a gênese das
funções animais, começando por notar: que a principal, aquela que precede todas
as outras, serve-lhes de substratum,
lhes dá origem, é a sua geratriz, o ponto de partida da vida animal — a sensitividade.
A sensitividade, que há de
converter-se em sensibilidade e
depois em sentimentalidade, é a
animalização da Força vital; do mesmo modo que a assimilatividade foi a vegetalização,
e a fermentividade foi a vitalização
por crase (contração) e síncrise (passagem, transição) das forças
físico-químicas, efeitos, modalidades — elas mesmas — da polarização, que a seu
turno provêm do calórico.
Um ensaio de sensitividade
já se nos revela na célula, antes mesmo de se estabelecer a diferença entre a
célula vegetal e a que há de ser a geratriz do reino animal.
Analisando detida e
profundamente o processo da assimilação, nota-se a faculdade que a célula tem
de discriminar ou escolher, entre os elementos atraídos, aqueles que podem ser
assimilados.
Essa discriminação, essa
escolha é precedida dos seguintes fenômenos: os corpúsculos, obedecendo à lei
da atração, aproximam-se da célula, se põem em contato com ela; esse contato
provoca ou determina uma vibração, que se transmite da membrana envolvente ao
conteúdo, produzindo ondas, que ou extinguem-se ou repercutem do centro para a
periferia; no primeiro caso, o contato é simpático, a impressão homeopática, o
elemento adere e é assimilado; no segundo caso, o contato é antipático, a
impressão, alopática, o corpúsculo é repelido.
Eis aí bem delineada, clara
e vivamente desenhada a imagem da sensação, como se efetua no organismo o mais
complicado; somente aqui, os traços são mais vigorosos, o colorido mais vivo,
há a diferença que se nota entre o esboço e a obra completa.
Assim, pois, a sensitividade,
que é a primeira manifestação vital perceptível, começa na célula.
O característico da
animalidade, aquilo que destaca, separa, distingue o animal do vegetal é o
movimento.
O vegetal se fixa ao solo,
prende-se a ele, estreitamente, de tal sorte que, mui raramente não morre onde
nasceu.
O animal não só não se fixa,
nem mesmo se prende ao território onde nasce, mas desloca-se, move-se; quase
nunca se extingue onde primeiro viu a luz.
O germe dessa função ou
faculdade, que é privilégio da animalidade, se encontra na vibratilidade,
efeito, como já vimos da polarização aplicada a elementos cuja imantação ou
força de atração não é tão enérgica como nos sólidos, nem tão fraca como nos
fluidos; do que resulta certa instabilidade, que cria o estado pastoso.
É esse estado pastoso, com a
sua viscosidade, a condição do movimento; o instrumento criado pela força vital
para realizar o movimento.
Assim, pois, o movimento, ou
melhor, um ensaio, um tentâmen, um vislumbre dele já existe no protoplasma, é a
contratilidade.
E, se se atender a que ele
é, na origem, um efeito mecânico, não estaremos afastados da verdade,
atribuindo-o à força primordial — o calórico.
Dessa análise resulta que a
nutrição, a sensibilidade, o movimento — a tripeça da vida — surge no
protoplasma; sendo para notar que o movimento — distintivo da animalidade — vem
de mais longe, surge antes da sensibilidade e esta vem primeiro que a nutrição;
a qual, entretanto, é à base da vida.
Nutrição — assimilatividade ou força de
assimilação; sensibilidade — sensitividade
ou força de percepção; movimento — motricidade
ou força de deslocação; são desdobramentos da força vital; são os instrumentos postos a serviço da célula para o
seu desenvolvimento.
Desdobrada nessas três
poderosas alavancas, a força vital cria a vida vegetativa; trabalho
preparatório para obra de maior valor; andaime, escada para construção de
edifício destinado às mais altas funções.
Durante o quartel desse
exercício propiciatório, chamemo-la força
fitogênica.
Força biogênica
Formação
dos seres
Se autem
genuit.
O aparecimento dos vegetais e dos animais,
na superfície da Terra, realiza-se, como se vai ver, do mesmo modo, pelos
mesmos processos e em virtude das mesmas leis, sob cujo influxo surgiu do seio
da matéria cósmica, o reino mineral.
O calórico produziu a
polarização; esta é a base fundamental, a origem da atração, que agindo
permanentemente constituiu a coesão; e todas reunidas, operando simultânea e
sinergicamente, formam a afinidade química; que é a operária do reino mineral,
a geratriz do mundo inorgânico.
Foram essas forças — pois
que tudo quanto manifesta energia, age e reage, produz quaisquer efeitos, se
chama força; foram essas forças — físicas e químicas — que, do seio da
nebulosa, a antepenúltima que se desprendeu e separou-se do foco de energia e
centro de vida, denominado o Sol, tiraram o elemento árido — a terra, e o
elemento líquido — a água, distintos um do outro, diferenciados por sua
constituição, separados por sua natureza, mas jungidos pela força de atração; e
criaram o globo terráqueo.
Formado o planeta, aquelas
forças, que como tais, são sempre ativas, continuaram a operar sobre os
elementos retirados da matéria cósmica, que se foi rarefazendo até ficar
reduzida às condições de uma mistura permanente de gases, de que se compõe a
atmosfera terrestre.
A parte mais densa, mais
pesada, o elemento árido, ocupou o centro, por efeito da atração; a imediata em
densidade, o elemento líquido, em consequência da fraca coesão de seus
componentes, o que lhe dá fluidez, formou os mares, os lagos e os rios, que
ocupam as anfractuosidades, as partes baixas do núcleo do globo.
A vida não podia surgir
indiferentemente, em qualquer das três partes componentes do planeta; porque,
para a realização de um fato, de um fenômeno, de qualquer coisa enfim, são
precisas condições apropriadas, faz necessário um meio adequado.
Essas condições, esse meio
adequado não se encontrava, nem na atmosfera, por sua demasiada instabilidade,
tampouco no núcleo do globo terráqueo, cuja consistência, cuja dureza, ou
antes, fixidez e imobilidade de seus elementos, é um empecilho às
transformações, e oferecem excessiva resistência à ação da força biogênica,
que, embora constituída pela síncrise das forças cósmicas, não tem o mesmo
poder; assim, pois, a vida só podia seguir o meio líquido.
No seio vastíssimo das
águas, sob o influxo das mesmas forças e em virtude das mesmas leis,
formaram-se inumeráveis porções de matéria vitalizada, substância biogênica — o
protoplasma dos filósofos naturalistas.
As células, que se criaram
em cada um desses laboratórios de vida, são em número infinito, mas iguais,
idênticas todas; todas sem nenhum atributo, sem nenhuma qualidade que as
distinga uma das outras.
Estamos em território
neutro; é o chamado reino dos protistas; nem plantas nem animais.
A diferenciação há de fazer
surgir dessa multidão os dois grupos de seres, que manifestam a vida ou pelos
quais a vida se revela no mundo.
Por um simples artifício,
que resulta de uma ação química, se estabelece a diferenciação; as células de um
grupo, agredidas por um raio de luz solar, se aquecem, se imanizam e atraem
moléculas de ferro, cuja absorção, cuja assimilação confere ao protoplasma a
propriedade, a faculdade geratriz do reino vegetal.
Causas diversas, físicas,
mecânicas, de origem eletromagnética, e outras concorrem para a realização de
tal fato; a circunstância de se encontrarem, no meio em que flutua o
protoplasma, átomos de ferro; e a disposição das células, aí geradas, cuja
polarização desperta a sua afinidade para absorver e assimilar o ferro, são
condições; as causas eficientes são a atração e a afinidade, às quais precede e
excede a necessidade da criação do
reino vegetal.
Força
fitogênica
Alma
da planta
Todo vivente tem alma:
A alma é o motor, a
diretriz, o agente, o que preside.
As células, que absorveram e
assimilaram ferro, é a origem do reino vegetal; elas dão nascimento às algas,
ponto de partida, tronco de onde saíram todas as plantas, que hoje se estendem,
numa variedade quase infinita, por sobre a terra envolvendo-a num manto de
verdura.
As células, cuja disposição
eletromagnética não lhes deu a afinidade necessária para assimilação das
moléculas de ferro, dão nascimento aos cogumelos,
verdadeiros parasitas do reino vegetal; eles não gozam da faculdade
indispensável ao preparo do seu alimento; não podendo desdobrar ou decompor os
compostos inorgânicos, que se encontram no seu ambiente, não só não se desenvolveriam
não se propagariam ou reproduziriam como até mesmo se extinguiriam a míngua de
nutrição.
Caso estranho, inexplicável!
Vegetais, eles o são incontestavelmente; nutrem-se, entretanto, como os
animais; alimentam-se, absorvendo substâncias imediatamente assimiláveis!
