O homem que sabe servir-se da pena, que pode publicar o que escreve e que não diz a seus compatriotas o que entende ser a verdade, deixa de cumprir um dever, comete o crime de covardia, é mau cidadão. Por Júlio Ribeiro.

O mundo dos sonhadores - Por Humberto Rodrigues

A vida é como ela se apresenta. Então, fica claro que não pode ser vivida como certas pessoas sonham.

Os sonhos são construídos pela imaginação fértil, onde as ações movidas por vontade forte inexistem.

Os sonhadores acham que o produto de seus devaneios deveria chegar às suas mãos com facilidade.

Não teriam problemas a resolver se tudo conseguissem sem qualquer esforço. Mas o mundo real é bem diferente do universo fantasioso em que vivem. Ai se revoltam, se queixam da vida que levam. Mas a vida é assim, cheia de dificuldades, de grandes desafios a serem enfrentados e superados.

As diferenças existentes entre as pessoas devem ser compreendidas e toleradas, porque não adianta apontar defeitos nos semelhantes se a própria pessoa não percebe que ela mesma tem imperfeições a corrigir.

O mundo dos sonhadores
Por Humberto Rodrigues
Colaboração: Rute Helena Macário







  • Índice
Capítulo 1
'O governo Lula é o mais corrupto de nossa história'
Capítulo 2
Montanhas de dinheiro: em pacotes, malas, carros-fortes e até em cuecas
Capítulo 3
Lula, o chefe
Capítulo 4
A história do 'acordo criminoso' da chapa Lula/José Alencar em 2002
Capítulo 5
O escândalo do dossiê: flagrante de R$ 1,7 milhão em dinheiro vivo
Capítulo 6
Os 403 dias que marcaram o escândalo do mensalão
Capítulo 7
Na denúncia do procurador-geral da República, mensalão foi ação de 'organização criminosa'
Capítulo 8
O assassinato do prefeito Celso Daniel, coordenador da eleição de Lula em 2002
Capítulo 9
Promotores pediram prisão de Antônio Palocci, acusado por envolvimento com a 'máfia do lixo'
Capítulo 10
Oito ministros do governo Lula. Oito casos de corrupção
Capítulo 11
O presidente do Senado, aliado de Lula. Outro caso de corrupção
Capítulo 12
  •  
Sob a conveniência da 'segurança nacional', Lula não revelou gastos com cartão corporativo
Capítulo 13
Em 5 anos, Lula repassou R$ 12,6 bilhões para ONGs. Dinheiro para amigos, mal fiscalizado
Capítulo 14
Traquinagens da família Lula da Silva. As andanças de Genival, o "Vavá"
Capítulo 15
Duas tragédias, apagão aéreo e corrupção na Infraero. Compadre de Lula ganhou milhões
Capítulo 16
STF abriu processos contra 40 mensaleiros. José Dirceu foi acusado de corrupção ativa e formação de quadrilha
Capítulo 17
Dois anos depois, Polícia Federal desmantelou outra organização criminosa nos Correios
Capítulo 18
TCU recomendou paralisar obras irregulares; Petrobras foi campeã em aumento de custos
Capítulo 19
Apesar do desgaste, Lula defendeu José Sarney e retribuiu apoio recebido no caso do mensalão
Capítulo 20
Lula: 'Sarney tem história para que não seja tratado como se fosse pessoa comum'
Capítulo 21
Na crise do mensalão, o PT temeu o impeachment. A oposição não agiu. Lula deu a volta por cima

‘O governo Lula é o mais
corrupto de nossa história’
  • 21
    - Ela votou contra a cassação do Luiz Estevão. Votou mesmo, e por motivos impublicáveis.
    Heloísa Helena reagiu, chamando José Dirceu de “ladrão dos cofres públicos” e de an-
    dar “passeando pelo Brasil e gastando todo o dinheiro que ele roubou do povo”:
    - Se durante toda a carreira dele de homem público medíocre e ladrão ele cometeu inú-
    meros atos que certamente não podem ser publicados, eu, como mulher trabalhadora, nunca
    fui capaz de nenhum ato impublicável.
    Em 2009, a Polícia Federal desencadeou a Operação Boi Barrica e indiciou Fernando
    Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), um dos maiores aliados de
    Lula. Fernando Sarney foi acusado de montar um esquema para desviar dinheiro público
    usando a Valec, empresa estatal encarregada de construir a ferrovia Norte-Sul.
    A relação de Fernando Sarney com a Valec se dava por intermédio do diretor de Enge-
    nharia da estatal, Ulisses Assad. Uma parte da obra, no valor de R$ 45 milhões, teria sido
    entregue à Lupama. Conforme as investigações, a Lupama era uma empresa de fachada
    ligada ao grupo de Fernando Sarney para desviar dinheiro da ferrovia.
    Para pagar pelos serviços de Ulisses Assad, Fernando Sarney teria mandado propina por
    meio de seu motorista. Uma mala de dinheiro seguiu de Brasília para São Paulo. Os federais
    estavam na cola, mas não contaram com o zelador do prédio da família Sarney na capital
    paulista. Ele percebeu a movimentação e ajudou o motorista a entrar escondido com a mala
    dentro do porta-malas de um carro de Fernando Sarney. O homem se safou.
  • 22
    Lula, o chefe
    O Palácio do Planalto bem que tentou abafar, mas desde o início o presidente Lula
    esteve no centro da crise política. O escândalo do mensalão eclodiu em 14 de maio de
    2005, com a divulgação de uma gravação clandestina pela revista Veja. Maurício Mari-
    nho, funcionário dos Correios, pôs no bolso do paletó R$ 3 mil. Propina. De cara, a evi-
    dente vinculação do PTB ao esquema de corrupção. Os Correios eram área de influência
    do partido, uma das agremiações integrantes da base aliada do Governo Federal, capita-
    neada pelo PT, a legenda de Lula.
    Enquanto os telejornais escancaravam a fita com as imagens de Maurício Marinho
    enfiando o dinheiro no bolso, Lula apressava-se em defender o deputado Roberto
    Jefferson (RJ), presidente nacional do PTB. Palavras de Lula, alto e bom som, em 17 de
    maio de 2005:
    - Precisamos ter solidariedade com os parceiros, não se pode condenar ninguém
    por antecipação.
    Lula se pronunciou durante almoço com aliados. O presidente insistiu:
    - Parceria é parceria. Tem de ter solidariedade.
    E arrematou, para não deixar dúvidas:
    - Essa é a hora em que Roberto Jefferson vai saber quem é amigo dele e quem não é.
    Lula estava preocupado. Recorda-se que, alguns meses antes, dissera a seguinte frase
    endereçada a Roberto Jefferson, em meio ao noticiário que especulava sobre um pagamento
    de R$ 10 milhões do PT ao PTB, com vistas a “comprar” o apoio dos trabalhistas às eleições
    municipais de 2004:
    - Eu te daria um cheque em branco e dormiria tranquilo.
    A gravação de Maurício Marinho trouxe outras complicações. Como se sabe, ele desan-
    dou a conversar com os interlocutores que o subornavam, sem saber que estava sendo gra-
    vado. O funcionário dos Correios mencionou uma empresa, a Novadata, pertencente a Mauro
    Dutra, o “Maurinho”, amigo de Lula havia mais de 20 anos. A Novadata fornecia computa-
    dores para o Governo Federal. Apenas nos dois anos e meio da primeira administração Lula,
    faturou R$ 284,5 milhões, sendo R$ 110 milhões em contratos com a Caixa Econômica
    Federal, R$ 100 milhões em contratos de locação de 27.500 computadores para a Petrobras
    e R$ 16,2 milhões em vendas aos Correios.
    Aqui uma pausa, para registrar: Lula passou o réveillon de 2001 na mansão de Mauro
    Dutra em Búzios, no badalado litoral do Rio. O mesmo Maurinho que fez contribuições ao
    PT, arrecadou dinheiro para o partido e emprestou avião a Lula. Na fita, Maurício Marinho
    fala de “acertos” em licitações. Descreve manobra da Novadata para superfaturar computa-
    dores. A empresa tentou fazer o preço de cada computador vendido ao governo dar um salto
    injustificado, de R$ 3.700 para R$ 6.000.
    Logo nos primeiros dias da crise, Lula trabalhou abertamente contra a ideia de se criar
    uma CPI para investigar a corrupção nos Correios. Foi decisão de governo: a administração
  • 23
    federal iria liberar dinheiro de emendas ao Orçamento a todos os parlamentares que votas-
    sem contra a CPI. Faltou combinar com os jornais.
    Roberto Jefferson foi destaque no noticiário político. As incursões do presidente do
    PTB nos subterrâneos de Brasília revelaram várias suspeitas de corrupção. Lula achou por
    bem se afastar do aliado, mas continuou a trabalhar contra a instalação da CPI. Roberto
    Jefferson estava cada vez mais isolado. Os estrategistas do presidente não imaginaram que
    o desgaste do político fluminense o levasse a uma reação explosiva.
    Em 6 de junho de 2005, Roberto Jefferson concedeu uma entrevista-bomba ao jornal
    Folha de S.Paulo. O Brasil não seria mais o mesmo. A manchete, na primeira página, para
    não deixar dúvidas: “PT dava mesada de R$ 30 mil a parlamentares, diz Jefferson”. O
    escândalo do mensalão assumiria contornos dramáticos.
    Leal ao presidente que procurou protegê-lo, Roberto Jefferson tentou deixá-lo fora da
    crise. Mas logo implicou o superministro José Dirceu (PT-SP).
    • 35
      Durante o depoimento, foi reproduzida frase atribuída a Lula:
      “Ele dizia: ‘Pô, Oswaldão, tem que arrecadar mais, faz que nem o Celso Daniel em
      Santo André. Você quer que a gente ganhe a eleição como?”
      Naquele ano, Lula voltou a perder, pela terceira vez consecutiva. Mas, em 2002, dispu-
      tou novamente e foi eleito presidente da República. Passou a despachar no gabinete do
      terceiro andar do Palácio do Planalto. Após mais de três anos como o mais alto mandatário
      do País, ficaria difícil acreditar que não soubesse o que acontecia na sala bem ao lado da
      sua, ocupada durante parte daquele período de turbulência pelo superministro Antonio Palocci
      (PT-SP). E ali se urdiu a conspiração contra o caseiro Francenildo Santos Costa.
      O rapaz havia desmascarado Antonio Palocci. Contestou as mentiras do ministro. Anto-
      nio Palocci procurava um meio de negar o impossível, o fato de ter sido um frequentador da
      “casa dos prazeres”. A mansão fora alugada em Brasília pela “república de Ribeirão Preto”,
      como ficou conhecido o grupo de colaboradores do então ministro, e costumava ser reduto
      para festas com garotas de programa.
      Lula participou ativamente da tentativa de blindar Palocci. O presidente teria tramado
      o recurso ao STF (Supremo Tribunal Federal) para suspender o depoimento de Francenildo
      Santos Costa à CPI dos Bingos. As investigações sobre o caso mostraram que Lula fora
      informado pessoalmente da ordem de Palocci para a violação do sigilo bancário do casei-
      ro. Jorge Mattoso, o então presidente da Caixa Econômica Federal, avisara-o em 24 de
      março de 2006.
      A rigor, Lula já recebera informações a respeito quatro dias antes, em 20 de março,
      quando o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, relatou ao presidente o envolvimento
      de Antonio Palocci na quebra do sigilo. Palocci só seria afastado em 27 de março, uma
      semana depois. Naquele momento, não havia mais jeito de desvinculá-lo do crime. Durante
      todo o escândalo, para variar, Lula deu uma de quem não sabia de nada.
      No auge da crise, em 23 de março, houve uma reunião na casa de Antonio Palocci. A
      revista Veja relatou que um sindicalista nomeado por Lula na vice-presidência da Caixa
      Econômica Federal fora escolhido para subornar algum funcionário da Caixa, com R$ 1
      milhão. A ideia era encontrar alguém para assumir a violação do sigilo.
      O tal sindicalista, Carlos Augusto Borges, era homem de confiança de Lula. Será possí-
      vel que o presidente não soubesse da missão de Borges? Ou, ao contrário, teria sido exata-
      mente o presidente quem o sugerira para pilotar a operação de suborno? Tudo indica que
      Lula considerava sua obrigação fazer o que estivesse ao alcance para salvar Antonio Palocci,
      que tantos serviços lhe prestara, desde a campanha eleitoral de 2002.
      Lembra-se que foi Antonio Palocci quem assumiu o papel de coordenador daquela cam-
      panha, depois da morte de Celso Daniel. Infere-se que Antonio Palocci fez o que Celso
      Daniel estaria fazendo. Sabe-se que, depois da reunião na casa de Palocci, o ministro da
      Fazenda e Márcio Thomaz Bastos foram se encontrar com Lula no Palácio do Planalto.
      Em 16 de abril de 2006, o ex-governador do Rio, Anthony Garotinho, concedeu entre-
      vista à Folha de S.Paulo. Ele reproduziu as palavras de José Dirceu ao procurá-lo na véspera
      da votação do processo que cassou o mandato de deputado de José Dirceu. O ex-ministro
      queria o apoio de Anthony Garotinho para não perder o cargo. José Dirceu teria dito assim:
    • 36
      - Saiba que tudo o que fiz, tudo, fiz porque o Lula mandou. Você acha que ia mandar
      bloquear o dinheiro do Rio e o Palocci iria obedecer? Todo político tem alguém que faz o
      lado mau. Estou pagando agora por ter feito o lado mau.
      Publicada a entrevista, o comentário do ex-deputado José Dirceu, devidamente cassado,
      sobre a declaração de Anthony Garotinho:
      - Não vou bater boca com ele.
      Informações que vieram a público e não foram desmentidas, durante a segunda quinze-
      na de abril de 2006, davam conta de que José Dirceu, depois de cassado, continuou a se
      reunir com Lula e integrantes do Governo Federal. Fora incumbido pelo presidente de tocar
      tarefas estratégicas, como a de se encontrar com o ex-presidente Itamar Franco, com quem
      Lula tentava uma aproximação política. A rigor, José Dirceu continuaria a cumprir missões
      para as quais seria designado por Lula no segundo mandato do presidente. Exemplos: a
      articulação em defesa do mandato do senador José Sarney (PMDB-AP), acusado de quebra
      do decoro parlamentar; o estreitamento dos laços políticos entre PT e PMDB; e a costura
      política em prol da candidatura da ministra Dilma Rousseff (PT-RS) à Presidência da Repú-
      blica em 2010.
      Se Lula manteve relacionamento estratégico com José Dirceu, era falácia o discurso do
      presidente de que fora apunhalado pelas costas no escândalo do mensalão. O afastamento
      de José Dirceu de seu governo teria sido só um jeito de manter as aparências. Mesmo nos
      bastidores, Dirceu era essencial a Lula.
      José Dirceu pagou caro. Foi cassado justamente por ter sido apontado como o responsá-
      vel pelo esquema de corrupção. Ele apenas o operava. E como Lula não interrompeu a
      parceria com José Dirceu, era conversa mole a de que o presidente havia sido traído.
      Este livro é um empenho pela memória. Tantos os caminhos da corrupção, dos persona-
      gens corruptores e corrompidos, que ao longo dos 403 dias da crise do escândalo do mensalão
      fizeram esquecer e cansar. Ficamos anestesiados, descrentes. Temos de lembrar.
      Lula não queria a verdade. Nunca a quis. O chefe de tudo foi, desde o início, como se
      verá no dia a dia dos acontecimentos, o próprio presidente Lula.

  • 51
    - Todos sabem que o Márcio Thomaz Bastos tem credibilidade para apurar o caso
    dos Correios.
    Na saída do mesmo encontro, o presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti
    (PP-PE), um aliado do governo, desqualifica a CPI. Nas palavras dele:
    - Todo mundo sabe como começa uma CPI, mas não sabe como termina. Além do mais,
    quem tem o poder de oratória do Roberto Jefferson sabe colocar bem as palavras. Ele pro-
    vou que não tem nada para que possa ser condenado.
    O apelo do presidente e os esforços da tropa de choque do governo não impedem a
    decisão dos parlamentares, contrária a deixar as investigações só nas mãos da Polícia Fede-
    ral. A oposição protocola requerimento com o pedido de abertura de CPI. O documento
    recebe as assinaturas de 230 deputados e de 46 senadores, dos quais 101 deputados e 10
    senadores aliados do Planalto.
    Novos trechos da fita em que Maurício Marinho revelou a corrupção nos Correios são
    publicados nos jornais. Na gravação, o funcionário envolveu a Novadata, do empresário
    Mauro Dutra, o “Maurinho”, amigo de Lula. Ele já atuara como arrecadador de dinheiro
    para campanhas do PT. A empresa, especializada em informática, fornecia computadores ao
    Governo Federal. Maurício Marinho referiu-se a uma operação favorecendo a Novadata em
    licitação. O diálogo começa com o interlocutor que gravava a conversa:
    - E a Novadata acertou daí direto com a diretoria...
    - Foi direto com a diretoria.
    - Ou foi com você?
    - Não, foi eu, o diretor e o Godoy. Mas como teve um negócio, era um negócio grande, o
    Godoy saiu... Veio até de São Paulo...
    Maurício Marinho mencionou o diretor Antonio Osório Batista e um assessor dele,
    Fernando Godoy, também afastado devido ao escândalo. O diálogo prosseguiu com uma
    pergunta sobre a contratação da Novadata. Como se sabe, Marinho não tinha conhecimento
    de que estava sendo gravado:
    - Acertaram com o Osório direto então?
    - Não, o Osório não acerta. É comigo ou com o Godoy.
    O jornal Folha de S.Paulo denuncia os negócios da Novadata com o governo Lula. Ren-
    deram R$ 273,5 milhões em menos de dois anos e meio. Só com a Caixa Econômica Fede-
    ral, vendas de R$ 95 milhões. Foram fechados três novos contratos com os Correios, por R$
    15,3 milhões. No quarto acerto com a Novadata, os Correios fizeram um aditivo e acrescen-
    taram R$ 5,5 milhões a um contrato de R$ 98 milhões.
    A denúncia assume contorno ainda maior: Lula passou o réveillon de 2001 na mansão de
    Mauro Dutra em Búzios (RJ), uma das praias mais badaladas do Brasil. Maurinho pôs avião
    à disposição de Lula.
    Em outro trecho da gravação com a câmera escondida, Maurício Marinho trata das rela-
    ções da Novadata com os Correios:

  • 52
    - Olha, no fornecimento de material, o mais forte é ele. Aqui no Correio, é. Computador,
    esses negócios, é a Novadata. Pelo menos nos últimos dois anos eles têm vencido quase
    todas aqui dentro.
    Ainda Maurício Marinho, sobre uma licitação de “se não me engano R$ 60 milhões,
    coisa assim”. “Eles”, no caso, é a Novadata:
    - Mas como eles perceberam que só estavam eles e eles achavam que podiam ganhar
    mais, falaram “olha, nós não vamos partir para abrir o processo, você dá como ‘deserta’ e
    marca uma outra abertura”.
    “Deserta”, no linguajar dos certames públicos, é a licitação para a qual não se apresen-
    tam concorrentes. Tem de ser refeita. Diz Maurício Marinho:
    - O preço inicial do computador que nós tínhamos colocado em R$ 3.700 na licitação,
    eles pediram para aumentar... Sabe para quanto foi a licitação, um item, eram quatro itens?
    Foi R$ 6.000. Olha que absurdo...
    No discurso da véspera na Câmara dos Deputados, Roberto Jefferson chegou a denun-
    ciar um certo comandante Molina, que o teria procurado duas semanas antes da divulga-
    ção da fita, em nome do senador Ney Suassuna (PMDB-PB). Molina teria tentado vender
    a gravação clandestina, a mesma cujo teor fora publicado por Veja. Roberto Jefferson diz
    que recusou o negócio. Mas não o denunciou. O PMDB, por sua vez, negou qualquer
    envolvimento com a corrupção nos Correios. Pressionava o governo. Não queria proble-
    mas. Ameaçou Lula com CPI para investigar o caso Waldomiro Diniz. O comandante
    Molina foi inocentado.
    Para entender: dentro do loteamento promovido pelo governo Lula, o PTB ficou com
    uma diretoria dos Correios, o PT com duas e o PMDB com três, incluindo a Financeira. E
    isso sem falar na indicação do próprio presidente dos Correios, o ex-deputado João Henrique
    de Almeida, também uma nomeação da cota do PMDB.
    Aqui, cabe uma explicação: ao lotear estatais entre vários partidos, a administração Lula
    optou por trabalhar com as “porteiras abertas”, o que tornou a gestão das empresas mais
    complexa. Se tivesse sido adotado o modelo de “porteiras fechadas”, ou seja, se cada estatal
    fosse entregue em sua totalidade para a administração de um só partido da base aliada, este
    seria o responsável direto pelo que acontecesse, para o bem ou para o mal.
    É por isso que desvendar os meandros do escândalo do mensalão se tornou tarefa com-
    plicada. Os acertos e as interações envolviam várias forças políticas e interesses diversos,
    que precisavam ser sempre contemplados, casando diferentes setores da administração, uns
    se sobrepondo a outros.
    Mas voltemos ao ex-deputado João Henrique Almeida, o presidente dos Correios. Rapi-
    damente, ele anuncia a suspensão de uma licitação suspeita. Não era para menos. Os deta-
    lhes de bastidores foram descritos na gravação clandestina com Maurício Marinho. O negó-
    cio de R$ 61 milhões pretendia viabilizar a aquisição de medicamentos para funcionários
    dos Correios. João Henrique Almeida também toma outra providência: impede o acesso de
    jornalistas à documentação sobre o processo de compra de remédios.

  • 53
    Na gravação, Maurício Marinho cita o diretor de Recursos Humanos dos Correios, Robinson
    Koury Viana da Silva, suplente do senador Ney Suassuna. Portanto, outro indicado do PMDB.
    O relato é rico, traz detalhes de uma parte da negociata tramada com o suplente de senador.
    Vale a pena:
    - Todos os projetos dele, nós que fazemos o projeto básico. Mesmo no RH. O pessoal
    dele não tem muito trâmite no negócio, a gente monta, passa pra ele, aí ele chama o depar-
    tamento e diz: “Eu quero isso”. Mas ninguém sabe que é nós que estamos fazendo. Então o
    nosso negócio é assim. Tem uma licitação que vai ser... São 60 milhões em beneficiamento
    de saúde. (...) Fizemos tudo aqui. A decisão dele não conseguia desenrolar, desenrolar, um
    ano sentado em cima. Fechamos o projeto. Apareceram umas quatro empresas, deputado
    “a”, senador “b”, um rolo danado. “Meu amigo, o negócio é seu. Você quer que a gente
    trabalhe com quem?” Ele falou: “Infelizmente vou defender as quatro, porque as quatro
    virão através dos caciques e eu não posso fechar porta para ninguém”. “Tudo bem, então
    vou colocar o preço com as quatro suas, entendeu, mando a carta, com toda a planilhinha,
    daquelas quatro”. Fechei todo o processo, eram no mínimo três, tinha quatro, entendeu? (...)
    O processo está pronto. Tá pronto! Fechado, redondo. Ele adotou o recurso, o recurso é
    dele, da área dele, dos recursos humanos, do RH. Tá? Aí mandaram o processo de volta. O
    que nós fizemos chegou pra nós. Aí nós adotamos os nossos documentos, assinamos e
    pedimos autorização. O presidente, é acima de 650 mil, autorizou a abertura. Tá no comitê
    de análise. Saiu do comitê de análise, está sendo publicado. Dentro de poucos dias vocês
    vão ver aí na internet, tá lá, Diário Oficial. Agora, é um negócio grande. O que é que ele fez?
    Aí o acerto que a gente faz. Nesse tipo de negócio, ele que vai fechar, tem participação. Só
    que uma parte da participação vai vir pra nós. Entendeu? O negócio é dele, é capitaneado
    (inaudível o trecho da gravação)... Ele que levantou a bola, nós fizemos viabilizar o negócio
    dele. Só isso. Mas nós temos uma participação. Dessa participação dele, a gente passa para
    o nosso partido. Entendeu? Que é ele que me sustenta, segura a gente aqui.
    8
    21/5/2005 A revista Veja traz nova denúncia. Com o título “Mesada de R$ 400 mil para o
    PTB”, a acusação de que Lídio Duarte, o presidente do IRB (Instituto de Resseguros do
    Brasil), uma estatal federal, vinha sendo pressionado a entregar R$ 400 mil por mês ao
    PTB. Um corretor de seguros, Henrique Brandão, agia em nome do deputado Roberto
    Jefferson e exigia a quantia do presidente do IRB.
    A reportagem relata que Lídio Duarte ficou em dúvida, não sabia ao certo se Henrique
    Brandão falava mesmo em nome do PTB. A saída foi procurar Roberto Jefferson. A revista
    Veja documenta:
    “Na conversa, Jefferson não deixou dúvidas: disse que era amigo de Henrique Brandão
    havia mais de 30 anos, repetiu que as despesas do partido eram altas e que precisava da
    colaboração financeira dos dirigentes indicados para seus cargos pelo PTB. Em outras pala-
    vras: quem tinha cargo tinha que roubar.”
    Eis a íntegra da transcrição da declaração de Lídio Duarte a Veja