Coisa estupenda!
Alimentam-se como o animal; são fixos como o vegetal; geram-se e vivem no seio
de substâncias orgânicas ou materiais em decomposição; morrem onde nasceram!
Admirável processo de
diferenciação! Pela simples adição de uma molécula de ferro às moléculas de
carbono, hidrogênio, azoto e enxofre, que reunidas e combinadas em certas
proporções e dispostas de certo modo, constituem a matéria vitalizada, se cria
o germe, forma-se o início do mundo vegetal!
Para a transição do mundo
inorgânico para o orgânico, bastou a adição de uma molécula de enxofre; para a
criação do reino vegetal adiciona-se aos cinco elementos congregados e
consubstanciados em uma nova entidade — o protoplasma — um único elemento, uma
molécula de ferro; e forma-se e cria-se o instrumento, por meio do qual a
célula, assim constituída, vai agir sobre o ambiente, decompondo os corpos
inorgânicos, desdobrando-os e transformando-os em substâncias orgânicas!
Admirável de simplicidade e
de grandeza!
A exposição do
desenvolvimento do reino vegetal em sua marcha evolutiva, acompanhando a força
vital em seus processos para a criação dos órgãos e aparelhos, mediante os
quais realiza as operações, cada vez mais complexas, para satisfazer as
necessidades que surgem de sua marcha ascendente, na formação dos degraus da
escada por onde caminha para a perfeição; além de não ser de absoluta necessidade
para a demonstração da tese — a alma
humana, o Espírito é a evolução da força —; seria longa e fastidiosa.
Demais, se o reino vegetal
precede o animal, como vivente; este não procede daquele, senão indiretamente.
O reino vegetal tem a sua
razão de ser, como um modificador do meio cósmico; é o ensaio dos processos
biogênicos.
Deixemos, pois, a força
vital no seu ingente trabalho de criação do reino vegetal, em que vires acquirit eundo; no qual avigora e
aperfeiçoa as três alavancas — nutritividade,
motricidade, sensitividade — que maneja nas suas operações; e passemos a
observá-la em sua evolução animal.
O chamado reino dos
protistas consta de corpúsculo microscópico, invisível a olhos desarmados, nem
vegetais nem animais, porém células; algumas dentre elas agitadas, dotadas de
vibração, como se uma corrente eletromagnética as percorresse; outras imóveis,
paralisadas, como se nenhum fenômeno se operasse nelas, como se nenhuma força
as agitasse.
A observação atenta e
paciente verifica que aquelas, as vibráteis, se fixam e desenvolvem-se, dando
nascimento a corpúsculos idênticos as segundas, as imóveis; ao passo que estas,
evoluindo, dão nascimento a corpúsculos idênticos às primeiras.
A diferenciação ainda se não
operou.
A incorporação, como vimos
de um átomo de ferro a uma célula, basta para convertê-la em célula vegetal.
A célula, que não absorve,
não incorpora ferro, deve ser a geratriz do reino animal. E assim se estabelece
a diferenciação.
Força zoogênica
Alma
animal
Ela é para a alma humana o
que o embrião é para o homem.
A natureza é simples em seus
processos e fecunda nas suas criações; não se precipita; caminha a passos
lentos, mas seguros e uniformes; passa de um extremo a outro, de um hemisfério
ao oposto, suavemente, como deslizando; sem abalos, sem sobressaltos —; branda,
calma, engenhosa, inventiva; faz das trevas luz — ex fumo lucem; passa do frio ao calor — a frigore ad calorem; do espiritual ao material — ex spiritu ad materiam; do éter ao
universo — ab oethere ad universum.
É assim que da pequena porção de matéria glutinosa, um
glomérulo — amibo, citode, monera, empregando os processos mais simples, forma
e faz vir à luz a criatura humana!
É para isso que se esforça e
trabalha a natureza, o poder criador, a Força;
porque é sua essência; é condição de sua existência: agir, produzir, criar.
Formados os instrumentos, de que a força biogênica necessitava para criar o aparelho de redução,
indispensável à modificação do meio ambiente: a sensitividade, a motricidade
e a nutritividade, em cuja feitura
entraram as forças primitivas — cósmicas físicas e químicas: a força biogênica,
aperfeiçoa, desenvolve e avigora os instrumentos, elaborando o reino vegetal,
em cujo trabalho sua investidura, sua feição é a filogênese.
Preparada a tripeça da vida,
a força biogênica constitui-se, arma-se em força zoogênica, agindo na célula, que se não incorporou uma molécula de
ferro, e onde ela jazia inerte, inativa, enquanto a fitogênica lhe preparava o meio ambiente.
Pondo em jogo as suas
alavancas — sensitividade, motricidade e assimilatividade, o amibo, o citode, a monera se desenvolvem,
crescem e se transforma, ou antes, o que é mais conforme a verdade é
transformada pouco a pouco, em organismos policelulares, segundo nô-los faz ver
o sábio Professor Haeckel nas suas obras — a Criação e Antropogenia.
Não sendo o meu intuito demonstrar a evolução dos
organismos, mas a da Força que os
cria, rege e anima, remeto o leitor destas páginas, curioso e cheio de ambição
de conhecer a evolução dos corpos organizados, às obras do ilustre Mestre, o
mais coerente dos materialistas; e sigo o meu rumo, visando o invisível com o
meu criptoscópio, esse maravilhoso instrumento, mais poderoso do que o
telescópio; aparelho para devassar os mistérios; e assim consigo penetrar nas
regiões até hoje vedadas, nunca antes perlustradas pelas inteligências, ao
menos que eu saiba.
Gênese da alma
A unidade supõe a
continuidade.
A correção das forças
implica, impõe a sua unidade.
A metamorfose da matéria é consequência
da lei de continuidade.
A sincretização das forças é
consequência da lei de correlação.
A natureza do problema cuja solução busquei e venho
apresentando, é de tal transcendência que, até hoje, ninguém ousou, que eu saiba
ainda ninguém intentou, sequer, formulá-lo e considerá-lo de ânimo resoluto.
—
O que é a alma humana? Qual a sua origem? Como se formou? Gera-se com o
corpo? Já existia? De onde vem?
São interrogações que se levantam diante dos homens cultos,
hirtas, horripilantes, quais íngremes montanhas de gelo, que ninguém pensa
escalar, porque parece impossível realizá-lo.
O impossível está sempre
diante da fraqueza humana.
— Mas, quantos impossíveis o
gênio do homem tem vencido?
O que é a vida, senão uma
luta, sem tréguas, com o impossível?
A vida é impossível sem o
fogo; a criatura humana descobre o meio de produzir o fogo.
Era impossível transpor os
mares; o homem venceu os mares.
Quantos impossíveis se
erguem ante o homem, são todos outras tantas batalhas a vencer.
O progresso representa uma
série de vitórias incruentas; a civilização, os despojos opimos.
A ciência, as artes, a
indústria são conquistas, representam assinalados triunfos do espírito humano.
Mas aquele que primeiro
tenta vencer um impossível, desvendar um mistério; esse é tido por visionário,
utopista, senão apontado como insensato.
Parece-me, pois, que com a
publicação deste trabalho, em que, respondendo àquelas interrogações, abordo o
mais temeroso problema humano, estou a conquistar, na opinião dos meus
contemporâneos, um posto naquelas fileiras, fazendo jus aos qualificativos com
que se costuma brindar aqueles que nelas militam.
Oxalá... porque sic itur ad astra.
Seja como for, aconteça o que acontecer, importa galgar os
degraus da escada que nos transporta às alturas.
As soluções, até hoje dadas,
são antes respostas evasivas, começando pela dos teólogos, que respondem com a
Bíblia: Deus fez o homem à sua imagem e semelhança; mas fê-lo de barro, e,
bafejando-o, deu-lhe alma e vida; depois o adormeceu, e arrancando-lhe uma
costela, fez a mulher.
Como essa afirmação é
pueril, inverídica, falha de senso e contrária às leis naturais para aquele que
observa, analisa, aprecia a natureza, estuda-a em todas as suas manifestações,
e tem sempre assestado, entre o seu Eu e o mundo externo, esse instrumento
maravilhoso que eu denominei criptoscópio, ante o qual passam todas as coisas,
todos os fatos, todos os fenômenos.
A criação do homem e da
mulher, segundo o gênesis, é profundamente ridícula. Observe-se o absurdo: O
Grande Foco (Força Criadora) fazendo operar, como qualquer cirurgião, a tal
ablação de uma costela de Adão, operação por demais hospitalar e pueril para
ser aceita.
O erro, a tolice, começa
pela primeira frase bíblica que diz que Deus fez o homem à sua imagem e
semelhança.