  • 73
    Federal, a zelosa Corregedoria da União não investigaram a Diretoria de Informática... E
    60% do depoimento do senhor Maurício Marinho apontam lá para a diretoria do ‘seu’ Silvinho
    Pereira, secretário-geral do PT.
    - Não entendi por que não pesquisaram a Novadata ainda. Não sei por que correm atrás
    de um óbolo de R$ 3 mil, quando os contratos que desfalcam os Correios são de bilhões.
    Não compreendi ainda como é que o cioso Ministério Público, a ciosa Polícia Federal e a
    ciosa Corregedoria da República ainda não investigaram o correio aéreo noturno, do ‘seu’
    Silvinho Pereira, onde as contas de superfaturamento nos primeiros anos da atual gestão
    chegam a superfaturamento de 300%.
    - A Skymaster? Eu nunca tinha ouvido falar. Sei agora, porque gente boa dos Correios
    está começando a me dar essas informações. E a Novadata? Naquela época não sabia nada,
    mas gente boa dos Correios começa a me dar agora essas informações. Assim como gente
    boa começa a me dar informações, deputado Valdemar Costa Neto, das licitações da Valec,
    do ex-deputado Juquinha, do PL. Como gente boa começa a me dar o que está acontecendo
    no Dnit, lá do PL. Coisas que, se Deus quiser, a CPI vai conhecer.
    A revista Isto É Dinheiro publica duas entrevistas com Fernanda Karina Ramos
    Somaggio, ex-secretária do empresário Marcos Valério, dono das agências de publicida-
    de DNA Propaganda e SMPG Comunicação. Fernanda Karina acusa Marcos Valério de
    envolvimento com o esquema de compra de deputados. Conta que havia encontros fre-
    quentes de Marcos Valério com dirigentes do PT. Cita Delúbio Soares, Silvio Pereira e
    reuniões em hotéis de São Paulo e Brasília.
    - Em que hotéis?
    - O Blue Trees, em Brasília, o L’Hotel, em São Paulo, o Sofitel, também em São Paulo.
    A secretária testemunhou saídas de dinheiro:
    - Com certeza. O Marcos Valério ficava o tempo todo com o Delúbio Soares. Era o
    Marcos quem pegava o negócio e levava de um lugar para o outro.
    - Onde o dinheiro era retirado?
    - Era sempre no Banco Rural. E era coisa grande. Algumas vezes pouco, R$ 50 mil, R$
    30 mil. Às vezes muito, mas muito mais.
    Para ela, Delúbio Soares era o mais próximo de Marcos Valério no esquema:
    - Depois, o Delúbio abriu as portas e aí tinha o José Dirceu, o Silvio Pereira.
    - Como era o contato com o ministro José Dirceu?
    - Havia ligações. A gente ligava e pedia para a menina do Delúbio colocar ele em contato
    com o Marcos Valério.
    - Então o Valério tinha uma comunicação direta com o Dirceu?
    - Sim.
    - A senhora relata também que o irmão do ex-ministro Anderson Adauto teria rece-
    bido dinheiro da agência. Isso aconteceu no Ministério?
    - Não. O irmão dele foi lá na agência, pegou uma mala de dinheiro e foi embora.
    A ex-secretária conta que Marcos Valério mantinha contato com os deputados José Mentor
    (PT-SP) e João Paulo Cunha (PT-SP). Marcos Valério pagou passagens aéreas para Silvana

  • 74
    Jupiassu, assessora de João Paulo Cunha. A filha de Silvana Jupiassu também ganhou
    bilhetes aéreos.
    - Isso porque ela facilitava o contato com o João Paulo.
    Em outra parte da entrevista, Fernanda Karina envolve outra funcionária de confiança de
    Marcos Valério nas operações de saques de dinheiro:
    - Eram pedidos frequentes. Era tudo feito pela Simone Vasconcelos. Era ela quem ia de
    vez em quando para Brasília pagar.
    Fernanda Karina fala das atividades de Marcos Valério:
    - Ele faz intermediação de negócios. Por exemplo: a SMPB tem a conta do Banco do
    Brasil na parte de esportes através da Multi Action, uma das empresas do grupo. E é tudo
    negociata. Eu sei que eles passam dinheiro para o pessoal do governo.
    - Como isso é feito?
    - O Marcos Valério manda e tem um pessoal do Departamento Financeiro que faz isso.
    - E como a senhora tinha conhecimento?
    - Ele era meu chefe. Eu estava sempre com ele. Todo mundo sabe que tem mutreta no
    fato de a empresa ter um bom dinheiro no Banco do Brasil.
    - Haveria pagamento de propinas a gente do governo?
    - Eu já vi sair muito dinheiro de lá.
    - Em que situações?
    - Vi sair R$ 100 mil em dinheiro para o irmão do Anderson Adauto, no fim de 2003,
    quando ele era ministro dos Transportes.
    - E para o pessoal do Banco do Brasil?
    - O Marcos Valério dá muitas festas para eles, muitos paparicos, muitos mimos.
    - Ele oferece viagens de jatinho para eles?
    - Não, o Marcos usa o jato do Banco Rural, eventualmente. O Delúbio Soares também
    anda no jato do Banco Rural.
    Em outro trecho, o repórter Leonardo Attuch indaga se Marcos Valério fez pagamentos
    para obter contas publicitárias do governo. Diz Fernanda Karina:
    - Com certeza. Quando você entra numa concorrência, a gente já sabe quem vai ganhar
    e quem não vai. Eles fazem a licitação pública, mas é um jogo de cartas marcadas. Tem
    quem vai pegar a melhor parte da conta, a pior parte da conta.
    - A senhora viu?
    - Olha, para o Banco do Brasil, o Marcos dava festas. Festas para a alta cúpula e para a
    área de marketing.
    A revista Isto É Dinheiro pergunta como os pagamentos eram feitos:
    - Tinha duas pessoas da área financeira, a Simone Vasconcelos, e uma assistente, a Geysa,
    que cuidavam de tudo.
    - A senhora tem noção de quanto?
    - Já vi o boy sair com motorista para tirar R$ 1 milhão do Banco Rural. Era para depois
    dividir o dinheiro, entendeu?
    A Folha de S.Paulo divulga o relatório “Agências & Anunciantes”, do jornal Meio &

  • 75
    Mensagem. Traz informações sobre o faturamento da agência DNA Propaganda, de Marcos
    Valério. É o que mais cresceu em 2004, com um aumento superior a 200%. Dos R$ 23,2
    milhões de faturamento registrados em 2003, o valor subiu para R$ 70,5 milhões. A agência
    atende as contas do Banco do Brasil, Eletronorte e Ministério do Trabalho.
    Já a SMPB, outra agência de Marcos Valério, cuida da conta dos Correios. Teve
    faturamento de R$ 39,9 milhões em 2004, sendo R$ 29,6 milhões apenas com os Correios.
    Além de atender o Banco Rural, a SMPB foi contratada pelo Ministério dos Esportes e pela
    Câmara dos Deputados, na gestão do presidente João Paulo Cunha (PT-SP).
    Ex-tesoureiro nacional e secretário-geral do PP, Benedito Domingos afirma aos jornais
    Correio Braziliense e O Estado de S. Paulo que tomou conhecimento de um esquema de
    pagamento de mensalões a parlamentares do PP. A distribuição de dinheiro era feita no
    apartamento do deputado José Janene (PP-PR), localizado em edifício da Asa Sul, em Brasília.
    - Você sabe que as pessoas tinham, mas não sabia de onde vinha.
    Benedito Domingos conversa com o repórter Expedito Filho, de O Estado de S. Paulo.
    Diz que o mensalão era conhecido como “apoio financeiro”, e entendido como uma espécie
    de caixa 2:
    - O zunzunzum era muito forte. Um grupo sempre frequentou a casa do Janene. Sempre
    houve uma grande movimentação. A casa do Janene era chamada de pensão.
    33
    15/6/2005 O governo conquista o comando da CPI dos Correios. Nomeia dois aliados para
    os cargos principais da comissão: o presidente será o senador Delcídio Amaral (PT-MS), e o
    relator o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). Osmar Serraglio tinha boas ligações com
    José Dirceu. Apoiara a candidatura do filho do ministro, José Carlos Becker (PT), a prefeito
    da cidade de Cruzeiro do Oeste (PR).
    Delcídio Amaral e Osmar Serraglio acenam com investigações restritas aos Correi-
    os, deixando de fora denúncias acerca do mensalão. Na véspera, parlamentares de cinco
    partidos entregaram ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), pedido
    para a criação da CPI do Mensalão. O requerimento continha assinaturas de 255 depu-
    tados e 41 senadores.
    Os jornais destacam que durante os trabalhos da CPI do Banestado, no início do governo
    Lula, o relator e deputado José Mentor (PT-SP) apresentou sete requerimentos relacionados
    ao Banco Rural, determinou a quebra de sigilo bancário da instituição, solicitou cópia de
    inquérito policial sobre investigações de empresas do banco no exterior, ouviu diretores e
    convocou a presidente da instituição para depor. No final do processo, não concluiu nenhu-
    ma investigação relativa ao Rural.
    Outra notícia: o Banco Rural foi condenado a pagar multa de US$ 5,9 milhões por ilega-
    lidades cometidas no mercado de câmbio, na década de 80. O Rural teria permitido remes-
    sas de dinheiro ao exterior, com a falsificação dos nomes dos verdadeiros remetentes.

  • 103
    Belo Horizonte, onde a SMPB mantinha conta bancária. Eram solicitações para pagamen-
    tos em Brasília. Por fax eram indicados os valores e os nomes dos sacadores.
    O tesoureiro tinha a responsabilidade de cuidar da liberação dos recursos junto ao Banco
    Central, e dos detalhes para a entrega. O dinheiro não deveria fazer volume. Por isso, vinha
    em notas de R$ 50 e R$ 100. Era levado para uma sala especial da agência. Ali as cédulas
    eram colocadas em bolsas que os próprios sacadores traziam. Tudo gente apressada que ia
    embora, em geral, sem conferir os valores.
    José Francisco de Almeida Rego relata que Simone Vasconcelos, executiva da SMPB
    em Belo Horizonte, fazia retiradas na agência do Brasília Shopping. Mas não levava o
    dinheiro com ela. Assinava recibos e listava os nomes daqueles que passariam depois para
    receber. Na maioria das vezes eram pacotes de R$ 50 mil ou R$ 100 mil. As pessoas, por
    determinação dela, não precisavam se identificar. A Polícia Federal confirma que localizou
    documentos comprovando saques em nome da SMPB na agência do Banco Rural em Brasília,
    mas estranhou a falta de identificação dos sacadores.
    61
    13/7/2005 Mais uma versão para o caso do petista preso com R$ 200 mil numa maleta e
    US$ 100 mil na cueca. No início, José Adalberto Vieira da Silva alegou ser agricultor e o
    dinheiro, resultado da venda de verduras. Agora, o deputado José Nobre Guimarães (PT-
    CE), chefe dele, envolve outro assessor de seu gabinete, José Vicente Ferreira. Os dois
    iriam usar o dinheiro para abrir uma locadora de veículos em Aracati (CE), em sociedade
    com um terceiro petista, Kennedy Moura Ramos. Diz o deputado Guimarães:
    - Isso comprova que eu não tenho nada a ver com esse caso, nem o PT e muito menos o
    ex-presidente nacional do partido.
    José Nobre Guimarães afirma que tudo foi uma “armação” contra o PT. Manifesta-se
    “decepcionado” e “traído” pelo assessor preso. A primeira pessoa que José Adalberto Vieira
    da Silva avisou ao ser detido foi Kennedy Moura Ramos. Ele é assessor especial da presi-
    dência do BNB (Banco do Nordeste do Brasil). O presidente, Roberto Smith, também per-
    tence às fileiras do PT. Da mesma forma que Kennedy Moura Ramos, assumiu o cargo por
    conta da amizade e ligação com José Nobre Guimarães, o irmão de Genoino.
    Kennedy Moura Ramos, ex-marido da presidente do PT do Ceará, Sônia Braga, foi as-
    sessor jurídico de José Nobre Guimarães. Kennedy Moura Ramos é responsável pelas fi-
    nanças do PT no Ceará. Avisou José Nobre Guimarães da prisão do assessor. Pede exonera-
    ção dos quadros do BNB.
    Em depoimento à CPI dos Bingos, o empresário de jogos Carlos Augusto Cachoeira, o
    “Carlinhos Cachoeira”, ataca Waldomiro Diniz. Segundo ele, o ex-subchefe da Casa Civil e
    assessor direto do ex-ministro José Dirceu (PT-SP) pediu propina de R$ 100 mil a R$ 300
    mil, em troca de favorecimento em licitação. Na época, Waldomiro Diniz presidia a Loterj,
    estatal que administra loterias no Rio. Waldomiro Diniz teria dito que o dinheiro era para
    financiar campanhas eleitorais. Para Carlinhos Cachoeira, Diniz agia sozinho:
    - Em todas as conversas, no final, era pedida propina. O Waldomiro dizia: “Quero 1% do

  • 104
    contrato bruto”. Ele sempre pedia dinheiro para campanha. Hoje, tenho certeza de que esse
    dinheiro ficava com ele.
    62
    14/7/2005 O Jornal Nacional, da TV Globo, noticia que assessores e até familiares de depu-
    tados do PT estiveram no Banco Rural, na agência do Brasília Shopping, local de pagamen-
    to do mensalão. Anita Leocádia Pereira Costa, assessora do líder do PT na Câmara, deputa-
    do Paulo Rocha (PA), foi à agência duas vezes. Reação do deputado Rocha: a funcionária
    foi fazer consulta médica em uma clínica neurológica, que também funciona no prédio.
    Márcia Milanésio Cunha, casada com o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), esteve no
    Banco Rural três vezes. Reação de João Paulo Cunha, por meio de nota à imprensa: a mu-
    lher esteve na agência bancária para resolver problema relativo ao pagamento de uma conta
    de televisão a cabo.
    O presidente do PT na Bahia, deputado Josias Gomes, foi pessoalmente ao Banco Rural.
    Explicação dele:
    - Como havia almoçado no shopping, fui ao banco pedir uma informação. Não fiz
    saques.
    Os três não contaram a verdade.
    Azeda o caso do assessor do deputado José Nobre Guimarães (PT-CE), preso com R$
    200 mil numa maleta e US$ 100 mil na cueca. A matéria vai ao ar pelo Jornal Nacional, da
    TV Globo. Kennedy Moura Ramos, petista afastado do BNB (Banco do Nordeste do Brasil)
    em consequencia do escândalo, não gostou de ser envolvido na história pelo deputado José
    Nobre Guimarães. Não engoliu a versão de que o dinheiro serviria para abrir uma locadora
    de carros no interior do Ceará. A entrevista ao JN:
    - Não sei que rancores fizeram com que o deputado me fizesse uma vinculação a uma
    empresa que nunca ouvi falar.
    Kennedy Moura Ramos vai além. Relata a conversa com José Nobre Guimarães, padri-
    nho de seu casamento, quando ele lhe pediu para assumir que era o dono do dinheiro. Para
    Ramos, foi uma “proposta indecente”:
    - Ele falou que o Adalberto tinha que ser protegido por questões de Estado.
    Kennedy Moura Ramos também descreve o diálogo com José Nobre Guimarães, quan-
    do lhe contou sobre a prisão de José Adalberto da Silva:
    - Perguntou se ele tinha falado alguma coisa. Disse que não sabia. Ele disse: “Graças
    a Deus”.
    Outra contradição: José Vicente Ferreira, assessor de José Nobre Guimarães apontado
    pelo deputado como participante do negócio da locadora, havia concedido entrevista ao
    jornal O Povo, do Ceará. Dissera que emprestou um cheque a José Adalberto Vieira da
    Silva, seu amigo, a fim de que pudesse comprar uma passagem aérea para Recife. José
    Vicente Ferreira não sabia da viagem a São Paulo. Muito menos de locadora.
    O Ministério Público investiga a hipótese de Vieira da Silva ter sido um emissário de
    Kennedy Moura Ramos em São Paulo. A finalidade da viagem, buscar dinheiro de propina

  • 105
    repassado por empresários que mantêm negócios com o BNB. No dia anterior à prisão,
    Vieira da Silva teria se deslocado até o escritório de um empresário do setor de construção
    civil do Grupo Cavan.
    A polícia de Minas Gerais apreende restos de 2 mil notas fiscais da DNA Propaganda. Os
    documentos estavam jogados em 12 caixas de papelão, na casa do ex-policial Marco Túlio
    Prata, em Contagem (MG). Ele é irmão do contador da agência, Marco Aurélio Prata. Na
    residência são localizados dois tambores de lata, com notas fiscais carbonizadas.
    Entre as notas fiscais queimadas, provavelmente registros frios, recibos da DNA relati-
    vos a serviços supostamente prestados por empresas terceirizadas ao Banco do Brasil,
    Eletrobrás e Ministérios do Trabalho e do Esporte.
    Os policiais também acham documentos carbonizados, nos quais ainda se consegue ler o
    nome da DNA. Estavam numa rua de terra, sem movimento, bem perto da casa do irmão do
    contador de Marcos Valério. A papelada queimada encheu cinco sacos.
    Cai o diretor de Marketing e Comunicação do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato.
    Ligado ao ex-ministro Luiz Gushiken (PT-SP), dividiu com ele apartamento em Brasília.
    Na campanha de Lula, Henrique Pizzolato, militante do PT havia 20 anos, trabalhou com
    Delúbio Soares para captar recursos.
    Ele tinha relação próxima com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo (PT-PR), e
    era amigo de Ricardo Berzoini (PT-SP), ex-ministro do Trabalho e secretário-geral do PT.
    Henrique Pizzolato é desligado da presidência do Conselho Deliberativo da Previ, o fundo
    de pensão do Banco do Brasil.
    No governo Lula, Henrique Pizzolato ocupou o posto estratégico de responsável pelos
    gastos de propaganda do Banco do Brasil. Foram R$ 153 milhões em 2003, e R$ 262
    milhões em 2004. Afastado Henrique Pizzolato, o Banco do Brasil rescinde contrato de
    publicidade com a DNA de Marcos Valério. Henrique Pizzolato também era amigo de
    Marcos Valério.
    O ex-diretor de Marketing ficou conhecido por participar do episódio dos R$ 70 mil que o
    Banco do Brasil deu a um show de arrecadação de fundos, com objetivo de comprar uma sede
    nova para o PT. Com a divulgação da história, o dinheiro teve de ser devolvido. Ele também
    foi apontado como responsável por um evento artístico considerado suspeito, no valor de R$
    2,5 milhões, promovido pelo então governador de Mato Grosso do Sul, Zeca do PT.
    Banho de água fria. A base governista impede que a CPI dos Correios quebre os sigilos
    bancários, fiscais e telefônicos de José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Silvio Perei-
    ra e do empresário Mauro Dutra, o “Maurinho”, amigo de Lula. O Palácio do Planalto
    também consegue bloquear a convocação e o depoimento do ex-ministro Luiz Gushiken.
    63
    15/7/2005 Operação orquestrada. Marcos Valério vem a público por meio de nota e nega
    mais uma vez a existência do mensalão. Explica que, “em atenção a pedidos de Delúbio

  • 148
    O tesoureiro lista os diretórios do PT que receberam recursos de caixa 2. Cita São Paulo,
    Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Minas Gerais, Goiás e Distrito Federal.
    - Pedi para o Marcos Valério resolver com esses Estados.
    Delúbio se atrapalha ao ser inquirido pelo deputado Júlio Redecker (PSDB-RS). O de-
    putado procura esclarecer a transferência de R$ 457 mil do valerioduto para Márcio Lacerda,
    ex-secretário executivo do ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes (PSB-CE). O di-
    nheiro teria sido usado para quitar dívida com a agência New Trade, do publicitário Einhart
    Jacome Paz. Depois de trabalhar para Ciro no primeiro turno de 2002, o publicitário prestou
    serviços à campanha de Lula no segundo turno. O diálogo é tenso:
    - O dinheiro foi enviado para Ciro Gomes?
    - Sim.
    - Pagou despesas de campanha de Ciro ou de Lula?
    - De Ciro.
    - Mas Ciro disse que foi serviço prestado pelo marqueteiro dele no segundo turno à
    campanha de Lula.
    - Não foi. O dinheiro pagou serviços prestados pelo Einhart à campanha de Ciro no
    segundo turno.
    - Mas Ciro não foi candidato no segundo turno. Ele apoiou a candidatura de Lula.
    - O Einhart trabalhou com o Duda Mendonça. Eles filmaram o Ciro para o programa de
    Lula no segundo turno, o dinheiro pagou despesas que o Ciro teve no segundo turno.
    - Então o dinheiro de Valério, de caixa 2, pagou despesas de campanha de Lula no
    segundo turno.
    Delúbio silencia.
    98
    19/8/2005 Em depoimento na Delegacia Seccional da Polícia Civil de Ribeirão Preto (SP),
    Rogério Buratti admite esquema irregular de financiamento da campanha de Lula em 2002,
    com dinheiro de caixa 2 de casas de bingo de São Paulo e do Rio de Janeiro. A operação
    rendeu R$ 2 milhões à campanha, o que lhe foi confidenciado por Ralf Barquete, secretário
    da Fazenda do então prefeito de Ribeirão Preto, Antonio Palocci (PT). Para lembrar: o
    prefeito Palocci virou coordenador de campanha de Lula em 2002, substituindo o prefeito
    petista Celso Daniel, de Santo André (SP), assassinado. Ralf Barquete também morreu,
    vítima de câncer.
    Rogério Buratti relata que as casas de bingo tinham interesse na regularização do jogo
    no Brasil. A Medida Provisória que regulamentava a atividade, elaborada a pedido do mi-
    nistro José Dirceu (PT-SP), foi abandonada depois de divulgada a gravação em que Waldomiro
    Diniz aparecia pedindo propina ao empresário de jogo “Carlinhos Cachoeira”. De Buratti
    aos seis promotores do Ministério Público que tomaram o depoimento:
    - Em relação à exploração dos bingos no País, tenho conhecimento de que houve duas
    contribuições em 2002 para a campanha do presidente Lula, que foram efetivadas por dois
    grupos. Um do Rio, cujo nome desconheço, outro de São Paulo. O grupo de São Paulo
    ofereceu R$ 1 milhão. Não sei o montante oferecido pelo grupo do Rio. Acredito que seja

  • 149
    em torno de R$ 1 milhão ou mais. A contribuição foi encaminhada diretamente ao comitê
    financeiro da campanha, na sede nacional do PT. O comitê era coordenado por Delúbio
    Soares, ele tinha conhecimento. O interesse dessas contribuições era a regulamentação do
    jogo de bingo no Brasil, o que não aconteceu.
    O economista César Queiroz Benjamim, fundador do PT. Em entrevista ao repórter Wil-
    son Tosta, do jornal O Estado de S. Paulo, ele afirma que tomou conhecimento de financi-
    amentos irregulares de bancos e empreiteiras ao PT, durante a campanha presidencial de 1994.
    O dinheiro beneficiava o candidato Lula, derrotado por Fernando Henrique Cardoso (PSDB-
    SP). Na época, César Queiroz Benjamin fazia parte da coordenação da campanha do PT:
    - Tentei discutir na direção nacional, não houve possibilidade, e resolvi levar ao encontro
    nacional do PT de 1995, que era o primeiro na sequência da eleição. E aí ficou claro para
    mim que já estava havendo no PT o início do esquema que agora vem à luz, inclusive com
    os mesmos personagens. Eu tive a percepção de que isso continha um perigo extraordinário,
    que era a entrada no PT, pesadamente, de esquemas de financiamento que teriam um impac-
    to grande na vida interna do partido. O Dirceu foi eleito para a presidência, esse grupo que
    agora está nas manchetes assume cargos-chave, e fica claro que o PT tinha tido uma inflexão
    para pior. A direção passava a gerenciar interesses.
    Segundo César Queiroz Benjamin, o processo de corrupção no PT talvez tenha começa-
    do antes, com esquemas de financiamento montados por Delúbio Soares. O tesoureiro petista
    representara a CUT (Central Única dos Trabalhadores, ligada ao PT) no FAT (Fundo de
    Amparo ao Trabalhador):
    - Até essa época, a Articulação, que é o grupo do Lula e do Dirceu, ainda disputava a hegemonia
    no PT, cabeça com cabeça. A minha interpretação é a de que esse grupo usou esquemas de
    financiamento heterodoxos para fortalecer a Articulação. Porque o FAT faz convênios com sin-
    dicatos. E assim fortaleceu as finanças da Articulação, que passa a manejar poder financeiro que
    é uma arma nova na luta. Passa a ter capacidade de financiar candidaturas, trazer pessoas, esta-
    belecer pontes. Delúbio se tornou figura paradigmática. Foi tesoureiro da CUT, foi para o PT
    como tesoureiro. E esse grupo começa a ser conhecido como “os operadores”.
    Para César Benjamin, Lula “dissolveu por dentro os valores da esquerda”:
    - O Lula garante que foi traído, que não sabia. Mas eu não acredito nisso. Foram práticas
    sistemáticas durante mais de dez anos, do grupo que era mais próximo dele. Parece comple-
    tamente inverossímil que ele fosse o único a não saber. Eu, que já estava fora do PT, sabia.
    Como o Lula poderia não saber?
    - O grande legado do Lula é essa disseminação do antivalor. O valor da esperteza, o valor
    de se dar bem, de não estudar, ter orgulho de não estudar... Eu diria que o Lula sempre foi um
    grande guarda-chuva para os oportunistas no PT. Uma coisa é o partido ter um líder que é
    honesto, honrado. Então, quem quer ser picareta fica meio acuado. Pode até querer ser picare-
    ta, mas não é a regra. Outra coisa é você estar num ambiente em que veio de cima o exemplo.
    Então, sob a liderança do Lula, eu diria que se formou a pior geração de militantes da esquerda
    brasileira de toda a sua história: pragmática, oportunista, individualista, carreirista.