Ora, toda imagem é limitada,
por ser a representação, a cópia, a reprodução de uma coisa, de um objeto, de
uma figura, enfim.
Essas duas expressões, portanto — imagem e semelhança — não
podem ser tomadas a sério, com relação a Deus (Grande Foco).
Ele é infinito. O que é
infinito não é limitado. O que não é limitado não tem figura, não tem forma e
não pode formar imagem.
Semelhante ao infinito, só o
infinito!
Deus — o Grande Foco, como o
queiram chamar, não tem forma, mas os espiritualistas o veem e sentem em toda
parte, nas mínimas coisas que se apresentam à sua visão e percepção.
O homem, espírito e corpo, é
o microcosmo e representa o Universo em miniatura, porque é constituído dos
mesmos elementos.
Deus é, na essência, puro
espírito a animar o Universo. O espírito humano, partícula sua, anima o seu
corpo.
Deus é eterno. O espírito
humano é imortal
Deus é onisciente. A
criatura humana é inteligente.
Deus é onipotente. O
espírito humano possui vontade.
Deus é absolutamente livre.
O espírito humano tem livre arbítrio.
Deus é Criador onisciente,
onipotente, eterno, infinito. O espírito humano é criador inteligente, volitivo
e também infinito. (*) Atribuir, porém, a Deus a figura material do homem, não
é só um absurdo, é profundamente ridículo.
As doutrinas e teorias
metafísica, (inclusive a bíblica) dos teólogos e filósofos, acerca da origem e
natureza da alma, são de tal sorte anagógicas e infundadas, que não merecem
discussão.
E assim também as teorias
materialistas, que nem admitem a existência da alma, confundindo fenômenos
anímicos com funções cerebrais.
Fiz essas considerações, que
julguei indispensáveis ou ao menos convenientes, como um ligeiro retrospecto,
para servir de elo entre o passado e o futuro; também para exteriorizar, como
um refletor, as emoções de meu espírito previdente, assistindo, como observador
antecipado, às peripécias que o embate destas teorias e doutrinas hão de
provocar, em todos os arraiais, desde os materialistas até os espiritualistas.
(*) A expressão “Deus”,
usada pelo Dr. Pinheiro Guedes, não deve ser tomada ao pé da letra como
significando um ser individualizado. Deus, se assim o quiserem denominar, nada
mais é do que a Inteligência Universal ou Grande Foco.
Força psíquica
Alma humana
Desvenda-se o mistério da
criação de Ashaverus, o eterno viajante.
Tudo se cria; nada se
aniquila.
A alma é imortal: o
espírito, eterno viajante.
A Força psíquica, transmutação da zoogênica em que se
converte à biogênica, para criar o reino animal, depois de ter sido força
vital, quando criou a matéria orgânica, como demonstrei, desdobra-se,
desenvolve-se, multiplica-se; vai adquirindo vigor, à medida que avança na
construção dos instrumentos, com que há de erguer o edifício, o monumento, que
é o corpo humano.
Pela assimilatividade,
uma das alavancas com que trabalha a força zoogênica, o organismo monocelular
aumenta de volume, cresce e multiplica-se como ficou demonstrado; e assim,
pelos processos que expus, se criam os organismos policelulares.
Aí a sensitividade
cria o tato; o primeiro e o mais geral de todos os sentidos, o único que se encontra nos animais inferiores, os
protozoários.
A motricidade
cria a locomoção; a princípio simples deslocamento por ondulação ou propulsão,
por saltos, como nos animálculos infusórios, bactérias e outros; depois a verdadeira locomoção, como nos animais
superiores, passando sucessivamente por todas as gradações, até atingir a
perfeição, como no homem.
A força psíquica é, na essência, a sensitividade
inteligenciada. As duas outras alavancas zoogênicas — assimilatividade e
motricidade são apenas auxiliares prestimosos; esta vai buscar os elementos,
que aquela afeiçoa e congrega.
Assim, pois, a sensitividade, que é a polarização
vitalizada, criado o tato, primeiro e o mais geral de todos os sentidos, base
inicial dos outros todos, vai dotando o organismo com os aparelhos necessários
à sua conservação e aperfeiçoamento: a visão, a audição, a olfação e a
gustação, que são simples modificações do tato; são tatos especiais, criados
pela necessidade orgânica ou vital de receber a impressão das diversas ordens de
movimentos, produzidos pela variedade infinita das vibrações do éter, de que o
organismo se apercebe gradualmente; não sentindo, a princípio, senão as mais
intensas ou as mais grosseiras, de que o tato dá conhecimento.
Não sei, ao certo, qual dessas modificações do tato precede
as outras; pela observação direta não se pode saber; pois que os rudimentos dos
aparelhos da visão e da audição se encontram nas medusas, e até em alguns
infusórios, posto que não reunidos no mesmo indivíduo.
Os aparelhos da olfação e da gustação também estão no mesmo
caso; são menos distintos nos animálculos, sendo, entretanto os vigias na
nutrição.
Mas, refletindo sobre as condições das funções a preencher e
sobre a urgência das necessidades a satisfazer, julgo pelo que o criptoscópio
me faz ver, que a urgência da visão, sendo maior, mais instante, porquanto ela
fornece maior soma de elementos instrutivos, além de que as vibrações luminosas
são mais constantes e mais excitantes do que as sonoras; a visão deve preceder
a audição.
Cumpre ainda notar, em virtude das ponderações — quanto à
urgência das necessidades a satisfazer e quanto às condições da função —, que o
criptoscópio — a nossa razão — nos induz a proclamar que a gustação e a olfação
precedem a visão e a audição; porquanto estas funções se prendem à vida
orgânica, são as sentinelas da nutrição; obedecem à inervação ganglionar, a que
não estão imediatamente sujeitas a audição e a visão.
Criados os aparelhos destinados à conservação do indivíduo e
da espécie; providas a nutrição e a reprodução; a força psíquica, manejando as suas alavancas, preparou os
instrumentos com que se apercebe dos fenômenos, que se operam fora do
organismo, mas atuam sobre ele; e os criou à medida que a necessidade se fazia
sentir pela repetição insistente das mesmas impressões.
É assim que a necessidade cria a função e esta o órgão que a
exercita.
E tanto é assim, tanto é certo que a necessidade cria a
função, e esta o seu órgão, que os protistas exercem as suas funções sem órgão;
eles não têm nervos.
Provido o organismo dos meios de manter-se e reproduzir-se e
também das condições para aperceber-se do que se passa fora, no ambiente, no
mundo externo; criado o nervo ganglionar, o futuro grande simpático, que rege
as funções da vida orgânica, de cujos pares de gânglios superiores se forma
depois o cérebro com o cerebelo e todo o sistema nervoso, que serve à vida
animal; a força psíquica se exalça,
incitada, ainda agora, pelos fenômenos do mundo externo, que a despertam e
ativam, agindo incessantemente sobre o organismo; de cujo fato resulta, provém,
nasce à necessidade para ela de apreciá-los e avalizar sua influência, a fim de
utilizar-se deles ou repeli-los, quando nocivos, ou modificá-los, tornando-os
prestáveis.
É isso o que constitui a função primordial da vida psíquica
— a atenção, que analisada com o
concurso do criptoscópio, não é senão a sensitividade, agindo em esfera mais
ampla, mais complexa, mais elevada — a vida de relação.
A sensitividade deixa de ser o que era — apenas alavanca da
força vital bio-zoogênica, converte-se em sensibilidade,
que é um instrumento mais aperfeiçoado, preparado para receber impressões de
fenômenos de outra ordem, menos grosseiros, e mais complexos, produzidos por
agentes menos materiais, mais numerosos e de diversas naturezas: as criaturas,
as sociedades, as ideias, o pensamento nas suas diversas manifestações e
múltiplas expressões — a mímica, a fala, a escrita, a música, a pintura, a
escultura, etc.; é a atenção que recolhendo e apreciando as impressões do tato,
da vista, do ouvido, do olfato e do paladar, as transforma em sensações, graças
à sensitividade.
É difícil, é mesmo quase impossível acompanhar a evolução da
Força nestas alturas; falta o apoio,
somos tomados de vertigem.
Enquanto a pesquisa versa sobre fenômenos materiais, como
são os fisiológicos, encontra-se apoio, o terreno é firme; desde que, porém, a
investigação recai sobre fenômenos psíquicos, de ordem puramente espiritual,
falta apoio, o terreno não é sólido, a região não é alumiada, apresenta muitas cavernas,
cada qual mais escura, ligadas por numerosos caminhos, comunicando entre si um
verdadeiro labirinto.
Formação da inteligência
A inteligência é para o
espírito o que os sentidos são para o homem.