  • 150
    99
    20/8/2005 A revista Veja obtém informações exclusivas do doleiro Antonio Oliveira
    Claramunt, o “Toninho da Barcelona”. Ele responde a uma lista de 20 perguntas do repór-
    ter Policarpo Junior. Relata o envolvimento do PT com o mundo das remessas de divisas
    para o exterior, as trocas de dólares por reais e outras transgressões. Fala de uma conta
    clandestina do PT operada pelo Trade Link Bank, uma offshore ligada ao Banco Rural,
    nas Ilhas Cayman.
    O esquema funcionava para o PT sacar dinheiro do exterior e usá-lo no Brasil. Segundo
    Toninho da Barcelona, a operação era conduzida por Dario Messer, um doleiro do Rio. O Trade
    Link remetia o dinheiro para a offshore de Dario Messer, no Panamá. Ao mesmo tempo, uma
    quantia correspondente era liberada, em reais, no Banco Rural, em Belo Horizonte. Do repórter:
    “O esquema é uma forte evidência de que os R$ 28 milhões que Valério diz ter obtido na
    forma de dois empréstimos junto ao Banco Rural sejam simplesmente recursos internados
    pelo PT a partir de sua conta clandestina no exterior.”
    Conforme a reportagem, “os cofres do PT viviam abarrotados de dólares. Em 2002, no
    auge da campanha presidencial, a casa de câmbio do doleiro Antonio Oliveira Claramunt, a
    Barcelona, chegou a fazer trocas de moeda em ritmo quase diário”. A revista implica o
    deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), há 30 anos amigo de Lula:
    “As trocas de dólares por reais, que se materializavam no gabinete do então vereador e
    hoje deputado Devanir Ribeiro, integram outro braço do esquema petista. Neste caso, o
    partido mantinha volumes consideráveis de dólares em dinheiro vivo, escondido em cofres
    ou malas ou cuecas, e acionava a casa de câmbio quando precisava convertê-los em reais.
    Em geral, quem ligava para a casa de câmbio Barcelona era o assessor legislativo da Câma-
    ra dos Vereadores, Marcos Lustosa Ribeiro – que vem a ser filho do deputado Devanir
    Ribeiro. No telefonema, Marcão, como é conhecido, perguntava a cotação de venda e infor-
    mava quanto queria trocar. No início de 2002, as trocas eram esporádicas e ocorriam a cada
    dez ou 15 dias. No meio do ano alcançaram ritmo alucinado. ‘Com a aproximação das
    eleições tornaram-se quase diárias’, lembra o doleiro.”
    O repórter entrevista Marcelo Viana, responsável pelas operações de balcão da Barcelo-
    na na época. As trocas de dólares por reais chegaram à casa dos R$ 500 mil semanais.
    Dependendo do volume, as somas eram entregues em sacolas ou envelopes, no gabinete do
    vereador Devanir Ribeiro. Diz Viana:
    - Mas também já levei dinheiro preso às meias e debaixo da roupa.
    Marcos Lustosa, o filho de Devanir, não nega. Ressalva, para livrar o pai:
    - Não era dinheiro de política, meu pai não tinha nada a ver com isso. Era dinheiro que eu
    ganhava com serviços de informática que fazia na Câmara, e trocava por dólar. Coisa pe-
    quena, para meu uso mesmo.
    O pai, convenientemente, esconde-se atrás do filho:
    - Se o Marcos trocou dinheiro com Toninho da Barcelona, o problema é dele. O Marcos
    é maior de idade, casado, vacinado e cuida da vida dele.
    Outro esquema relatado por Toninho da Barcelona funcionou em Santo André (SP),
    durante a administração do prefeito Celso Daniel (PT). Movimentou dinheiro a ponto de a
  • 101
    22/8/2005 Cai Marcos Antonio Carvalho Gomes, presidente do fundo de pensão Fundação
    Real Grandeza, dos funcionários de Furnas Centrais Elétricas e da Eletronuclear. Filiado ao
    PT, ele teria investido irregularmente R$ 151 milhões em certificados de depósitos bancári-
    os do Banco Santos. Do total aplicado, R$ 131 milhões não foram mais recuperados.
    102
    23/8/2005 Em depoimento à CPI do Mensalão, o ex-deputado Valdemar Costa Neto (SP),
    presidente do PL, dá explicações. Recebeu R$ 6,5 milhões em recursos do caixa 2 do PT,
    entre janeiro de 2003 e setembro de 2004. Pagou despesas com material de campanha do
    presidente Lula, no segundo turno das eleições de 2002. O jogo de Valdemar Costa Neto:
    - A situação em São Paulo era difícil. Lula tinha vencido José Serra no primeiro turno por
    apenas 100 mil votos. Tínhamos que entrar com força. Encomendei o material e o dinheiro
    foi gasto para pagar os fornecedores.
    Valdemar Costa Neto foi autorizado a fazer os gastos pelo tesoureiro Delúbio Soares,
    “porque ele estava cheio de dívidas e não podia mais procurar os fornecedores”. Mas Valdemar
    não tem como comprovar os dispêndios:
    - Só tenho recibos de R$ 1,7 milhão. Os outros R$ 4,8 milhões foram entregues sem
    comprovação. Estou tentando pegar alguns recibos no PT.
    Ivan Guimarães, ex-presidente do Banco Popular, depõe na CPI dos Correios. Braço do
    Banco do Brasil, o Banco Popular foi criado em 2003 para fomentar a concessão de
    microcréditos. Em 2004, Ivan Guimarães alugou apartamento de Rogério Tolentino, sócio de
    Marcos Valério. Imóvel vendido por Ângela Saragoça, ex-mulher de José Dirceu (PT-SP).
    No primeiro ano de funcionamento, o Banco Popular gastou R$ 29,7 milhões com pro-
    paganda, mais que os R$ 21,3 milhões liberados para a concessão de microcréditos. Diz
    Ivan Guimarães:
    - Os gastos de marketing são mais elevados no primeiro ano, porque é preciso construir
    a imagem da instituição.
    Em seu depoimento, ele atribui toda a responsabilidade pelas despesas e decisões so-
    bre gastos de propaganda à diretoria de Marketing do Banco do Brasil, chefiada por
    Henrique Pizzolato.

    151
    cambista Nelma Cunha ter de acionar Toninho da Barcelona por não dispor das quantias
    solicitadas. Sobre a corretora Bônus-Banval, de São Paulo:
    “Um dos esquemas mais complexos – mas igualmente clássico – do PT funcionava
    na corretora Bônus-Banval. Toninho da Barcelona conta que a corretora era usada pelo
    partido para intermediar operações fraudulentas e, assim, tornou-se uma das principais
    fontes de pagamento do mensalão. Sua especialidade eram as operações de ‘esquenta-
    esfria’, nas quais os prejuízos eram sempre dos fundos de pensão das estatais. ‘As liga-
    ções entre o PT e a Bônus são estreitas. Os sócios são amigos íntimos de José Dirceu’,
    acusa o doleiro.”

  • 172
    ter enviado ilegalmente US$ 161 milhões para os Estados Unidos. Birigui admite ter aberto
    em 1998 a conta Chanani, no Safra National Bank, em Nova York, mas a sua movimentação
    seria feita por Maluf.
    De acordo com o doleiro, a conta foi aberta a pedido de Flávio Maluf, filho do ex-
    prefeito. Pai e filho estão presos na carceragem da Polícia Federal em São Paulo há 12 dias.
    Ambos são acusados de tentar impedir o depoimento de Birigui no processo que investiga
    Maluf por corrupção passiva, lavagem de dinheiro, evasão fiscal e formação de quadrilha.
    Além da conta Chanani, Birigui denuncia a abertura de outras duas contas bancárias no
    exterior, a pedido de Flávio Maluf. Segundo o doleiro, de uma das contas foram transferidos
    US$ 5 milhões para o publicitário Duda Mendonça, responsável pela campanha derrotada
    de Paulo Maluf a governador de São Paulo, em 1998.
    Conforme o Ministério Público, Paulo Maluf e parentes dele enviaram outros US$ 446
    milhões para a Suíça. Os promotores responsáveis pela investigação das atividades do ex-
    prefeito afirmam que a origem do dinheiro estaria no desvio de verbas públicas da Prefeitu-
    ra de São Paulo, de 1993 a 1996, durante a gestão do por ora prisioneiro federal.
    Paulo Maluf, aliado do presidente Lula, ficaria preso por 41 dias.
    134
    24/9/2005 A revista Isto É publica entrevista com Soraya Garcia, assessora financeira do PT
    de Londrina (PR) nas eleições de 2004. Ela trabalhou no comitê de reeleição do prefeito
    Nedson Micheletti (PT). A reportagem de Luiz Cláudio Cunha trata do esquema de aluguéis
    de automóveis para a campanha política. Soraya Garcia denuncia 17 notas em nome da
    Yaktur, empresa de turismo de São Paulo, e da Gtech, multinacional norte-americana envol-
    vida no escândalo da renovação de um contrato de R$ 650 milhões com a Caixa Econômica
    Federal. Existe suspeita de extorsão e cobrança de propina na assinatura do contrato, crimes
    nos quais haveria a participação de dois importantes personagens da era Lula, Waldomiro
    Diniz e Rogério Buratti.
    Os automóveis foram alugados para uso de assessores da campanha de Micheletti. A
    coisa enrolou quando um deles, Rafael Silva, ex-presidente da União Londrinense de Estu-
    dantes Secundaristas, bateu o carro. Isto É relata:
    “Em 10 de novembro de 2004, a Avis ligou para Soraya, no PT, cobrando R$ 200 do
    seguro pela batida leve num pára-lamas do Celta dirigido por Rafael. ‘Eu não sabia dos
    carros, não eram pagos por mim’. Soraya, então, ligou para a Avis de Curitiba e, lá, informa-
    ram que o locador era a Yaktur. Na Yaktur, deram um número de telefone em Brasília para
    Soraya tratar do problema. Ela ligou e a voz do outro lado respondeu: ‘SMPB, bom dia!’.
    Exposto o caso, a moça explicou: ‘Meu chefe, o senhor Marcos, não está. Ele viaja muito’,
    esclareceu, sem citar o nome Marcos Valério. Mas pediu que Soraya ligasse para o gabinete
    do então deputado Paulo Bernardo na Câmara. ‘Foi com ele que fizemos o negócio. A gente
    ficou de pagar só o mês, sem cobrir batidas’.”
    Em outro caso envolvendo a campanha em Londrina, a revista aborda o depoimento do
    motorista Rogério Bicheri à Polícia Federal. Ele trabalhava para o PT na época e disse ter

  • 173
    recolhido dinheiro vivo no apartamento de Zeno Minuzo, um assessor do ex-deputado e
    ministro do Planejamento de Lula, Paulo Bernardo (PT-PR). Palavras do motorista:
    - Fui duas vezes lá, em setembro e em outubro de 2004, dirigindo o carro de Fábio Reali,
    assessor do prefeito. Estacionei e o Fábio voltou com 20 envelopes, todos com nomes de
    coordenadores e vereadores em campanha. Era coisa de uns R$ 50 mil. Ele botou dois
    envelopes no porta-luvas, e o resto debaixo do banco. Ele disse que dessa forma, se fôsse-
    mos roubados, levariam menos dinheiro.
    135
    25/9/2005 O jornal Folha de S.Paulo publica entrevista do ex-ministro e deputado José
    Dirceu (PT-SP), concedida à repórter Mônica Bergamo. Ela pergunta quem são os respon-
    sáveis pela crise política. Com a palavra, Dirceu:
    - Muita gente. Parece que eu fui presidente do PT sete anos sozinho, secretário-geral
    cinco anos sozinho, né? O PT não foi construído assim. Tem dezenas de dirigentes impor-
    tantes que hoje são prefeitos, governadores, ministros, deputados e senadores que participa-
    ram da construção de toda essa estratégia comigo.
    - E o presidente.
    - E o próprio presidente da República. É isso o que eu digo. A responsabilidade é de
    todos nós. Nós temos que debater isso, num congresso do partido, e fazer o balanço.
    - O senhor acha que o presidente da República assume a responsabilidade que tem?
    - Não quero nominar ninguém. O que eu não aceito é prejulgamento, que foi tudo errado,
    que foi tudo um fracasso, que a política de alianças do PT estava errada. Tudo foi aprovado
    democraticamente.
    José Dirceu responde se Lula participou das discussões:
    - Participou. Todos participaram. Mas eu quero discutir e avaliar. Eu não quero julgar
    ninguém porque eu não quero que me prejulguem. O que não aceito é a imagem de que eu
    fiz tudo sozinho e depois apareceu Silvio Pereira, Delúbio Soares e Marcelo Sereno, que
    são o mal. Então corta esse mal e o PT está salvo. Isso é maniqueísta. E eu não mereço isso.
    Outro trecho da entrevista:
    - As pessoas que votaram no PT a vida inteira imaginavam que votavam num par-
    tido que tinha práticas diferentes.
    - Esse é um erro e o PT vai pagar por ele. Nós vamos ter que pedir desculpas ao País. Nós
    assumimos compromissos na campanha eleitoral com partidos e repassamos recursos. Se
    fossem da arrecadação oficial do PT, não teria problema nenhum. Como foram recursos de
    empréstimos tomados num banco e foram repassados fora da prestação de contas, há uma
    ilegalidade aí que vai ser punida pela Justiça.
    O próprio deputado indaga à repórter se será julgado pela política de alianças e o progra-
    ma de governo de Lula. E ele mesmo responde:
    - Então estão julgando Lula também. Tem de saber qual é o julgamento e qual é o grau de
    responsabilidade de cada um.
    - E a responsabilidade política? As pessoas votam no Lula e ele não sabe de nada? É
    difícil acreditar que ele ignorava tudo.

  • 174
    - Não é isso. É que ele não tem responsabilidade. Eu não posso atribuir responsabilidade
    a ele no grau dele. O Lula tem responsabilidade política porque ele era líder do PT. Mas os
    graus são diferentes. Não posso atribuir a ele responsabilidade sobre o caixa 2. Aí eu não
    vou atribuir.
    - Ele não tem responsabilidade como liderança?
    - Isso é uma pergunta que tem de ser dirigida a ele. Eu não vou responder por ele.
    137
    27/9/2005 Investigações da Receita Federal apontam suspeitas sobre o enriquecimento do
    publicitário Duda Mendonça. Em 2002, ano da eleição de Lula, os bens dele totalizavam R$
    6,8 milhões. Em 2004, chegaram a R$ 13 milhões líquidos, livres de dívidas e obrigações.
    Apesar do envolvimento de Duda Mendonça no escândalo do mensalão, ele mantém as
    contas publicitárias federais da Petrobras e do Ministério da Saúde.
    O empresário Marcos Valério tinha R$ 5 milhões em 2002. Em 2004, no segundo ano
    do primeiro governo Lula, seu patrimônio chega a R$ 18,5 milhões. A movimentação
    financeira do empresário também impressiona. Passaram R$ 13 milhões por suas contas
    bancárias em 2003.
    A Receita Federal vê indícios de sonegação de impostos de sete envolvidos no escânda-
    lo. São os deputados Romeu Queiroz (PTB-MG), Josias Gomes (PT-BA), Paulo Rocha (PT-
    PA), José Janene (PP-PR), Vadão Gomes (PP-SP) e os ex-deputados Valdemar Costa Neto
    (PL-SP) e Carlos Rodrigues (PL-RJ).
    Romeu Queiroz declarou renda de R$ 420 mil em 2004, mas movimentou como pessoa
    física R$ 4,3 milhões, mais de dez vezes os rendimentos informados ao fisco. Josias Gomes
    declarou renda de R$ 33 mil em 2002. Depois que Lula se tornou presidente, passaram R$ 697
    mil pelas contas do deputado em 2003, e R$ 678 mil em 2004. Em dois anos, 20 vezes mais.
    Valdemar Costa Neto declarou renda de R$ 293 mil em 2002, mas movimentou R$ 827
    mil. Carlos Rodrigues informou rendimento de R$ 446 mil, enquanto sua movimentação fi-
    nanceira chegou a R$ 1,8 milhão. A renda de João Paulo Cunha (PT-SP) e da mulher, Márcia
    Milanésio Cunha, subiu dos R$ 489 mil, declarados em 2002, para R$ 841 mil em 2004.
    A Receita Federal descobriu mais: o deputado Paulo Fernando dos Santos (AL), presi-
    dente do diretório do PT de Alagoas, declarou renda de R$ 80 mil em 2004, mas movimen-
    tou R$ 1,3 milhão. O deputado Professor Luizinho (PT-SP) teve acréscimo patrimonial
    líquido de R$ 477 mil entre 2003 e 2004.
    O deputado José Janene (PP-PR), estrela do escândalo do mensalão, declarou renda de
    R$ 565 mil em 2004. A movimentação financeira dele foi de R$ 1 milhão. O deputado
    Vadão Gomes (PP-SP), outro envolvido no escândalo, declarou renda de R$ 1,2 milhão em
    2004. A Receita Federal apurou movimentação de R$ 2,8 milhões. E Jacinto Lamas, tesou-
    reiro do PL, declarou R$ 495 mil em 2004. Movimentou R$ 1,9 milhão.
    Ligações perigosas. O Jornal Nacional, da TV Globo, noticia as andanças do empresário
    Arthur Wascheck, tido como o mandante da gravação na qual o alto funcionário dos Correi-
    os, Maurício Marinho, aparece recebendo propina de R$ 3 mil. Arthur Wascheck teria feito

  • 200
    Em outro trecho, o relatório afirma que os recursos financeiros serviram para pagar
    “despesas de campanha presidencial, de governadores de Estado, de deputados federal e
    estadual, nas eleições de 2002, e de prefeito municipal em 2004”. Não cita culpados:
    “Não é possível relacionar os parlamentares que perceberam vantagens financeiras ilíci-
    tas, em virtude da ausência de provas concretas.”
    O nome de Paulo Abi-Ackel, filho do deputado, aparece na lista de beneficiários do
    caixa 2, com pagamento de R$ 50 mil. O deputado Abi-Ackel também teria recebido doa-
    ção de R$ 100 mil de Marcos Valério, na campanha eleitoral de 1998. A indicação de Abi-
    Ackel para a relatoria da CPI teria sido acertada entre os deputados José Dirceu (PT-SP) e
    José Janene (PP-PR).
    O TCU (Tribunal de Contas da União) aprova relatórios de auditoria que apontam frau-
    des e serviços não-executados em contratos de publicidade com o Banco do Brasil, Correi-
    os e Ministério da Cultura. Prejuízo estimado: R$ 8,3 milhões. Os técnicos do TCU consi-
    deram que documentos em poder do governo não atestam o cumprimento dos contratos.
    Houve irregularidades em subcontratações de gráficas e produtoras de vídeo, feitas pelas
    agências, além de propostas e assinaturas forjadas.
    Os maiores prejuízos foram encontrados nos contratos da DNA com o Banco do Brasil, sob
    responsabilidade de Henrique Pizzolato, o diretor de Marketing da estatal. O Banco do Brasil
    teria sido omisso e negligente. A DNA ficou indevidamente com R$ 4,2 milhões, dinheiro de
    bonificações que deveria ser repassado ao cliente, ou seja, voltar para o Banco do Brasil.
    No Ministério da Cultura, os prejuízos do Governo Federal, da ordem de R$ 2 milhões,
    tiveram origem no contrato com a agência McCann Erickson. Entre as irregularidades, o
    TCU aponta que empresas participantes de licitações combinaram preços, antecipadamente.
    Depoimento ao Conselho de Ética da Câmara. O deputado Wanderval Santos (PL-
    SP) acusa o ex-deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ) por saque de R$ 150 mil. A retirada
    do dinheiro do valerioduto foi feita pelo motorista de Wanderval Santos, Célio Siqueira,
    no Banco Rural. Carlos Rodrigues renunciou ao mandato, após a acusação de participar
    do esquema.
    De acordo com Wanderval Santos, parlamentares ligados à Igreja Universal do Reino de
    Deus eram submissos a Carlos Rodrigues. Ele costumava se servir dos funcionários dos
    deputados, como no caso do motorista Célio Siqueira. Ele teria recebido ordem para se
    deslocar até a agência do Brasília Shopping, pegar um envelope e levá-lo à casa de Rodrigues.
    Diz Wanderval:
    - Eu não podia punir o Célio, porque ele cumpriu uma ordem. Ele era usado para fazer
    compras, levar filho na faculdade, pegar pessoas no aeroporto, sem que precisasse da
    minha autorização.
    189
    18/11/2005 Operações suspeitas indicam que a Caixa Econômica Federal favoreceu o BMG,
    um dos bancos envolvidos no escândalo do mensalão. O BMG, suposto credor de R$ 29,2

  • 201
    milhões que teriam sido emprestados ao PT e usados no caixa 2 do partido, teve lucro de R$
    210 milhões ao vender à Caixa Econômica Federal R$ 1,1 bilhão de sua carteira de emprés-
    timos a aposentados e pensionistas do INSS (Instituto Nacional de Seguro Social).
    Se tivesse feito diretamente as operações de empréstimo, a Caixa poderia ter lucrado R$
    696 milhões. Em decorrência das operações com o BMG, os lucros do banco público fica-
    ram restritos a R$ 346 milhões e, mesmo assim, dinheiro que entraria ao longo de três anos.
    Do senador Álvaro Dias (PSDB-PR):
    - Se a Caixa deixou de ganhar, alguém ganhou no lugar dela.
    Dos R$ 210 milhões de lucro do BMG, R$ 159 milhões correspondem à remuneração
    pela captação de clientes, um ágio integralmente quitado. Além disso, o banco privado
    mineiro teve lucro extra de R$ 51 milhões, obtido graças à fórmula usada para calcular o
    saldo devedor dos contratos. Declaração do senador Álvaro Dias:
    - Temos razões de sobra para supor que essas operações tenham sido instrumento para
    calçar os tais empréstimos, que sempre reputamos fictícios, operações meramente contábeis.
    De acordo com a repórter Marta Salomon, do jornal Folha de S.Paulo, o presidente da
    Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, assinou resoluções com vantagens ao BMG. Es-
    creve a jornalista:
    “A cronologia das negociações entre BMG e Caixa revela um negócio fechado às pres-
    sas. Entre a proposta formal do banco mineiro e a resolução do Conselho Diretor da Caixa,
    que autorizou a primeira compra de créditos referentes a empréstimos concedidos a aposen-
    tados e pensionistas, passaram-se apenas 23 dias.”
    Mais: “A cronologia das operações revela um detalhe estranho: a venda de parte da
    carteira de empréstimos é concretizada apenas três meses depois de o BMG ser autorizado
    por Medida Provisória a operar o crédito a aposentados e pensionistas do INSS com descon-
    to em folha, em setembro de 2004”.
    192
    21/11/2005 Em depoimento ao Conselho de Ética da Câmara, o deputado Roberto Brant
    (PFL-MG) admite ter recebido R$ 102 mil da agência SMPB, de Marcos Valério. Afirma
    que o dinheiro foi doação da empresa siderúrgica Usiminas. A quantia teria quitado despe-
    sas do programa de televisão de sua campanha a prefeito de Belo Horizonte, em 2004.
    193
    22/11/2005 Em depoimento à CPI dos Bingos, Paulo Okamotto, presidente do Sebrae (Ser-
    viço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), responsabiliza o ex-tesoureiro
    Delúbio Soares por tê-lo orientado a pagar em dinheiro vivo a dívida do presidente Lula
    junto ao PT, de R$ 29.436,26.
    Segundo Paulo Okamotto, o dinheiro foi usado por Marisa Letícia, mulher de Lula,
    durante viagem à China. Também serviu para acertar gastos de Lula com viagens a Cuba e
    a Europa, despesas médicas e um empréstimo de R$ 5 mil. O valor corresponde à remune-
    ração mensal de Paulo Okamotto, de “pouco mais de R$ 30 mil”, conforme declaração dele

  • 202
    à CPI. Além do salário do Sebrae, Paulo Okamotto recebe como integrante do conselho da
    Brasil-Prev e é aposentado como metalúrgico. Diz Paulo Okamotto:
    - Não sou um homem de posses.
    Para o senador Jefferson Péres (PDT-AM), o episódio mostra promiscuidade entre
    público e privado:
    - Okamotto fez um favorzão ao presidente e recebe em troca um cargo dos mais cobiçados.
    Indiciados pela Polícia Federal David Stival, ex-presidente do PT do Rio Grande do Sul,
    Marcelino Pies, ex-tesoureiro do partido em Porto Alegre, e Marcos Trindade, militante
    petista. Todos são acusados de transferir R$ 1,05 milhão de Marcos Valério para o PT, em
    2003. O dinheiro do valerioduto não foi contabilizado pelo partido. No total, o PT gaúcho
    sacou R$ 1,2 milhão da conta bancária da agência SMPB, sendo que R$ 150 mil teriam
    acertado despesas gráficas do Diretório Nacional do PT.
    Depoimentos ao Conselho de Ética da Câmara. O presidente do PP, deputado Pedro
    Corrêa (PE), e o assessor da liderança do partido, José Cláudio Genu, admitem formalmente
    o recebimento de R$ 700 mil do valerioduto. O dinheiro pagou honorários do advogado do
    ex-deputado Ronivon Santiago (PP-AC). Eles negam que houve compra de deputados. Ex-
    plicam que a soma não foi contabilizada porque ficaram aguardando o PT formalizar os
    “auxílios financeiros negociados com o Partido Progressista”.
    194
    23/11/2005 Em depoimento à CPI dos Bingos, Rosângela Gabrilli, proprietária da empresa
    de ônibus Expresso Guarará, afirma que Lula recebeu informação, em 2003, sobre esquema
    de extorsão montado pelo PT em Santo André (SP). As operações irregulares teriam conti-
    nuado após a morte do prefeito Celso Daniel (PT), em 2002. O relato da situação foi feito ao
    presidente da República pela irmã de Rosângela, Mara Gabrilli, num encontro de 20 minu-
    tos no apartamento de Lula, em São Bernardo do Campo (SP).
    De acordo com Rosângela Gabrilli, donos de empresas de ônibus em Santo André eram
    obrigados a contribuir para o caixa do PT desde 1997, no início da segunda gestão de Celso
    Daniel. Cabia ao Expresso Guarará o repasse de R$ 40 mil mensais. O dinheiro tinha de ser
    entregue em espécie, mas em determinado período ocorreram depósitos diretamente na
    conta bancária de Sérgio Gomes da Silva, o “Sombra”, no Banespa.
    Rosângela Gabrilli diz que Sérgio Gomes da Silva era o arrecadador do dinheiro, en-
    quanto o empresário Ronan Maria Pinto cumpria o papel de “interlocutor junto aos empre-
    sários”. Ela também relaciona Klinger Luiz de Oliveira (PT), ex-vereador e ex-secretário de
    Serviços Municipais de Celso Daniel, apontado como o líder do esquema.
    - Os achaques eram feitos com intimidação e ameaça. Diziam que o Klinger tinha sem-
    pre um revólver preso na canela. Isso constrangia muito. E ele lembrava a cada momento:
    “Com o poder não se brinca, o poder tudo pode”.
    Em entrevista à repórter Mariana Caetano, de O Estado de S. Paulo, Mara Gabrilli diz
    que aguardou por 32 meses manifestação de Lula sobre as denúncias feitas por ela no en-
    contro com ele em São Bernardo do Campo. O Palácio do Planalto não se pronuncia sobre