Inteligência, entendimento, intelecto e enteléquia são os
vocábulos com que se nomeia a faculdade, o poder, a capacidade, que possuímos,
de conhecer, distinguir, separar, diferenciar de nós mesmos tudo aquilo que nos
cerca; tudo quanto vemos, ouvimos, cheiramos, saboreamos e apalpamos; tudo o
que nos impressiona ou afeta de um modo qualquer.
É por essa faculdade que nós
apreciamos e diferenciamos as impressões que nos vêm do mundo externo daquelas
que se originam e surgem ou despertam no nosso foro íntimo, sem nenhuma
provocação estranha; e as designamos: aquelas, com o nome de sensações; estas,
com o de emoções.
As primeiras nos chegam por
intermédio dos órgãos dos sentidos; as segundas são filhas genuínas de nossa
alma, fruto de partenogênese.
Assim, pois, a inteligência
é um aparelho admiravelmente constituído para receber os produtos das
impressões dos órgãos dos sentidos e convertê-los em sensações, ideias,
pensamentos e sentimentos; e assim também as emoções; tudo discernindo.
A sensação é um fenômeno complexo, misto de fenômenos
diversos: físicos — a impressão, o abalo; fisiológicos — a comoção nervosa e
sua transmissão ao cérebro; psíquicos — a apreciação e a discriminação de sua
origem e caráter; o efeito — simpático ou antipático; a reação orgânica de
atração ou repulsão; e finalmente a retenção, conservação ou arquivamento da
emoção. Temos assim o conhecimento pleno, íntimo da emoção e do agente
emocionante, como coisas distintas do paciente — o emocionado.
É isso que os cientistas e
alguns filósofos denominam consciência, o homo
compos sui.
É essa consciência que
estabelece distinção entre o eu e o
não eu; que separa o mundo externo
do interno; é ela que os materialistas confundem com a consciência moral,
balança onde são pesados todos os nossos atos, tribunal espiritual onde são
julgadas todas as nossas ações.
Essa consciência, que eu
denomino consciência orgânica ou animal, conscienciosidade,
o homem a compartilha com os irracionais; é o que neles se chama instinto.
O instinto é um movimento da
alma, espontâneo ou provocado por uma impressão brusca, irritativa, do mundo
externo, que determina uma reação à que o vivente obedece automaticamente; ele
é a síncrise da sensitividade com a motricidade, criada para defesa da vida;
ele é luz, aviso, guia da criatura, principalmente a irracional.
Há dois instintos
principais: o da conservação e o da reprodução, servidos por órgãos especiais;
para o primeiro, os do aparelho digestivo; para o segundo, os do aparelho
sexual; em ambos predominam a inervação da vida vegetativa, o sistema
ganglionar ou nervo grande simpático.
O instinto de conservação
tem por sentinelas a fome e a sede, que se localizam, se fazem sentir como
necessidades urgentes, nos órgãos do aparelho digestivo; ele gera o egoísmo com
o seu cortejo de sentimentos individualistas, o egotismo.
O instinto da reprodução,
cujo objetivo é perpetuar a espécie, é como que uma evolução do outro; ele tem
por escudeiro o amor, mas o amor sensual, que eu denomino afinidade fisiológica, a qual é o germe, a origem da simpatia entre
os irracionais, atraídos pela lei natural da reprodução da espécie — a união de
corpos; e entre os racionais, pelo casamento, e de cuja união pode nascer e
desenvolver o mais belo e sublime dos sentimentos — a amizade verdadeira, que é
aquela que nasce do amor espiritual, com a sua coorte de sentimentos
filantrópicos — o altruísmo.
A ideia, de dar por sede do
amor o coração, é erro, e grave: denota falta de conhecimentos ou de prudência
ao raciocinar, pois não se pode atribuir ao efeito àquilo que somente pertence
à causa.
A sede do amor está na alma
— Força, ou Espírito, é ela a causa ou origem de todos os órgãos que compõem o
corpo, é ela quem os irradia e vivifica através de cordões fluídicos presos ao
cérebro e ao coração, mas é preciso que não se atribua a órgãos receptores e
distribuidores aquilo que só pode residir e pertencer à alma; a amizade ou o
amor. Pelo fato do coração ser o elo que prende a vida orgânica à psíquica —
laço entre a vida material e a espiritual — não pode ser ele o depositário do
amor; ele nada mais é que o centro circulatório, o propulsor da vida orgânica e
o repositório e distribuidor dos elementos vitais.
O sangue propelido pelo
coração se distribui por todo o corpo, fornecendo a todos os órgãos os
elementos de vida e dando-lhes vigor, para o exercício de suas funções
individuais e coletivas, particulares e gerais; e assim o cérebro e toda a
inervação da vida animal se acham sob a dependência do coração; porém, a sede,
o órgão do amor espiritual está na Alma — partícula da Força — que é a suma, a
síncrise de todos os sentimentos, o sentimento que converte o homem e o
transmuta em pureza, aproximando-o da Verdade.
Por esta resenha se vê que a
conscienciosidade, síncrise da sensitividade com a motricidade, é a base, o
fundamento para o cultivo da inteligência: a lapidação do espírito.
Cada aparelho sensitivo
recebe e transmite ao cérebro, que é o órgão da inteligência, a impressão de certa
ordem de fenômenos; estas impressões convertem-se aí em sensações, cuja origem,
caráter e efeitos são discernidos, estabelecendo distinção entre o agente
emocionante, a emoção e o emocionado; e isso constitui o que se chama a
consciência, o homo compos sui.
Há em tudo isso, ou, além
disso, um esforço, atividade, certa energia: é a atenção.
A sensibilidade, a atenção,
a consciência e o senso íntimo auxiliando-se reciprocamente, são centelhas da
INTELIGÊNCIA, em cuja função se nota: a percepção, a compreensão e a
concatenação ou memória, que são processos intelectuais.
A PERCEPÇÃO é como um
instrumento agudo, penetrante; ou como uma sonda de que nos servimos para
explorar; é como o tentáculo dos insetos; e o órgão do tato do nosso espírito.
Excitado pela atenção, ele
apalpa a consciência animal, orgânica — o sensório; esse é o modo de agir da Força Psíquica sobre as suas sensações
e emoções.
A PERCEPÇÃO é para o
espírito o que os sentidos corporais são para o homem; ela é a sua
recapitulação.
A MEMÓRIA é o registro e o
arquivo das sensações e emoções, convertidas em ideias, pensamentos e
sentimentos.
Ela exerce, no mundo
psíquico, a mesma função que a coesão e a afinidade, no corpóreo.
O agrupamento, a
concatenação, o registro e arquivamento de tudo quanto impressiona a alma ou
afeta o nosso espírito, se opera, se efetua, faz-se e realiza-se: por
continuidade e contiguidade, por simpatia ou antipatia, por analogia ou
antagonismo, por similitude e antítese não só das ideias e sentimentos, mas
também das imagens.
A COMPREENSÃO é um
instrumento mais complexo do que a percepção,
e constituído diversamente: só funcionam em operações cujos elementos são ideias.
Na sua estrutura, além da
atenção e conscienciosidade, elementos que concorrem para a percepção, entra a memória, que é o
repositório dos elementos necessários à operação preliminar — a comparação, que
constitui a base da compreensão; é o processo mediante o qual ela se efetua.
A COMPREENSÃO é como um
instrumento detentor, uma concha polida, um espelho côncavo, para cujo centro converge
as imagens refletidas da periferia.
Ela colhe, abrange, analisa
e compara às sensações e emoções, os pensamentos e sentimentos.
São esses os instrumentos e
aparelhos da INTELIGÊNCIA, mediante os quais adquirimos conhecimentos, nos
instruímos e aperfeiçoamos.
O raciocínio, a abstração, a
generalização, a comparação e o juízo, que alguns filósofos consideram e
apresentam como elementos do intelecto, são funções, são operações, do
entendimento, cuja matéria-prima é a ideia, o pensamento.
Eis aí como age a
inteligência e como atua em todas as espécies animais, desde os infusórios até
os antropoides, cada qual com o seu contingente; eles (os animais) são as
oficinas, os laboratórios onde se forjam e afeiçoam os instrumentos e
aparelhos, cujo aperfeiçoamento se há de completar no laboratório, que é a
recapitulação de todos os outros — o homem.
A INTELIGÊNCIA no homem é
uma oficina completa, perfeita; ela possui todos os instrumentos necessários à
inspeção do Universo, à análise e à síntese de todos os fatos da natureza e à
descoberta das leis que os regem.
A INTELIGÊNCIA humana dispõe
de recursos como a de nenhum outro animal no mundo; ela maneja instrumentos que
todos os animais só reunidos apresentam; e ainda outros mais perfeitos,
constituídos pela junção de alguns daqueles, formando aparelhos mais sensíveis
e de maior alcance: a concepção, a
imaginação e a razão.
A CONCEPÇÃO cria ideias; é
um aparelho constituído pela memória, atenção, compreensão e percepção.
A IMAGINAÇÃO cria imagens,
figuras, formas; é constituída pelos mesmos instrumentos que a CONCEPÇÃO; mas
concatenados segundo a função que têm de preencher, e mais a INVENTIVA, que é
constituída pela apreciação, comparação e apropriação, de formas por analogia
(adequabilidade); faculdades, cuja origem o criptoscópio descobre na
POLARIZAÇÃO.
A concepção compara, combina
sensações, cuja essência é a modalidade; a imaginação compara e combina
impressões, cujo caráter é a forma.
A razão é o mais complicado,
o mais perfeito, o de maior alcance e de mais utilidade dos aparelhos da
inteligência; é a reunião, a síncrise de todos os outros; e por isso funciona
como superintendente; todas as operações, todos os trabalhos, feitos na oficina
intelectual, lhe são submetidos; e, mais do que tudo isso, ela é a luz da
oficina.
A INTELIGÊNCIA é para homem
o que é para o Estado o Poder Legislativo.
À vontade
A vontade é o dínamo e a
bobina psíquica.
A vontade é a energia, a potência, a atividade da força
inteligenciada, em ação, agindo, operando; a capacidade de reagir e opor-se;
não só ao mundo externo, repelindo, anulando sua influência, seus efeitos, pela
produção de outros em contraposição àqueles; mas também, e principalmente, às
solicitações íntimas, quer às que nascem dos instintos e apetites quer às que
provêm das necessidades corporais.
A vontade é a potência
biomagnética inteligenciada; ela é na essência a polarização, pois que é no
fundo um impulso, em última análise, um movimento.
Ela já se manifesta nos
animais os mais inferiores; porquanto certos fenômenos da nutrição — a procura
e a apreensão dos alimentos — se não efetuariam sem a sua intervenção.
A vontade evolui na série
animal; a princípio é um simples movimento reflexo, semelhante à distensão de
uma mola; depois, um impulso instintivo, verdadeira descarga elétrica; afinal,
um ato refletido, consciente, livre; ao qual precede: a apreciação das circunstâncias, análise das condições, deliberação e
decisão.
Confunde-se ordinariamente à
vontade com o desejo e o apetite; e
essa confusão, que se nota com frequência no trato vulgar, observa-se também,
não só na conversação de pessoas instruídas, mas igualmente o que é menos
tolerável, até em produções de literatos e homens de ciência; assim se diz e
escreve-se tenho vontade de dormir, de
chorar, de comer, etc., quisera vê-la, quero falar-te; tenho vontade de sonhar
com ela; tenho vontade, mas não posso satisfazer tal necessidade corporal.
O emprego do vocábulo — vontade — é errôneo em todas essas
frases; e nem só incorreto, mas antagônico.
A vontade se manifesta, ao
contrário, no ato de oposição ou resistência à satisfação de um desejo; na
insubmissão às solicitações tanto orgânicas como psíquicas.
Isso sim é ter vontade.
Ter vontade é ser forte,
saber resistir a todas as tentações; quer mundanas — materiais e sociais, quer
anímicas.
A vontade é o alicerce do
caráter; é a pedra angular em que ele se firma.
Pela vontade a alma torna
fecundos os atos da inteligência.
Aqui, a oficina intelectual
trabalha com todos os seus instrumentos, alumiada, esclarecida pela razão;
depois o tribunal supremo, a consciência moral delibera, julga em última
instância, e lavra a sentença — absolutória
ou condenatória; o livre arbítrio decide pró ou contra; a vontade executa.
O poder executivo é, na
organização social, o símile da vontade no ser humano.
Constituição da consciência
A consciência é para a
criatura como o tribunal para a Sociedade.
—
Como explicar a constituição da consciência?
Quanto mais penetramos nos domínios psíquicos, tanto mais
difícil se torna a marcha; achamo-nos na situação do viajante, que atravessa
uma região nunca antes percorrida, para a qual não há vaqueanos, ele tem de
caminhar sem um guia, confiando apenas na sua orientação, entregue à sua
perspicácia.
Encontra-se, após algumas
jornadas ante uma floresta virgem, cujas árvores são numerosíssimas; e, posto
que de diversas espécies se assemelham um tanto, pelo que não podem ser
facilmente distinguidas; suas copas frondosas ensombram o chão e limitam,
encurtam o campo da visão, tornando difícil senão impossível à marcha.
Tal é a minha situação ante
o problema da constituição da consciência.
Para achar e explicar a
constituição da consciência, faz-se preciso a maior concentração da alma sobre
si mesma, na mais profunda introspecção criptoscópica em que a atenção, fazendo
agir a percepção nessa câmara — o sancta
santorum espiritual — rebusca os fatos, agitando a luz da razão em todos os
refolhos psíquicos.
Ocorre-me a fórmula do
Universo — a variedade na unidade; incontestavelmente base sólida da lei do
transformismo, que explica e justifica a doutrina da evolução.
Ora, eu venho demonstrando
(e tenho como certo havê-lo feito rigorosamente) a evolução da força, desde o calórico que cria a polarização, a qual
produz a coesão e a afinidade; as quais congregadas e
transfundidas constituem a força-vital
ou biogênica, que se desdobra em assimilatividade, motricidade e sensitividade,
cuja sincretização, se denomina força
fitogênica, quando cria o reino vegetal, e zoogênica, na criação do reino animal.
A força-vital — bio-fito-zoogênica — se converte por
síncrese em Força psíquica — alma
humana — pelo predomínio da sensitividade,
que em sua evolução produz o tato, a
gustação, o olfato, a audição e a visão — os sentidos; neles se manifesta
a ação da inteligência.
A vontade tem a sua origem
na síncrise da sensitividade com a motricidade predominando esta, como fonte de
energia.
Da união da inteligência com
a vontade nasce a consciência animal, que se converte em consciência
espiritual.
A consciência espiritual ou
moral é, pois, um aparelho, mas aparelho anímico, dinâmico, não material,
psíquico, constituído pela memória, atenção, percepção e compreensão; iluminado
pela razão; nele se refletem todos os atos da força psíquica.
Para que possa condenar, como condena, não só os atos, mas
os sentimentos e os pensamentos, que não traduzem o amor ao próximo, é preciso
que a consciência seja influenciada por princípios (seres?) de ordem superior.
Ela é, assim, um aparelho
sensitivo espiritual, pelo qual a força se comunica.
A consciência é na criatura
o que o poder judiciário é no Estado.
O livre arbítrio
O livre arbítrio é o
fundamento da moral.
O livre arbítrio é a vontade, esclarecida pela razão, perante a
consciência.
Alguns filósofos — os
deterministas, os fatalistas, os materialistas — negam o livre arbítrio; os
primeiros fazem da criatura humana um autômato, um animalejo sob a ação das forças
externas; os segundos, a reduzem às condições dos corpos brutos, inorgânicos,
sobre os quais operam sem contraste, as forças da natureza; os últimos,
considerando a alma uma simples função cerebral, nem ao menos lhe reconhecem
individualidade.
Esquecem-se: aqueles de que
a alma humana é um ser inteligente, dotado de atividade; os materialistas
fingem ignorar aquilo que se passam em si mesmos. Todos eles não se lembram de
que, negando o livre arbítrio eliminam a responsabilidade moral; reduzem a
criatura humana às condições do bruto.
O livre arbítrio é a origem
do mérito; ele é, portanto, fundamento da moral.
Termina aí o ciclo evolutivo
da força psíquica.
Pela sensibilidade ela recebe as impressões do mundo externo; pela inteligência, as compreende; pela vontade, age e reage, opera, produz,
cria; pela razão, perscruta o
Infinito; pela consciência se
esclarece; pelo livre arbítrio,
determina o seu destino.
EIS A ALMA HUMANA
A sua
origem está no Infinito; a sua natureza é dinâmica; sua evolução, neste mundo,
se faz através do reino animal — do amibo ao homem —, para continuar —
infalivelmente — em outros mundos.
Há de continuar
necessariamente sua evolução; porque, como Força que é não se destrói, não se
aniquila; existe, subsiste e persiste; vem do Infinito em marcha para o Eterno.
Tudo se cria; nada se perde.
Portanto, como tudo no
Universo, ela vem de Deus (Grande Foco) e verdadeiro Ashaverus caminha,
incessantemente, para o Grande Foco — o Infinito Eterno, onde não há princípio
nem fim.
A evolução da alma
A evolução é uma lei, a que
tudo está sujeito no Universo.