    • 251
      - O Vladimir, o doutor Rogério, o doutor Ralf, sim.
      - Por que o senhor decidiu contar tudo isso agora?
      - É porque o Francisco depôs na CPI e citou a mim e minha mulher. Fiquei meio com
      medo e resolvi falar logo.
      A entrevista de Francenildo Santos Costa repercute. Ao tomar conhecimento do teor das
      declarações do caseiro, antes mesmo da publicação da entrevista, Antonio Palocci apressa-
      se a informar, por meio de sua assessoria, que reiterava o que dissera à CPI dos Bingos:
      “Nunca foi à casa do Lago Sul e, portanto, não tem qualquer relação com as atividades
      realizadas na mesma”.
      Publicada a entrevista, Antonio Palocci aproveita a participação numa teleconferência
      para tratar de desmentir o caseiro. Diz o ministro:
      - Quero até ressaltar que eu não guio aqui em Brasília. Uso carro oficial ou ando com a
      minha esposa.
      Em mais uma nota, a assessoria do ministro da Fazenda volta à carga:
      “O ministro Antonio Palocci continua afirmando o que disse à CPI dos Bingos. Ele não
      foi àquela casa no Lago Sul e não tem conhecimento de qualquer atividade que acontecia na
      casa. E mais: o ministro não sabe dirigir em Brasília.”
      O Conselho de Ética da Câmara aprova, por 9 votos a 5, pedido de cassação do ex-
      presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP). Em seu parecer, o relator
      do caso, deputado Cezar Schirmer (PMDB-RS), acusa Cunha de mentir sobre o saque de R$
      50 mil feito por sua mulher. Cunha disse que ela foi ao banco tratar do pagamento de uma
      conta de TV a cabo, mas a mulher sacou dinheiro do caixa 2 do PT. Entre as denúncias,
      Cunha é acusado de favorecer Marcos Valério ao conduzir licitação irregular para contratar
      a agência SMPB, de Valério, para administrar conta de publicidade da Câmara.
      Para o relator, a contratação da SMPB tem “conflito de interesse”, pois Cunha já contra-
      tara Valério anteriormente, para a campanha à presidência da Câmara. Além disso, Cunha
      admitiu que Valério lhe dera uma caneta Mont Blanc. O empresário pagou passagens aéreas
      para uma assessora de Cunha.
      Cezar Schirmer vincula a conquista da conta de publicidade da Câmara ao saque de
      R$ 50 mil efetuado na agência do Banco Rural do Brasília Shopping, apenas um dia
      após Cunha receber Valério para café da manhã na residência oficial. O relator também
      viu irregularidades em notas fiscais com números sequenciais. Elas foram apresentadas
      por Cunha, para tentar justificar os R$ 50 mil sacados pela mulher. O dinheiro pagaria
      pesquisas eleitorais.
      Novas informações sobre as contas bancárias do publicitário Duda Mendonça no exte-
      rior. Documentos enviados por autoridades norte-americanas à CPI dos Correios revelam
      a existência de mais seis contas secretas. De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo,
      foi identificada a Stuttgart Company, empresa de Duda Mendonça fora do Brasil. No
      total, são dez as contas no exterior. Das seis novas, a metade foi aberta no BankBoston da