A evolução da alma humana numa encarnação termina com a
volta da Força ao Grande Foco, da qual é uma partícula em ação neste e noutros
planetas, porque a Força parcelada parte de um ponto e volta a esse mesmo ponto
— o Grande Foco.
Uma vez adquiridos os
recursos, conquistados os meios, alcançados os postos, que a necessidade ia criando sucessivamente,
sob a imposição dos fenômenos impressionantes do mundo externo, na sua
variedade quase infinita, no Universo, considerado estática e dinamicamente — a
força psíquica humanizada — a alma
humana aperfeiçoa-se e progride, perlustrando a escala dos seres humanos,
que se diferenciam, formando classes distintas, pelo caráter, pelo saber e pela
moral.
Necessidades de outra ordem,
mais complexas, oriundas do agrupamento dos indivíduos em famílias, em
sociedades, em povos, modificam a alma, compelindo-a a amoldar-se às
contingências do meio (lei de adaptação aplicada à alma); e desse modo, as
arestas, as agruras, as asperezas, as sombras deixadas pela hereditariedade
(outra lei proclamada pelo sábio Darwin) são cortadas, aplainadas, brunidas,
esbatidas; e assim a alma se despe se limpa das impurezas, que trazia da longa
jornada, percorrida do berço à virilidade — da criação à individualização —; e
neste último estágio, que é o aperfeiçoamento, percorre os agrupamentos — a
família, a sociedade, a nação.
Assim, pois, as diversas
condições em que se realiza em que se efetua a vida corpórea, as circunstâncias
que a rodeiam, as peripécias que se dão outros tantos meios, são outros tantos
incentivos à evolução, ao aperfeiçoamento, ao progresso do Espírito ou da alma antes de se tornar Espírito Racional.
Portanto, as dificuldades e
misérias da vida, as lutas contra as intempéries, as necessidades de toda
espécie — materiais, intelectuais e morais — são os aguilhões, os instigadores,
os promotores do progresso humano.
A lei do trabalho
O trabalho é a alavanca do
progresso.
A lei do trabalho, imposta à
criatura pela necessidade de obviar às intempéries, vencer as dificuldades,
suprir as necessidades, minorar o sofrimento e sobrepujar nas lutas, dominando
os elementos adversos e tirando partido das circunstâncias; o trabalho é o
corretivo de todos os males, que assediam a humanidade; o trabalho é o bálsamo
que cura todas as chagas; é o lenitivo de todas as dores.
O trabalho, portanto, não é
não pode ser um castigo, uma punição como alguém o disse e, impensadamente, vai
se repetindo, imposto à criatura por Deus — pura mitologia!
—
Ninguém, até hoje, ainda viu a blasfêmia que tal ideia encerra?
— Ninguém
protestou ainda contra o pensamento nefando de atribuir ao Grande Foco, de
envolta com a ignorância, tamanha perversidade?
—
Considerá-lo castigo é tirar-lhe o mérito, negando-lhe a
espontaneidade.
Se o
trabalho é castigo, a submissão é filha da obediência e prova humildade; mas a
punição provoca a revolta, filha da insubmissão, que nasce do orgulho.
Grande Foco provocaria a
revolta!
—
Mas o trabalho é imposto aos irracionais: qual o crime dessas
criaturas?
— Não;
o trabalho não é punição; nem todo sofrimento é castigo, como o demonstra o dos
irracionais.
Se o
trabalho fosse punição, o prêmio seria o sofrimento!
O
trabalho é uma necessidade vital; os trabalhos são a justa reparação das
faltas, dos erros e dos crimes.
Todo
sofrimento é um aguilhão do progresso; e o trabalho o meio, o modo de
realizá-lo.
A
Inteligência Universal ou Grande Foco criou as suas leis imutáveis e, portanto,
dentro delas tudo é regido.
É pelo
trabalho que todas as criaturas efetuam sua evolução, e o homem, só arrimado a
esse bordão caminha, pela estrada do progresso, para a perfectibilidade.
Se,
pois, como procurei demonstrar, as diferenças intelectuais e morais, de
indivíduo a indivíduo, representam graus de progresso; e essa graduação existe
nos agrupamentos, que constituem a família, a tribo, a sociedade policiada, o
povo, os habitantes, enfim, de uma região, de um território; é indubitável, é
certo que a alma humana, submissa à lei de perfectibilidade, perlustra todos os
estágios do progresso.
Portanto,
terminado o período de sua criação, que se efetua como ficou provado, através
da série animal, cuja razão de ser é essa, nem pode ser outra; inicia-se o da
sua individualização na primeira existência corpórea, humana, seguindo-se o do
aperfeiçoamento.
E, pois,
certamente, todas as condições, todos os estados em que se apresenta a criatura
humana neste mundo, desde o selvagem e bárbaro até o de maior civilização,
cultura e policiamento, são outros tantos estágios por ela percorridos; são
outras tantas estações na longa estrada da perfectibilidade.
A lei da reencarnação
Nascer, viver, morrer;
tornar a nascer e renascer ainda; progredir sempre.
Destas considerações resulta
clara e evidentemente que a reencarnação
é uma necessidade indefectível, é uma lei psíquica à que o espírito humano está
sujeito.
É nela e só por ela, que a
alma humana pode perlustrando a vida da perfectibilidade, realizar o seu
progresso, aperfeiçoar-se, depurar-se e elevar-se na escala dos seres à
categoria superior de espírito puro.
O espírito puro não tem mais
necessidade, não carece de tomar um corpo carnal para evoluir e trabalhar neste
mundo; porque completou o seu tirocínio, tendo atingido o grau de adiantamento
intelectual e moral que ele pode proporcionar.
A reencarnação, além de ser uma necessidade, pois que sem ela o
espírito não pode aperfeiçoar-se; é também o meio de que ele pode socorrer-se
para reparar as suas falhas, provando assim um arrependimento sincero.
Uma vida, uma existência
corpórea, por mais longa que seja, é insuficiente, incontestavelmente, para a
criatura, por mais inteligente que seja adquirir a totalidade dos conhecimentos,
que são o cabedal, os tesouros da humanidade.
Demais, a inteligência
desenvolve-se, evolui, como tudo no Universo; não surge completa, perfeita,
como Minerva da “cabeça de Júpiter”.
Se um aluno perde o ano, por
desídia, por não haver estudado ou porque sua inteligência não é bastante
lúcida; ele não fica inibido, seu pai não o priva de repetir o curso, antes o
anima, compele-o mesmo a fazê-lo.
Por que, pois, há de o
Grande Foco impedir suas partículas, as criaturas, de repetirem o curso desta
escola, privando-se assim do único recurso, de que podem dispor, para aprender
as lições racionais e Científicas já explanadas por Jesus, e que também
ensinou-nos a amar ao próximo como a nós mesmos?
— Onde está esse, que
tenha dado provas positivas de saber a lição, imitando Jesus, em uma única
existência?
— Como, pois, atribuir à
Bondade Infinita a crueldade sem nome de tolher a criatura, tirando-lhe a
possibilidade única de ser discípulo aproveitado, como todos devem e hão de
ser, da Verdade?
— Não; tal coisa não é
possível. O Grande Foco não comete iniquidades.
Se a criatura fosse feitura
direta do Grande Foco, seria pura e perfeita; não estaria cheia de iniquidades;
se está cheia de iniquidades, está impura, é imperfeita; mas, como Essência,
como Força, é uma partícula do Grande Foco.
Para que a criatura venha,
como alma, a confundir-se com o Grande Foco e seja luz puríssima semelhante a
Ele, tem de aperfeiçoar-se, dia a dia, deve purificar-se.
Mas o Grande Foco é
infinito; a perfeição é infinita; logo a criatura é perfectível; mas não pode
atingir o alvo, não pode aproximar-se do modelo, sem perlustrar o caminho da
perfeição, que é não pode deixar de ser infinito.
Portanto, são necessárias
jornadas sucessivas e infinitas para percorrê-lo.
Essas jornadas da alma são
as existências sucessivas — as reencarnações do espírito.
A reencarnação é, pois, uma lei; a lei do progresso espiritual, que
não pode ser frustrada; à qual todos os espíritos devem submeter-se, absoluta e
necessariamente; todos, sem exceção de um só, e ab initio in oeternum.
O que é o mundo
FISIOLOGIA
TRANSCENDENTAL
A
Oficina
A
Escola
O Hospital
A
Penitenciária
O
Teatro
Essas epígrafes dizem
sinteticamente o que é o mundo; são as teses, que me cumpre desenvolver, para
completar o monumento da origem,
natureza e evolução da alma
humana.
A demonstração dessas teses
vem coroar a obra; como uma bela cúpula sobre um edifício majestoso, o
completa, aformoseia e realça.
A OFICINA
O mundo é para a alma humana
— Espírito apenas individualizado, ainda no início de sua evolução — uma oficina de trabalho e uma escola de educação.
À alma, verdadeiro aprendiz,
que apenas acaba de fazer entrada na oficina, o mundo apresenta, oferece e
fornece matéria-prima, para ser manipulada, e mestres para guiarem-na.
Os mestres são os espíritos
cujo tirocínio está concluído, auxiliado por outros cujos conhecimentos, cujo
desenvolvimento, conquanto não seja completo, é, não obstante, suficiente para
lhes permitir a direção em certos trabalhos.
São considerados,
ordinariamente, e erroneamente chamados “anjos da guarda”, “protetores”,
“guias”, — os mestres; os espíritos auxiliares são os que têm afinidade
espiritual com o encarnado.
Essa é a norma nas nossas
oficinas e escolas onde os mestres e chefes entregam à direção de um aprendiz,
mais adiantado, um ou mais condiscípulos.
E sente-se, e se reconhece
que assim é de fato, realmente; nem podia ser de outro modo; não se aprende sem
mestres.
A matéria-prima, que o mundo
apresenta e fornece ao espírito, não é toda da mesma natureza, e tem origens
diversas: é o fluido etéreo, simplesmente polarizado; a molécula vegetal, e a
substância animal; são os fenômenos cósmicos e os pensamentos e fatos sociais;
sentimentos das criaturas.
É evidente o trabalho do
espírito, quando encarnado, mas o do
desencarnado, conquanto seja menos
apreciável, não é menos real, é mesmo mais intenso e de mais difícil execução;
pois que exerce sobre a matéria prima de todas as origens.
Os espíritos são partículas
da Inteligência Universal.
O PERISPÍRITO — TEORIA E
FUNÇÕES
O espírito encarnado labora a matéria do seu corpo, e maneja
todas as substâncias do mundo: mecânica, física e quimicamente.
As funções orgânicas não se
efetuam, sem consumo dos elementos componentes dos órgãos; os elementos gastos
são substituídos, simultaneamente, por outros imediatamente elaborados no seio
do organismo.
Nessa elaboração notam-se
duas fases distintas, posto que simultâneas; uma de separação e eliminação do
material gasto; outra de agregação, assimilação e consubstanciação da
substância orgânica, convertida em célula de cada um, e de todos os tecidos que
formam a estrutura dos órgãos.
Na incorporação de novos
elementos em substituição dos consumidos, o trabalho do espírito é nimiamente
complexo e delicado; cumpre-lhe atender à escolha da matéria, ao
aperfeiçoamento e distribuição dos elementos, segundo as funções; ele se
transfunde no elemento que incorpora; ele o absorve e individualiza,
imprimindo-lhe um cunho peculiar, dando uma feição exclusivamente sua; ele o
vivifica.
Na fase de eliminação do
material gasto, o trabalho reduz-se à segregação dos resíduos — fluidos líquidos
e sólidos; os quais levam consigo as disposições, a vitalidade que adquiriram
no organismo de onde se desprenderam.
Assim, pois, ao repositório
geral voltam as moléculas e átomos, levando consigo as modificações que
receberam.
De simples matéria inorgânica,
passaram a substâncias orgânicas; de simples substâncias orgânicas tornaram-se
elementos vegetais e elementos animais.
Em cada um desses estados, o fluido etéreo, que acompanha o
átomo, a molécula, a célula (porque são os elementos primordial, essencial, que
penetra e envolve tudo) recebeu modificações, que lhe imprimem uma modalidade
peculiar a cada corpo.
Todos os corpos desprendem
emanações, que, se escapam à nossa vista, são observadas pelos médiuns¸ pelos sonâmbulos e outros
sensitivos; os quais as descrevem como formando uma atmosfera, um halo, em
torno de todos eles, inclusive os minerais.
É a aura dos Esoteristas, ou o períspirito,
dos espíritas.
Do que fica exposto se
infere, logicamente, que o espírito elabora o seu períspirito, desde o início
de sua formação e individualização; ele é a sua pele e o seu arcabouço; é como
a corrente elétrica de que ele é o dínamo; o azeite de que ele é a mecha; são
inseparáveis ab oeterno in oeternum.
O períspirito tem por base o fluido etéreo; parte integrante do
átomo.
Há, portanto, no repositório
comum muitas ordens de aura ou atmas
ou perispíritos, desde os que
envolvem os corpos brutos, até as que provêm da criatura humana.
E o trabalho do espírito
encarnado não se limita ao que acabo de indicar, mas abrange todo o ciclo da
atividade humana, na labuta da vida, para satisfazer as suas necessidades, no
afã do serva et ipsum; e vão além,
suas ideias, os pensamentos que formula as imagens que cria; os sentimentos,
que o agitam e impulsionam, vivem e se movem com o seu períspirito; são agentes
que o encarnado maneja.
É prova disso a, hoje bem
conhecida, transmissão de pensamento.
E como o pensamento, também
o sentimento se transmite.
A sugestão e a obsessão têm
aí a sua base.
O espírito desencarnado
utiliza-se desse fluido para realizar os seus trabalhos; servindo-se do
animalizado, para se materializar, tornar-se visível e palpável; e, se tem de
apresentar a forma de um animal, ou vegetal, ou o movimento, a deslocação de
corpos, recorre ao fluido correspondente à natureza do fenômeno que quer
produzir, buscando o da espécie animal, e mais particularmente o idêntico ao
tipo; mamífero, ave, inseto, réptil, etc.
Como se vê, o laboratório é
vasto, e os operários que produzem a matéria-prima — o fluido polarizado — nos
corpos minerais, devem trabalhar, e trabalham efetivamente, sem cessar, a fim
de fornecer os elementos de que se servem os espíritos desencarnados, para
produzir a variedade infinita dos fenômenos do Universo.
E assim o mundo é uma
oficina de trabalho, tanto para o espírito encarnado, como para o desencarnado.
A ESCOLA
Como escola prática de educação, o mundo oferece à alma dois
grupos distintos de aulas: um destinado à instrução propriamente dita, cultura
intelectual; outro, destinado à educação, cultura moral.
Na oficina o espírito
vitaliza e animaliza a matéria, tornando-a apta para formar o corpo astral,
corpo anímico ou períspirito.
É esse o trabalho que, com o
auxílio do criptoscópio, lobrigamos na oficina.
A escola, no seu grupo de
aulas para cultura intelectual, é tão completa, tão pródiga mesmo, que nenhum
aluno conseguiu ainda, nem jamais conseguirá, completar o curso, senão após
numerosas matrículas, para frequência com assiduidade e aproveitamento.
No grupo das de cultura
moral e formação do caráter ou educação propriamente dita, as aulas são ainda
mais numerosas, constituindo diversos cursos, cada qual mais difícil; desde
aquele em que se deve modificar uma simples disposição viciosa, até aquele em
que devem ser corrigidos defeitos e vícios inveterados: a vaidade, a desídia, a
luxúria, a inveja, a maledicência, a mendacidade, o latrocínio, o ciúme, a ira,
o ódio, o orgulho e tantos outros vícios, que tornam o homem infeliz e fazem o
atraso da humanidade.
Na oficina o espírito pule a
matéria; na escola a alma é polida pelo atrito das paixões com os interesses:
lá o esmeril é a necessidade; aqui é a dor.
Quer num, quer noutro caso,
a reencarnação ou volta da alma à vida corpórea, é a matrícula na escola; ela,
não só é indispensável, como ainda é o único meio, é o único recurso, que há
para frequentar as aulas; e, sem essa frequência a alma não pode mostrar-se
habilitada, e, sem estar habilitada, não terá acesso, permanecerá na escola,
como ouvinte, sem direito ao exame, à prova; direito que só a matrícula — a
encarnação — pode dar.
A matrícula — a reencarnação
— se repetirá tantas vezes quantas forem necessárias para completa e perfeita
habilitação da alma, demonstrada por provas irrefragáveis.
Então, mas só então, o
espírito passará a ser puro capaz de evolar a outro mundo.
Muitas são as moradas
(mundo) que rolam no espaço, disse Jesus, e também nos provou ser o nosso
Mestre; mas de suas palavras também se infere que este mundo, sendo uma das
moradas, é igualmente a escola de que ele é o Mestre.
Ora, a Astronomia nos ensina
que os astros, que giram em torno do sol, são outros tantos mundos; e, portanto,
na frase de Jesus, outras tantas escolas, para onde e por onde o espírito terá
de passar, impreterivelmente, na sua marcha evolutiva para a perfectibilidade —
o Grande Foco, sua fonte de origem.
Sendo os planetas moradas
dos espíritos, dessas moradas é composto o Universo; e o Universo é infinito.