    • 252
      Flórida, em nome da Stuttgart Company, de Rita de Cássia Santos Moraes, ex-mulher de
      Duda Mendonça, e de Eduardo de Matos Freiha, sócio do publicitário. As outras três perten-
      cem à Dusseldorf. Uma delas, no BAC Florida Bank, recebeu US$ 1,1 milhão. Doleiros
      teriam depositado o dinheiro.
      306
      15/3/2006 Francenildo Santos Costa concede entrevista coletiva. Diz que o ministro Anto-
      nio Palocci (PT-SP) esteve várias vezes na “casa dos prazeres”, entre 2003 e 2004. Segundo
      o caseiro, Antonio Palocci costumava ir à mansão “quinta-feira sim, quinta-feira não”, além
      de alguns sábados e domingos.
      Francenildo Santos Costa conta que havia sempre uma mulher nas noites de quinta em
      que Antonio Palocci esteve na “casa dos prazeres”. Normalmente Vladimir Poleto ou
      Ademirson Ariosvaldo da Silva, secretário particular do ministro, a traziam. Ademirson
      Ariosvaldo da Silva vinha com um carro Santana preto, com placas de Ribeirão Preto (SP).
      O caseiro relata que Palocci chegava às 18 ou 19 horas, sempre guiando o Peugeot de
      Ralf Barquete, e ia embora às 20h30, outras vezes às 22 horas, “não tinha hora certa”. Ele
      afirma, contudo, que Palocci não participava de festas promovidas pelo grupo de pessoas de
      Ribeirão Preto, sempre com três ou quatro garotas, às terças-feiras. Deputados do PT, uns
      “cinco ou seis” de acordo com o caseiro, também estiveram nas festas. Palavras do caseiro:
      - Entrei numa barca furada. Pensava que eram pessoas honestas, e não eram. No final era
      essa sujeira que está aí. Pessoas que fazem esse tipo de coisa não deveriam estar num cargo
      lá em cima.
      Francenildo Santos Costa recorda que algumas garotas, certa vez, teriam consumido drogas,
      o que revoltou Vladimir Poleto. Ele telefonou para alguém e disse que não queria mais aquelas
      mulheres na casa. O caseiro fala sobre a noite em que conversou com Palocci pelo interfone:
      - Eu estava fechando a casa quando tocou o telefone. Ele disse: “Estou perdido aqui e tô
      querendo sair”. Abri o portão dos fundos e ele foi embora.
      A Câmara dos Deputados cassa o mandato do presidente do PP, deputado Pedro Corrêa
      (PE), por 261 votos contra 166. Apenas quatro votos a mais do que o mínimo de 257 neces-
      sários para a perda do cargo. Em compensação, os votos secretos absolvem o ex-líder do PP,
      deputado Pedro Henry (MT). Ambos foram acusados de envolvimento no escândalo do
      mensalão. Votam pela absolvição 255 deputados, contra 176 que pedem a condenação.
      A principal acusação contra Pedro Henry veio de Roberto Jefferson (PTB-RJ). Ele disse
      que o pepista tentou cooptar dois deputados do PTB, oferecendo-lhes as vantagens do
      mensalão. O PP foi contemplado com R$ 4,1 milhões do caixa 2 do PT, conforme informa-
      ções de Marcos Valério, mas só admitiu ter posto as mãos em R$ 700 mil. Trecho do relató-
      rio do deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), que apreciou o caso de Pedro Corrêa:
      “O PP disse que o dinheiro foi utilizado para pagar o advogado para Ronivon Santiago.
      Era dinheiro repassado pelo PT. No Acre, o PT movia ações contra Ronivon, mas aqui, no
      plano federal, o PT fornecia recursos para defender Ronivon; lá, o PT apontava fraudes
      contra Ronivon, mas aqui oferecia subsídios para o deputado.”
      • 301
        Soares. Além disso, como já relatado, uma das antecipações serviu para abater um dos
        empréstimos do BMG que suportaram a engenharia ora denunciada”.
        O relatório esmiúça irregularidades descobertas no contrato de R$ 12,8 milhões entre a
        SMPB e o Ministério dos Esportes, e no contrato da DNA com a Eletronorte, no total de R$
        42,2 milhões. Entre os expedientes suspeitos, recebimento de comissões sem a correspon-
        dente prestação de serviços, sobrepreços na aquisição de bens, simulação de cotação nos
        preços de serviços subcontratados, pagamento por serviços não-realizados e apresentação
        de propostas fraudulentas, para justificar a subcontratação de serviços.
        O próximo capítulo tem o título de “Lavagem de dinheiro”. O procurador-geral da Repú-
        blica acusa a existência de um “sofisticado mecanismo de branqueamento de capitais”,
        implementado pelo núcleo de Valério:
        “A sistemática criada pelos dirigentes do Banco Rural, aprimorada a partir do início de
        2003, possibilitou a transferência, em espécie, de grandes somas em dinheiro com a ocultação
        e dissimulação da natureza, origem, movimentação e destino final.”
        Cabia a Delúbio dizer a Valério quem receberia e qual valor a ser entregue:
        “A estrutura articulada pelos dirigentes do Banco Rural possibilitou que o grupo de
        Marcos Valério, notadamente Simone Vasconcelos e Geyza Dias, comunicasse ao gerente
        da conta da SMPB ou DNA no Banco Rural de Belo Horizonte, agência Assembléia, a
        operação que seria desencadeada, ou seja, pagamento de determinada quantia, nas praças de
        Belo Horizonte, Brasília, São Paulo ou Rio de Janeiro, qualificando a pessoa que efetuaria
        o recebimento e transporte, em malas ou sacolas, dos recursos financeiros.”
        O procurador-geral anotou o comportamento do funcionário do Banco Rural: “Nos dois
        anos dos intensos saques, o tesoureiro José Francisco destacou que nenhum recebedor fazia
        conferência do numerário, limitando-se a acondicionar os vultosos recursos em uma mala,
        bolsa ou sacola que levavam para tal finalidade ou lhes eram entregues pela própria Simone
        Vasconcelos. Por seu turno, Simone Vasconcelos, conforme declarado na fase inquisitorial,
        limitava-se a entregar o numerário à pessoa identificada para o seu recebimento, sem confe-
        rir sequer a identidade”.
        Do inquérito: “O Banco Rural, embora tivesse conhecimento dos verdadeiros sacadores/
        beneficiários dos recursos sacados na ‘boca do caixa’, registrou no Sistema do Banco Cen-
        tral (Sisbacen – opção PCAF 500, que registra operações e situações com indícios de crime
        de lavagem de dinheiro) que os saques foram efetuados pela SMPB Comunicação e que se
        destinavam a pagamento de fornecedores”.
        A denúncia apresentou “situações de pagamentos, pelo esquema de lavagem”, envol-
        vendo João Cláudio Genu, assessor do PP, o deputado Josias Gomes (PT-BA) e ainda Jacin-
        to Lamas, ex-tesoureiro do PL, e José Luiz Alves, assessor do ex-ministro dos Transportes,
        Anderson Adauto (PL-MG).
        De acordo com o procurador-geral, as agremiações políticas corrompidas, pagas com
        vultosas quantias, “chegaram a estruturar quadrilhas autônomas para viabilizar o cometi-
        mento dos crimes de corrupção passiva e lavagem de capitais, consistentes no recebimento
        direto ou disfarçado dos pagamentos de propina em troca de integrarem a base de apoio do
        Governo Federal”.
      • 302
        O inquérito prossegue: “Além dos pagamentos que foram comprovados pelos documen-
        tos obtidos em razão do cumprimento de medida de busca e apreensão no Banco Rural, é
        preciso registrar que vários repasses foram efetuados diretamente por Marcos Valério e
        Simone Vasconcelos sem qualquer registro formal, ainda que rudimentar”.
        Em relação ao PP, a acusação relaciona os deputados José Janene (PR), Pedro Corrêa
        (PE), Pedro Henry (MT) e o assessor João Cláudio Genu. Todos denunciados pelo “recebi-
        mento de vantagem indevida” de R$ 4,1 milhões, num acordo que implicava apoio do par-
        tido ao Governo Federal. A denúncia:
        “Após formalizado o acordo criminoso com o PT (José Dirceu, Delúbio Soares, José
        Genoino e Silvio Pereira), os pagamentos começaram a ser efetuados pelo núcleo publicitá-
        rio-financeiro. Os recebimentos, por sua vez, eram concretizados com o emprego de opera-
        ções de lavagem de dinheiro para dissimular os reais destinatários dos valores que serviram
        como pagamento de propina.”
        No primeiro momento, os denunciados decidiram receber por meio de um intermediário, o
        assessor João Cláudio Genu. Os saques eram efetuados por Simone Vasconcelos no Banco
        Rural e repassados a Genu, em malas ou sacolas, dentro da agência do Brasília Shopping, em
        quarto do hotel Grand Bittar, em Brasília, ou na própria sede da SMPB na capital federal.
        Depois, com a finalidade de “sofisticar as manobras de encobrimento da origem e natureza
        dos expressivos montantes auferidos pela quadrilha”, foram utilizadas as empresas Bônus-
        Banval, de Enivaldo Quadrado e Breno Fischberg, e Natimar, de Carlos Alberto Quaglia.
        No PL, os denunciados são o ex-deputado Valdemar Costa Neto (SP), os irmãos Jacinto
        e Antonio Lamas, Lúcio Funaro e José Carlos Batista. Os três primeiros receberam, em
        2003 e 2004, cerca de R$ 10,8 milhões em propina.
        A denúncia: “O acordo criminoso com os denunciados José Dirceu, Delúbio Soares,
        José Genoino e Silvio Pereira foi acertado na época da campanha eleitoral para a Presidên-
        cia da República em 2002, quando o PL participou da chapa vencedora”.
        Para dissimular os destinatários, operações de lavagem de dinheiro: “De fato, consciente
        de que os montantes eram oriundos de organização criminosa voltada para o cometimento de
        crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro nacional, os denunciados
        articularam mecanismo para dissimular a origem, natureza e destino dos valores auferidos”.
        Os repasses foram intermediados pela Guaranhuns Empreendimentos, de Lúcio
        Funaro e José Carlos Batista. Não obstante, “a obtenção dos recursos em espécie tam-
        bém era empreendida por Valdemar Costa Neto, que costumava receber altas quantias
        em sua própria residência”.
        O procurador-geral acrescentou: “Logo após, junho de 2003, iniciou-se a sistemática de
        repasse de dinheiro pelo mecanismo de lavagem disponibilizado pelo Banco Rural, através
        do recebimento, em espécie, por Jacinto ou Antonio Lamas, na agência do Banco Rural em
        Brasília; no hotel Kubitschek, em Brasília; no hotel Mercure, em Brasília; e na filial da
        empresa SMPB, também localizada em Brasília”.
        Em âmbito do PTB, a propina em troca de apoio político foi recebida pelo ex-presidente
        José Carlos Martinez, falecido, Roberto Jefferson e o deputado Romeu Queiroz (MG), com
        a ajuda de Emerson Palmieri. A acusação:
      • 303
        “Os denunciados, cientes de que os montantes recebidos tinham como origem organiza-
        ção criminosa dedicada ao cometimento dos crimes contra a administração pública e contra
        o sistema financeiro nacional, engendraram mecanismo para dissimular a origem, natureza
        e destino dos valores auferidos.” (...)
        “Em dezembro de 2003, Roberto Jefferson manteve contato com Romeu Queiroz, secre-
        tário do PTB, para que este retomasse os mecanismos estruturados durante a gestão de José
        Carlos Martinez para a obtenção de recursos financeiros. Romeu Queiroz procurou o então
        ministro Anderson Adauto, o qual manteve entendimentos com Delúbio Soares, que se
        prontificou a retomar as transferências através da empresa SMPB, o que de fato ocorreu,
        nos termos abaixo narrados.” (...)
        “Assim, em janeiro de 2004, José Hertz, coordenador do PTB em Belo Horizonte, rece-
        beu um telefonema de Emerson Palmieri que o orientou a buscar um envelope a ser entre-
        gue por Simone Vasconcelos. Primeiramente, José Hertz pegou um envelope com dinheiro
        na agência do Banco do Brasil em Belo Horizonte e, depois, recebeu outro envelope conten-
        do dinheiro na agência do Banco Rural em Belo Horizonte.”
        “José Hertz deslocou-se até Brasília e entregou ambos os envelopes contendo dinheiro a
        Emerson Palmieri na data de 5/1/2004, ocasião em que Emerson Palmieri ligou para Roberto
        Jefferson informando o seguinte: ‘assunto resolvido’.”
        Outro enrosco: o “núcleo central da quadrilha” acertou um repasse de R$ 20 milhões ao
        PTB, mas só teria providenciado a entrega de R$ 4 milhões, em duas parcelas. O caso já foi
        relatado em detalhes.
        Sobre o PMDB: o ex-deputado José Borba (PR), líder do partido na Câmara, “integrou o
        esquema de corrupção em troca de apoio político”. E recebeu, segundo admitiu Valério, R$
        2,1 milhões. A denúncia:
        “Ciente da origem ilícita dos recursos (organização criminosa voltada para a prática de
        crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro nacional), bem como
        dos mecanismos de lavagem empregados para a transferência dos valores, José Borba atuou
        para não receber diretamente o dinheiro, de forma a não deixar qualquer rastro de sua parti-
        cipação no esquema”. O relatório ressalva:
        “No entanto, ficou comprovado o pagamento de uma das parcelas disponibilizadas pelo
        grupo de Marcos Valério, no valor de R$ 200 mil ao ex-deputado federal José Borba, que
        recebeu esse dinheiro das mãos de Simone Vasconcelos. Nessa ocasião, o próprio José
        Borba compareceu na agência do Banco Rural em Brasília e procurou o então tesoureiro do
        Banco Rural em Brasília João Francisco de Almeida para a entrega do dinheiro, o que foi
        confirmado por Simone Vasconcelos.”
        “Todavia, José Borba recusou-se a assinar qualquer documento que comprovasse o rece-
        bimento da importância acima, fazendo com que Simone Vasconcelos se deslocasse até
        essa agência, retirasse, mediante a sua própria assinatura, a quantia acima informada, e
        efetuasse a entrega desse numerário ao então parlamentar.”
        O relatório dedica capítulo à “Lavagem de dinheiro (Partido dos Trabalhadores e o ex-
        ministro dos Transportes)”. A denúncia:
  • 357
    veio de emenda apresentada por Renan ao Orçamento da União. A KSI era controlada por
    um aliado de Renan, de nome José Albino Gonçalves de Freitas. A obra foi contratada pelo
    prefeito de Murici, Renanzinho.
    Sem sede própria, a “empresa” teria faturado R$ 1 milhão dos cofres federais, graças a
    convênios com várias prefeituras do interior de Alagoas. O tal José Albino, que trabalhou
    como assessor de Renan, chegou a operar uma segunda empresa de fachada em Alagoas, de
    nome Caiçara Construções. Renan também beneficiou a Caiçara. Conseguiu dinheiro para
    obras na Prefeitura de Flexeiras (AL), cidade vizinha de Murici, por meio de emendas ao
    Orçamento. Na época, Flexeiras era governada por uma prima do senador.
    Havia suspeitas, ainda, sobre outras três empresas. Desde 2004, segundo ano do governo
    Lula, elas faturaram juntas R$ 46 milhões em verbas federais. As empresas Lacerda Engenharia,
    Maris Construções e Materiais e Cicla Construções e Representações de Materiais atuavam no
    interior de Alagoas, em prefeituras que celebravam contratos graças a emendas de Renan.
    A Operação Carranca, da Polícia Federal, prenderia os empresários ligados a essas e
    outras empresas que agiam em Alagoas, inclusive na cidade de Murici, todos acusados de
    fraudar licitações públicas com recursos federais entre 2004 e 2007. O prejuízo apurado
    pelos federais alcançava R$ 20 milhões. As empresas simulavam que disputavam as licita-
    ções, mas eram coirmãs ou fantasmas, montadas para fraudar contratos com o governo.
    Do procurador Rodrigo Tenório, do Ministério Público de Arapiraca (AL), que partici-
    pou das investigações: “Eles tinham um contrato para pavimentar 300 metros de asfalto e
    faziam 200. Tinham de fazer casas com muros separados e faziam geminadas”.
    Supostamente alheio à nova denúncia envolvendo Renan, o presidente interino do Sena-
    do, Tião Viana (PT-AC), articulou a rejeição das representações contra o senador alagoano.
    Para agradar a oposição, tratou também da rejeição de uma representação contra o senador
    Eduardo Azeredo (PSDB-MG), envolvido no caso do mensalão mineiro.
    O objetivo de Lula era salvar a pele de Renan, evitando a cassação do aliado que ficaria
    sem mandato por 10 anos, mas desde que Renan renunciasse de vez à presidência do Sena-
    do e pusesse um ponto final à crise. Não importava a quebra do decoro parlamentar. Nunca
    importou. De sobra, o “acordão” facilitaria a aprovação da emenda constitucional que pror-
    rogaria a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). A prorrogação
    até o ano de 2011 da CPMF, conhecida como imposto do cheque, possibilitaria uma arreca-
    dação de R$ 40 bilhões por ano e era estratégica para o governo.
    Havia um problema pela frente: o processo da compra em nome de laranjas de duas
    emissoras de rádio e um jornal em Alagoas, por Renan Calheiros e o seu aliado na época, o
    usineiro e ex-deputado João Lyra, que confessou tudo. O caso vinha sendo relatado pelo
    combativo senador Jefferson Péres (PDT-AM), que seguramente não aliviaria para Renan.
    A parceria oculta de R$ 2,5 milhões entre Renan e Lyra foi confirmada pelo contador
    José Amilton Barbosa. Para constar: a Constituição e o Regimento do Senado proíbem
    parlamentares de dirigirem ou serem proprietários de empresas de comunicação. Desfeita a
    sociedade da dupla Renan/Lyra, uma das rádios acabou em nome de Renanzinho.
    João Lyra, que virou inimigo de Renan Calheiros, pôs mais lenha na fogueira. Denun-
    ciou um pagamento de R$ 500 mil que disse ter feito ao então presidente do Senado. O
  • 358
    “pedágio” teria sido cobrança de Renan para facilitar a regularização, no Senado, de con-
    cessão de operação da rádio que ficara com Lyra depois de desfeita a sociedade. A propina
    teria sido paga a Tito Uchoa.
    O relatório de Jefferson Péres pedindo a cassação de Renan Calheiros foi aprovado em
    14 de novembro de 2007 pelo Conselho de Ética do Senado, por 11 votos a 3. Mas,
    lembre-se: aqui, o voto foi aberto. A perda do mandato só é decidida em plenário, pelo
    conjunto dos senadores, em votação secreta. E para evitar isso Lula se mexeu, naquele
    mesmo dia 14 de novembro, sacramentando no Palácio do Planalto uma articulação que
    absolveria o aliado. Da série de reuniões para discutir a estratégia governista participa-
    ram, além do próprio Renan, o presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC), o
    ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia (PTB-MG), e o senador
    Edison Lobão (PMDB-MA), aliado de José Sarney (PMDB-AP), que seria nomeado por
    Lula ministro de Minas e Energia.
    Na véspera da votação secreta, Tião Viana pediu que os senadores não abrissem o voto.
    “Pelo regimento, se configura quebra de decoro”, ameaçou o petista. Seguindo o script
    acertado com Lula, Renan renunciou à presidência do Senado em 4 de dezembro de 2007.
    Na mesma sessão secreta, ele acabaria absolvido no processo das compras das rádios e do
    jornal, por 48 votos a 29. Houve três abstenções. Só 29 senadores, portanto, votaram a favor
    da cassação. Eram necessários 41 votos para Renan perder o mandato.
    Na saída do Senado, Renan declarou: “Saio de alma lavada”. Seguiu para a casa do
    senador José Sarney, tida como o centro do poder do PMDB. Durante a comemoração
    com próceres do partido, sonoras gargalhadas foram ouvidas do lado de fora da resi-
    dência. Dando prosseguimento ao acordão, no dia seguinte o presidente do Conselho de
    Ética do Senado, Leomar Quintanilha (PMDB-MS), mandou arquivar todas as outras
    denúncias contra Renan.
    Renan preservou o mandato de senador. Em pouco tempo voltaria a ser poderoso, após a
    eleição de José Sarney para a presidência do Senado. Foi recompensado por Sarney com a
    liderança do PMDB. A história vem depois.
  • 359
    Sob a conveniência da ‘segurança nacional’,
    Lula não revelou gastos com cartão corporativo
    As despesas do governo Lula com cartões corporativos se transformaram numa caixa
    preta. Só a Presidência da República teria efetuado gastos secretos superiores a R$ 20 mi-
    lhões entre 2004 e 2007. Na esteira das investigações conduzidas pelo Congresso Nacional,
    Lula se viu obrigado a afastar a sua ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro (PT-SP),
    que não teve como justificar as despesas com o chamado dinheiro de plástico.
    Para evitar a quebra de sigilo dos cartões corporativos e amansar deputados e senadores
    oposicionistas, o Palácio do Planalto urdiu a elaboração de um dossiê com gastos do ex-
    presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP) e da ex-primeira dama, Ruth Cardoso.
    Os dados foram preparados e divulgados pelo Ministério da Casa Civil, sob o controle de
    Dilma Rousseff (PT-RS).
    A responsável pela formatação da documentação foi apontada como sendo Maria de la
    Soledad Castrilho, a “Marisol”, que ocupava os cargos de diretora de Recursos Logísticos e
    chefe de gabinete de Erenice Guerra, a secretária-executiva e principal assessora da ministra
    Dilma Rousseff. E quem vazou o dossiê foi José Aparecido Nunes Pires, militante histórico do
    PT, levado para o Ministério da Casa Civil pelo antecessor de Dilma Rousseff, José Dirceu.
    Ora, se Lula não queria divulgar com transparência os seus gastos em nome da seguran-
    ça do presidente da República, o que justificaria tornar públicas as despesas do antecessor?
    De qualquer forma, a jogada do governo deu certo. Desviou o foco das atenções da CPI dos
    Cartões sobre desvios, irregularidades e até enriquecimento ilícito para o debate político
    sobre o dossiê de FHC.
    Vale registrar distorções acerca do uso dos cartões corporativos em nome da Presidência
    da República no segundo mandato de Lula, mesmo que pouco tenha vindo à tona em razão
    das sistemáticas rejeições da base aliada do governo aos requerimentos com pedidos de
    informação à CPI. Das poucas coisas que ficaram públicas, houve o pagamento insignifi-
    cante de R$ 112,11 de uma conta de internet de Fábio Luís Lula da Silva, o “Lulinha”, filho
    do presidente, efetuada em setembro de 2003.
    Dez funcionários da Presidência da República foram autorizados a usar cartões
    corporativos para fazer compras de interesse de Lula em 2007. Gastaram R$ 3,6 milhões.
    Do total, os ecônomos, nome técnico dos funcionários, retiraram R$ 352 mil em dinheiro
    vivo. Com a notícia nos jornais, receberam orientação para não conceder entrevistas. Infor-
    mações sobre os gastos chegaram a conhecimento público por meio do Portal da Transpa-
    rência, um site na internet gerenciado pela CGU (Controladoria-Geral da União). Depois os
    dados foram retirados da rede mundial de computadores.
    Antes das informações terem sido subtraídas da internet, era possível saber os gastos de
    cada um dos dez ecônomos a serviço da Presidência da República entre 2003 e 2007. Jun-
    tos, despenderam R$ 11,6 milhões, sendo que sacaram R$ 1,7 milhão em dinheiro vivo em
    caixas eletrônicos.