Logo, a marcha evolutiva do
espírito para a perfectibilidade é intérmina; a perfeição está no infinito que
é o Grande Foco.
O HOSPITAL
Fácil é a demonstração de que o mundo é um hospital para as
criaturas.
A alma humana é o produto da
evolução da Força através do reino animal.
Ficou provado que o fluido
etéreo é inseparável do átomo; ele se revela, como aura, em todos os corpos e
seres, apresentando as modificações que cada grupo lhe imprime.
Ora, a alma humana se forma,
atravessando a fieira animal, do micróbio ao antropoide.
Cada indivíduo imprime certa
modificação à sua aura, ao seu períspirito, segundo as necessidades de sua
existência.
Cada indivíduo concorre para
constituir o caráter do grupo, que se compõe de diversos graus, desde a
variedade até a espécie.
O períspirito retém, guarda,
conserva a modalidade adquirida durante a vida corpórea do ser.
E, pois, a Força psíquica,
quando chega a ser espírito humano — alma — tem, necessariamente, gravado no períspirito
todas as qualidades distintas, características das espécies animais; qualidades
que são as condições absolutamente indispensáveis à manutenção da vida para
cada um deles; para este a audácia, para aquele a timidez; ora a ostentação,
logo o disfarce; e assim: a astúcia, a ganância, a velhacaria, a versatilidade,
a hipocrisia, a imprudência, a vaidade, o orgulho, a teimosia, a ferocidade e
muitíssimas outras, que o estudo da vida dos animais, tem patenteado: as quais
são virtudes nos animais e vícios no homem.
Além dessas disposições
viciosas, oriundas do processo de sua formação, outras são criadas, hauridas no
meio em que se desenvolve o espírito, provenientes de suas relações e muitas
outras circunstâncias; tais são: a ambição, a mendacidade, o latrocínio, a
venalidade, a maledicência, a luxúria, o fanatismo, o cepticismo, etc., os
atentados aos bens, à honra e à vida dos seus semelhantes.
Tudo isso constitui estados
mórbidos da alma, mais ou menos inveterados, que importa curar; e para os quais
o remédio está nas variadíssimas condições de vida; desde o estado selvagem,
com sua dureza, até o da maior civilização, com suas hierarquias e numerosíssimas
profissões, desde as mais humildes até as mais elevadas; com sua multiplicidade
de funções, desde as mais baixas e repulsivas até as mais honrosas e
agradáveis; de um extremo a outro, para cada chaga se encontra um bálsamo; para
cada cancro, um antídoto; para cada úlcera, um cautério. É como disse
Hipócrates: Ea quae ferrum non sanat,
ignis sanat.
A cura é sempre
possível; ela há de realizar-se impreterivelmente; depende de tempo e
severidade na aplicação do remédio.
E, assim, vê-se que o mundo
é sim, de fato, um Hospital.
A PENITENCIÁRIA
O mundo Terra
é também, indubitavelmente, ai de nós, uma penitenciária.
Para prova, basta apontar
para as desgraças e misérias da vida, que pesam sobre a população de uma
cidade, como o Rio de Janeiro.
Os acidentes, os desastres,
os atentados, os crimes; uns bárbaros, outros hediondos, são outras tantas
penas de Talião — quem com ferro fere,
com ferro será ferido.
A cegueira, a surdo-mudez e
todos os aleijões de nascença, os vícios de conformação, as monstruosidades,
são decerto, incontestavelmente, penas, castigos, expiações, porém, na maioria
dos casos tudo isso é fruto da ignorância humana, do livre arbítrio, pois se
todo o vivente humano conhecesse a sua composição astral e física, daria
combate às enfermidades, seria comedido em todo o seu viver, e sendo-o
evitaria, portanto, o avassalamento do lar.
A ciência materialista se
expande sobre o como de tais
fenômenos; sobre o porquê, é muda;
porque ela o ignora.
Como auxiliar a justiça
indefectível com tais fatos?
É ou não um sofrimento
tremendo para os pais, ver nascer e viver cego ou surdo-mudo, sem pés, sem mãos
e até sem pernas e sem braços, seus filhos?
É ou não uma tristeza ficar
idiota, cretino, epiléptico?
Ninguém dirá
"Não". Todos pensam e sentem que o é.
Portanto, a criatura delinquente
nesta ou noutra encarnação, tem que responder pelo mal feito: a falta pede,
exige corretivo; o delito, a pena.
Assim, compreende-se o fato,
reconhece-se a Justiça Suprema, o Grande Foco surge em nossa consciência, clarividência
o espírito, mostra-nos a razão.
O TEATRO
Mais verdadeira do que
pensam muitos, dos que a empregam, é a frase: o mundo é um teatro.
Sim; o mundo é um cenário
onde se desenrolam os dramas da vida, as comédias, as tragédias e também as
farsas; é mesmo, muita vez, um teatro de bonecos.
Cada indivíduo é, de fato,
um ator no cenário do mundo; e frequentemente um comediante, um farsista.
Assim como o ator é entidade
dupla, quando entra em cena representando um personagem, fictício ou
verdadeiro, cujo caráter o autor da peça procura salientar pelos pensamentos e
sentimentos, que lhe atribui; os quais o ator tem de interpretar e manifestar
nas atitudes, gestos, entonações da voz e nas mais insignificantes minudências
de uma existência mui diversa da sua; assim também as criaturas representam
duas entidades: uma íntima — a real
—; outra fictícia ou fingida — a que se ostenta na
sociedade, a que apresenta aos olhos do mundo.
O entrecho das peças é
urdido das fraquezas, vícios e torpezas da mísera humanidade.
Sobre o palco, a virtude, a
honradez, a inocência, triunfam ordinariamente; mas na grande cena social,
nesse teatro, onde todos são atores, o que triunfa é a esperteza, a habilidade
na arte de iludir; é a dissimulação, a hipocrisia e a fereza com que se
sacrifica tudo à plutocracia.
A origem de todas as
misérias, que constituem a trama, a urdidura, o enredo das comédias e
tragédias, que se representam cotidiana e incessantemente neste Pandemônio, é a
descrença que lavra nos espíritos, nas almas; a sede de gozo neste mundo,
porque é geral a dúvida sobre a realidade de uma vida futura; é o efeito de uma
religião, toda exterioridades, prometendo prêmios e penas irrisórias,
recompensas e castigos, em que ninguém acredita; é a relaxação dos costumes,
fruto do consórcio do sensualismo com o ceticismo.
O desejo, a sede de gozos,
inerentes à natureza humana, ligada à dúvida ou à descrença sobre a realidade
da existência da alma e, consequentemente, sobre a de uma vida futura, real e
positiva; esse consórcio danado produziu a tirania, que avassala, domina,
subjuga as sociedades civilizadas, impondo-lhes uma organização que cria a
necessidade de ilaquear, fingir, iludir, sofismar para ter alguma, não perder
de todo a liberdade; porque, opor-se altivamente, lutar às claras, é buscar ser
esmagado, isto é, quando o homem não é esclarecido, não tem convicção da
Verdade.
Eis porque, como o
demonstrou o eminente Max Nordau, a Mentira é a rainha do mundo.
Eis o que é o Mundo!
* * *
Julgo haver demonstrado,
senão com beleza, ao menos com verdade e clareza, de modo compreensível,
logicamente, a tese: Origem, Natureza e
Evolução da Alma Humana; indo até a altura em que a alma tendo-se feito
pura, evola para outros mundos.
Com o auxílio do meu
criptoscópio, instrumento — a razão — por meio da qual se vê aquilo que por sua
natureza não é visível, e podem-se devassar as regiões metafísicas, fui até
onde era possível, até onde encontrei fenômenos; fui mesmo além; fui até onde a
indução e a analogia me facultaram chegar — prevendo outras séries de evoluções
do espírito.[1]
Além está o impossível, o
que não pode ser descoberto, nem sequer pressentido pela inteligência a mais
perspicaz, servida por um criptoscópio perfeito, constituído como ele é até
agora.[2]
Aqueles que lerem estas
páginas sem prevenção de seitas ou escolas desculpem-me a ousadia, hão de
reconhecer que elas encerram uma verdade que representa uma valiosa conquista,
são o resultado de valente esforço de um estudioso que procura obedecer ao
conselho de Sócrates, quando disse: Nosce
te ipsum.
Ciência Espírita
Por Dr. Antônio Pinheiro Guedes
[1] Completadas desde 1910, pelo Racionalismo
Cristão do qual faz parte Antônio Pinheiro Guedes, hoje como alma grandemente
evoluída.
[2] Já
descoberto pelos espíritos do Astral Superior que dirigem as Casas
Racionalistas Cristãs.